Podium

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                   Jogos Olímpicos de Paris, 2024. Final da ginástica artística por equipes.

                   A competição começou como sempre. Todas equipes já se movimentavam pelo ginásio, focadas em suas respectivas rotações e aquecimentos. Todas demonstravam muita confiança e estavam atentas aos painéis das pontuações.

                  A equipe brasileira estava muito focada e confiante. Cada uma estava concentrada em seus próprios rituais de relaxamento e se preparavam para o aquecimento nas paralelas, onde se apresentariam primeiro.

– E vamos lá para mais um dia com esse circo da Biles! – Lorrane bufou, entediada, enquanto passava o pó de magnésio nas mãos. – Mas ela não me importa hoje, estou com sangue nos olhos com aquela sonsa da Lee.

– Concentre-se no seu trabalho. – Rebeca disse. – Nós temos que dar o nosso melhor.

– É isso aí! Temos que colocar uma medalha no peito hoje. Não importa a cor. – Júlia também estava animada e confiante. – Isso é pela nossa mãe Daiane.

– Isso aí, meninas! Vamos lá. Confiança! – Rebeca as alentava.

– Meninas! Hora do aquecimento. – O treinador avisou. – Vamos lá?

                    Jade se aproximou assim que ele saiu. Ela mesma tinha arrumado as paralelas para que as colegas – suas meninas, como costumava dizer – se apresentassem. Três iriam ali: Júlia, Flavinha e Rebeca.

– Vamos lá, meninas! Dêem o melhor de si! Vocês podem! – As tocava no ombro, passando confiança.

                  O aquecimento começou. Júlia foi a primeira e fez a sua parte com perfeição, já testando os movimentos para sua série sob a supervisão e apoio do treinador. Quando terminou, já sentia-se pronta para começar a briga pela medalha. Em seguida, foi a vez de Flavinha e o que acabou acontecendo quase fez o coração da equipe sair pela boca: na sua segunda volta, quando largou a barra para um movimento, a ginasta acabou desabando com a parte de frente no corpo no chão. A pancada foi tão forte que ela ficou imóvel durante poucos segundos. O treinador correu para acudi-la. Jade Barbosa parou de respirar por um instante ao vê-la daquela maneira e sentiu um gelo na espinha ao perceber as manchas de sangue no chão.

                   Com muito cuidado, Flávia foi tirada dali. O alívio foi grande quando ela se aproximou caminhando. O supercílio direito estava cortado e seu olho inchou um pouco, ficando um pouco roxo também. Seu treinador a levou até a médica, que estava à postos. Jade correu até ela para verificar se estava mesmo tudo bem. Flavinha era sua protegida. Quando o curativo dela foi colocado, a abraçou, dando-lhe apoio.

                    Aquele acontecimento inesperado chamou a atenção das delegações mais próximas e as atletas, de certa forma, ficaram um pouco preocupadas. No entanto, ao levantar o olhar um pouco para a sua direita, Jade não gostou muito do que viu. Sunisa Lee e Jade Carey cochichavam, olhando naquela direção, parecendo debochar do acontecido.

– Cadelas. – Lorrane, que também havia percebido, ralhou entredentes. – Você deveria ter me deixado dar um sacode naquela desgraçada, Jade. – Aproximou-se da colega.

– Fica tranquila. O que é delas está guardado. – Jade respondeu, com a mandíbula trincada. – Hoje a noite. – Disse, virando-se na direção da colega.

– Perfeito.

                    Quando a situação se acalmou e grande da tensão tinha deixado a equipe brasileira, a competição se iniciou. Conforme o aquecimento, Júlia foi primeiro e fez uma apresentação excelente. Flavinha, mesmo com o curativo no supercílio e a região ocular latejando, não desistiu e decidiu continuar. Sua participação na trave foi vista como um ato de coragem. Até mesmo as outras atletas à espera da próxima rotação pararam para acompanhar. Durante a apresentação de sua pupila, Jade sentou-se em um canto mais afastado e, apoiando-se nos joelhos, pedia aos céus para que tudo ficasse bem e, assim que percebeu que a apresentação estava se encaminhando bem, levantou-se e começou a gritar, animando-a. Quando ela terminou, foi a primeira a abraçá-la.

                    Quando Rebeca começou a se posicionar diante do aparelho, Biles já tinha toda a sua atenção nela. O espírito de rivalidade tinha sido acionado, mas com uma pitada de esportividade. Queria mesmo que ela tivesse uma excelente prova. E foi o que aconteceu. Além das acrobacias excelentes, Andrade ainda conseguiu uma cravada forte. A nota dela lhe deixou um pouco perplexa, pois foi um 14.533. Aquela nota colocou o Brasil no páreo para a medalha.

– Essa aí arrasou, não foi? – Herzly Rivera se aproximou.

– Sim. Ela é muito boa. – Simone concordou. – Filha da mãe... – Resmungou baixo, sentindo-se desafiada. A surpresa: em um bom sentido.

                   Veio a próxima rotação. O Brasil não se deu tão bem quanto esperava nas apresentações de Flavinha e Júlia. Ambas tiveram falhas em sua execução, mas não ficaram muito atrás das outras que vieram. Rebeca, como sempre, tirou uma nota bem acima da expectativa. Biles reprimiu um sorriso de orgulho ao perceber aquilo. A pressão estava chegando. 

                    O dia terminou de forma histórica para o Brasil: a delegação conseguiu sua medalha inédita na ginástica artística por grupos. Daiane dos Santos chorou, Diego Hypólito chorou. Foi algo histórico. Um bronze que tinha sabor de ouro. E o dia foi marcado pelo espírito esportivo: Biles sempre cumprimentava sua "rival" Rebeca Andrade sempre quando estavam juntas em algum aparelho. Aquilo foi um prato cheio para os meios midiáticos. No final, os dois nomes daquela competição se encontraram no pódio e tiraram fotos juntas, exibindo suas medalhas. O mais importante, porém, foi o olhar que elas trocaram antes de saírem para o vestiário. Era um olhar carregado de cumplicidade. 

Podium and FireOnde histórias criam vida. Descubra agora