Eu estava seguindo o tengu pelas ruas da cidade. Alguns repararam na máscara estranha, mas a maioria não se incomodou. Eu andava mais atrás, afastada. Às vezes ele parava e esperava que eu chegasse mais perto até que diminuiu consideravelmente o ritmo, me obrigando a andar quase ao lado dele, coisa que eu não queria, aquela máscara era assustadora e quanto menos eu pudesse olhar para ela mais ficaria grata. Ele parou em frente a uma casa mais simples, sem muitos adornos e se virou para mim. Prendi o ar enquanto aqueles olhos de fúria me encaravam.
- Vamos entrar.
Ele se virou e caminhou para a porta a abriu e esperou por mim a segurando. Lentamente segui seu percurso e entrei no imóvel. Mais uma vez me vi surpreendida pela falta de lógica da casa, ou eu estava com um senso espacial muito precário ou aquele lugar realmente era grande demais para aquela casinha que eu vi do lado de fora. A sala era gigantesca, mais luxuosa que a da casa dos Furler, só que mais clara apesar da óbvia ausência de janelas. O chão era apenas madeira, mas uma escura e que lembrava um tapete negro, haviam almofadas espalhadas por todo o solo de todas as cores, tamanhos e formatos. Pequenas mesas estavam espalhadas com vasos de flores brancas em cima, também haviam pequenas estatuetas de diversos animais e de algumas pessoas, reconheci a imagem de Buda e de Shiva. Nas paredes que eram de madeira clara se tinha uma pintura que rodava por todo o cômodo feita em tecido, observei alguns detalhes e percebi que se tratava de uma história.
- Sente-se.
Eu obedeci enquanto continuava acompanhando o desenrolar da história.
Uma mulher sobre uma montanha encontra um homem, porém eles ficam separados pois suas famílias lutam entre si por terras. Eles se encontram na montanha todas as tardes, quando o sol toca o alto da montanha. Mas em uma imagem ela aparece sozinha. O homem não tinha ido, ele estava doente, uma peste tinha chegado ao seu lado da montanha e à sua família. Ela se desespera e reza aos céus que lhe permita encontrar seu amor, mas ele morre. Quando ela percebe que ele nunca mais subirá a montanha para que eles se encontrem ela a desce pela última vez, para o lado de seu amado. Os sobreviventes do outro lado percebem que ela é da família inimiga e a matam.
Meus olhos arderam.
No final aparece um casal de pássaros.
- Que final mais triste!
- Não.
A voz de Akira soa atrás de mim e eu levo um susto. Me viro e não vejo a máscara vermelha.
- Veja mais uma vez.
Obedeço. Mais uma vez vejo o final trágico da mulher e os dois pássaros.
- Eles conseguiram ficar juntos. Os deuses atenderam o pedido dela.
Entendi o que ele dizia.
- Mas - protestei - eles viraram pássaros!
- Assim a família não interpõe-se entre eles. Podem ser livres juntos. Nada mais os separa nem os prende. Nem montanhas nem lutas.
Compreendi o que ele dizia e agora via que o final realmente havia sido belo.
- Pegue.
Olhei para a nova máscara, essa tinha um bico e era completamente negra ainda mais assustadora que a de antes. Olhei para o que ele tinha em mãos, um livro grosso e vermelho de capa dura. O peguei e abri, Os intocados.
- Para quê é isso?
Ele indicou minha cabeça.
- Para equilibrar na cabeça.
- O quê?
VOCÊ ESTÁ LENDO
Cidade de Magia - Contos de Espinhos
FantasyTirya está a caminho da Cidade dos Contos, onde nem todo conto tem um final feliz. Além de ter que suportar um superior de uma personalidade complicada e mais uma vez ficar sozinha ela vai ter que enfrentar os perigos e criaturas da Floresta sem f...