Eu sempre exigi que os meus filhos honrassem, & respeitassem os professores. Os professores são os grandes formadores, do caráter de uma criança. - Eu me lembro com muito carinho, da minha professora primária, dona Liete. - Aquela época, eu estudava naquela escola, a "Deodoro", ali perto do Relógio da Lapa. Eu era um menino pobre, tinha dia que o único alimento que eu comia, era a "merenda escolar". Eu repetia a merenda. Eu afanava sanduíches de pão com mortadela, para comer em casa, mais tarde. (Hoje eu conto isso, e alguns amigos não acreditam). Eles dizem que eu sou de uma família muito rica & poderosa. - É verdade. Mas eu & mamãe passamos por apuros, nessa vida de Deus. - Mamãe trabalhava de datilógrafa, (digitadora, hoje se diria), naquela companhia de seguros. Pagar o nosso aluguel, colocar comida em casa, vestir, calçar, foi difícil... Mas depois que eu cresci, eu sempre trabalhei, & isso nos ajudou bastante. Mas voltando a dona Liete. - Eu me sentava no fundo, naquela classe. Ali era o point dos bagunceiros. Eu nunca fui bagunceiro, mas gostava de aprender com eles. Dona Liete passava os exercícios, e eu resolvia tudo, rapidinho. Ela começou a me olhar com maior atenção. Me perguntava as coisas, onde eu morava, se eu gostava de ler, de estudar... - Velho, lá em casa todo mundo lia. Eu desde de menininho, fui acostumado a ler. Ela dizia que eu fazia lindas redações, essas coisas... Nessa época, mamãe havia alugado um apartamento ali na Augusto Severo. Na realidade, não era um apartamento, era uma sobreloja, toda envidraçada, era lindo ali. Minha professora sacou, que as vezes eu não tinha o que comer. Eu comia rapidinho, pra poder repetir. Dona Liete sacou, tanto sacou, que começou a pegar uns pães com mortadela, e a me entregar lá fora...Me comprava lanches, me levava marmitinhas...Um dia ela quis ir lá em casa. Queria conhecer mamãe. - Nessa época, mamãe estava dando aulas particulares, de francês, e trabalhando na cia. de seguros. Mas eu levei minha professora em casa. Aquela sobreloja era imensa. Os únicos móveis que tínhamos lá, eram os de cozinha & nossas camas. Nós não tínhamos mais merda nenhuma, só isso. Mas eu fui feliz ali, junto com minha mãe. - Quando dona Liete conheceu minha mãe, elas ficaram amigas. - Dona Liete dizia, pra minha mãe: - "O seu menino é muito inteligente". - Nós precisamos cuidar dele, ele vai ter um belo futuro, você vai ver... _ Eu amava minha professora. - Quando eu conseguia juntar uns tostões, eu ia na feira, e comprava uma maçã bem bonita pra ela. (Eram caríssimas, aquelas maçãs, com um papel fino roxo). - Eu lustrava a maçã, e embrulhava naquele papel roxo, e deixava na mesa dela. Ela gostava, mas depois me devolvia a maçã... Dizia que eu é que devia comê-la, que eu precisava mais. - Quando eu fiz treze anos, eu fui trabalhar naquela loja de calçados, lá perto do Largo do Machado. - Ela sempre ia me visitar, e me levava pra lanchar no Lamas. - Depois nos perdemos no mundo, nos desencontramos na existência. - Beijos, dona Liete.