ETERNO AZUL - 06

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Dona Lucrécia já estava cansada de tanto procurar pelos netos. Era hora do almoço e as crianças não paravam de jogar bola no descampado.

– Ai, que Odin me perdoe, mas minha filha precisa educar mais essas crianças. Não tenho mais idade para isso!

A senhora cruzou a praça destruída de Santalucia, passou pela cerca e seguiu pela rápida trilha até o descampado. Lá, ela viu seus dois jovens netos jogados sobre a grama contemplando o céu.

– Tobias, Celissa! Quantas vezes eu preciso chamar? As outras crianças já estão almoçando! Vocês querem ficar sem coxas de frango?

– Já estamos indo, vovó! É que estamos tentando desvendar um mistério!

– Ah, é? E que mistério é esse?

– Por que o céu é azul de dia e preto de noite?

Lucrécia deu um sorriso. Tinha horas que ela se esquecia do quanto as crianças eram curiosas e agradecia aos deuses que as tormentas acometidas em Santalucia não tenham afastado a natureza delas. Ela arrancou a touca da cabeça e se deitou junto com os netos, contemplando o azul do céu.

– Sabem, Apolo é o senhor do dia e Jaci é a deusa da noite. Dizem que eles eram muito apaixonados e que viviam juntos o tempo inteiro. Por causa de seu amor, os dias nunca eram muito quentes, porque o sol nunca chegava ao topo do céu, e as noites nunca eram escuras, porque não passavam de um longo crepúsculo. As pessoas viviam com luz constante e branda, e as estrelas podiam sempre ser avistadas no firmamento, não importa a hora que fosse. Contudo, um dia Apolo se apaixonou por Belisama, a deusa da paz. Quando Jaci descobriu, ficou revoltadíssima. Ela entrou em guerra contra Apolo e causou um grande reboliço nos Portões Celestiais. Porém, como não tinha poder para vencer seu poderoso amante, decidiu puni-lo da única maneira que poderia: Jaci separou o dia da noite, prendeu Belisama em seus domínios e pichou o céu noturno de negro para representar a dor de sua traição. Assim, as duas luas, Jaci e Belisama, cruzam o céu noturno para sempre separadas do promíscuo deus-sol e de seu eterno céu azul.

– Nossa! – exclamou Celissa. – A senhora conhece muitas histórias, vovó!

– He, he, he. Vocês, um dia, ficarão velhos também. Aí, saberão muitas histórias.

– O que é "eterno"? – perguntou Tobias.

– O quê?

– "Eterno"? A senhora disse que o céu de Apolo é de um azul eterno. O que é isso?

– Bem... Eterno quer dizer "para sempre". Quer dizer que não importa para onde você olhe, o azul do céu nunca vai acabar. – Dona Lucrécia contemplava, hipnotizada, junto com os netos, o firmamento do qual ela falava. – Há poucas certezas nessa vida, meus netos. Mas uma delas é essa: o céu do amanhã sempre será azul.

– O céu do amanhã será azul – repetiu Tobias, como em um mantra tranquilizador.

De repente, um brilho quebrou a monotonia celestial. Tobias achou que se tratava de uma estrela surgindo durante o dia, como nos tempos em que Apolo e Jaci eram apaixonados. Então alguma coisa atingiu sua mão.

– Ai! O que é isso?!

Uma coroa. Uma moeda de ouro havia caído sobre a mão do neto de Dona Lucrécia.

– Veja, vovó! Veja! – Tobias dava pulos de alegria.

– Você achou uma coroa? Que sorte, Tobias. É bastante dinheiro.

– Eu não achei, ela caiu do céu!

– Não seja bobo, meu neto. Dinheiro não cai do... – Dona Lucrécia foi interrompida quando viu um brilho metálico atingir o gramado a poucos metros dela. Ela se levantou, correu até lá para encontrar uma moeda de prata. – Mas... o que está...

Como sereno se tornando chuva, as moedas começaram a cair mais e mais. Não apenas sobre o descampado, mas também sobre as ruas e sobre os telhados das casas. Uma chuva de cobre, prata e ouro caiu em Santalucia. Alguns fugiram da pancada que as peças metálicas causavam com seu impacto. Outros correram para a rua com bacias e baldes para tentar coletar o máximo possível daquele milagre. As pessoas riam e choravam de alegria. As crianças pulavam. Os lavradores davam glória. Todos agradeciam aos deuses por sua manifestação de misericórdia sobre aquele povo tão sofrido. Rápida como uma tempestade, a chuva parou. Ainda sobre aplausos e ovações, o povo de Santalucia olhava para o céu, agradecido.

Olhava para o eterno céu azul.

Escondidos entre as nuvens, os ocupantes do Presságio Vermelho observavam sua cidade adotada catar o tesouro por eles descoberto.

– Bem... – Dalila não estava exatamente convencida de tal decisão. – Lá se foram quase todas as moedas. E agora?

– Agora... nada. – respondeu Goldak. – O tesouro de Presságio Vermelho irá ajudar Santalucia a se reerguer. Eles foram a maior vítima do Alce Negro. É justo que compartilhem dessa glória. Não fique com essa cara; as joias e as pedras preciosas ainda podem ser vendidas.

– É, eu sei. Desculpe, é que eu não estou acostumada a fazer caridade. Ainda mais uma tão grande assim.

– Pois devia começar. Quem sabe seja isso que lhe falta para preencher a angústia de seu coração.

Dalila ficou calada observando a alegria do povo de Santalucia. De fato, ela sentia como se aquele povo tivesse sido vingado. Eles se ergueriam novamente e, se os deuses permitirem, ficariam em paz.

– Bem, e agora? Para onde vamos, "capitã"? – perguntou Zando.

– Agora, tenho que cumprir uma promessa. Imediato, vamos para Costa Noroeste. Dalila, nessa eu vou precisar de sua ajuda.

A dhevaniana não entendia o que se passava na cabeça da jovem comandante, mas, em breve, seu objetivo ficaria claro.

Jornada ao Presságio Vermelho [Completo!]Onde histórias criam vida. Descubra agora