Capítulo 61

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Carlos Eduardo

Há dois dias Leyla saiu deste escritório e não voltou sequer para buscar sua rescisão. Pedi a Gustavo que ficasse à frente desse assunto para que eu não tivesse a mínima possibilidade de encontrá-la novamente, mas não adiantou. Justo quando eu cheguei para trabalhar, ela estava na recepção do prédio e aquilo foi o suficiente para me desestabilizar por inteiro.

Vê-la à minha frente, a poucos metros de mim, com o semblante abatido quase me sensibilizou. Por mais que eu repita internamente, cada vez que penso nela, que Leyla não existe, que ela foi apenas uma invenção de dois golpistas para me roubar, que tudo que vivemos foi uma grande mentira, eu ainda não consigo odia-la.

Sinto raiva, revolta e não consigo aceitar o fato de ter sido feito de bobo, mas estou longe de odia-la como ela merece.

Leyla se mostrou ainda mais dissimulada e fria quando tentou me manipular inventando a existência de uma carta escrita por Sara. Naquele momento ela provou que não tem limites para conseguir alcançar seus objetivos sujos, sórdidos.

Abri meu coração para ela como um adolescente apaixonado. Confessei-lhe tudo o que passei, como vivi aquele luto e ela foi capaz passar por cima do que significa a memória de Sara para mim, tentando dar sua última cartada. Como não conseguiu, fugiu como um rato e deve ter voltado para sua vida promíscua, leviana.

Às vezes me pergunto se agi certo ao atender o pedido de Rafael e não denuncia-la para a polícia. Embora ela tenha sido baleada, Leyla é tão bandida quanto Mateus e talvez eu tenha sido condescendente demais nessa história. Talvez ela tenha desaparecido, pois percebeu que não conseguiria me manipular novamente
e sumiu para não correr o risco de me arrepender e ela acabar presa.

*** *** ***

Desço às escadas apressado, sentindo uma ressaca terrível. Ontem a noite bebi mais da metade de uma garrafa de uisque em meu quarto, após Rafael dormir.

Não quero que ele perceba minha tristeza e saiba que não estou sendo forte o suficiente para encarar essa decepção longe do álcool.

A única coisa boa que Leyla conseguiu deixar em mim foi o carinho e cuidado pelo meu filho. Quero que ele supere essa história sem precisar me ver afogado em lágrimas e dor novamente. Quero que Rafael me enxergue como um homem forte que conseguirá superar essa decepção de forma madura e rápida.

Ele está sentado à mesa sob o olhar de Viviana e embora esboçe um sorriso quando me nota, sei que ainda está triste.

- Bom dia, filho. - Beijo rapidamente sua testa antes de me sentar à mesa. - Como foi seu dia ontem?

- Viviana me levou na fisioterapia. - Responde desanimado.

- Dei continuidade ao retorno de Rafael a todos os tratamentos. Fiz mal? - Viviana se aproxima e me pergunta receosa.

- Não. Pelo contrário, você fez o certo. Nada nesta família ou nesta casa parou ou vai parar. Não existe motivos para isso. - Digo antes de tomar um breve gole de suco de laranja.

- E quanto o retorno à escola? Você também providenciou tudo? - Indago, interessado.

- Sim, mas o senhor precisa assinar alguns papéis para matrícula do menino. Falei com Ruth ontem a tarde e ela vai colocar esse compromisso na sua agenda.

- Excelente. - Digo antes de tomar o restante do suco. - Estou atrasado.

- Não vai comer nada? - A governanta pergunta preocupada.

- Não. - Nego olhando a mesa farta de alimentos - Talvez mais tarde eu peça um lanche no escritório.

Falo sentindo meu estômago embrulhar. A verdade é que exagerei no álcool ontem a noite e não consigo me alimentar.

Trapaças do CoraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora