Mallu
-Acorda mamãe! -Escuto uma voz suave, me fazendo abrir um sorriso.
-Bê... -Sussurro abraçando meu filho.
-Mãe... por que você está chorando? -Ele pergunta, afastando seus fios negros, que caíam sob seus olhos.
-Você foi embora... volta comigo, filho. -Digo deixando as lágrimas caírem.
-Não, mãe... você tem que entender que eu precisei vir! -Ele me abraça. -Eu amo você, e vou estar te olhando daqui.
-Eu sinto tanta a sua falta, Bê. -Beijo a testa do pequeno.
-Eu também, mãe... mas eu prometo que sempre vou te ver. -Ele diz sorrindo e acabo sorrindo junto. -Agora você precisa voltar, o papai precisa de você.
-Acho que ele não me ama mais. -Sussurro.
-Não diga isso! -Ele me repreende. -O papai sempre vai te amar... e eu também.
-Mallu! Mallu! -Escuto a voz de Liam me chamar.
-Ele chegou... eu tenho que ir.
Aos poucos, vou sentindo a voz do pequeno ficar cada vez mais distante e a de Liam, ficar cada vez mais alta.
-Mallu!
Aos poucos abro os olhos, vendo Liam parado a minha frente.
-Bom dia... -Digo me sentando.
-Já disse para não dormir no quarto do Bê... não está te fazendo bem. -Ele diz saindo do local.
-Você demorou ontem... -Digo indo atrás do mesmo.
-Muito trabalho. -Ele diz a mesma coisa de sempre.
-Eu vou na casa da minha mãe mais tarde. -Digo mudando de assunto.
-Já te disse que essa mulher não está lhe fazendo bem. -Ele diz revirando os olhos.
-Ela é minha mãe, Liam! E eu a perdoei.
A um mês atrás, Alice veio me pedir perdão por tudo. Eu fiquei meio desconfiada mas a perdoei, afinal de contas, ela era minha mãe! E por eu ter contato com ela sempre, acabou gerando brigas entre nós dois.
-Como quiser. -Diz por fim. -Chegarei tarde hoje, não me espera para o jantar.
-De novo? Liam agora você não para mais em casa! Porra, eu preciso de você! -Digo irritada.
Desde a morte do nosso filho, nosso relacionamento não vai nada bem. Liam passou a trabalhar por mais tempo, e eu me afundei. Não tenho mais vontade de sair de casa ou fazer qualquer coisa.
-Eu preciso trabalhar, Mallu! Dinheiro não cai do céu. -Ele diz passando a mão pelos cabelos irritado.
-Até tarde da noite? Liam, eu já perdoei muita coisa... mas eu não irei perdoar traição. -Aviso, já sentindo a vontade de chorar me invadir.
Liam ficava a maior parte do tempo na rua, e acaba me trazendo desconfianças, gerando novas brigas.
-Mallu, eu já te disse! Eu não sou o idiota do Pieter... Eu amo você! Demais até! Jamais te trairia. -Ele diz depositando um beijo calmo em meus lábios.
-Eu amo você. -O abraço apertado e pouso minha cabeça em seu peito, inalando seu perfume forte.
-Julie disse que passaria aqui mais tarde... fica bem. -Ele diz se separando de mim. -Eu amo você.
Vou para o banheiro e me despido. Encaro meu reflexo no espelho e me decepciono novamente.
Na gravidez do Bê, eu havia engordado bastante, mas não era tão perceptível. Mas depois que meu menino se foi, eu me perdi. Descontei minha tristeza na comida... nos doces especificamente. E assim... acabei engordando.Eu estava me sentindo perdida... Eu perdi a minha corda e estava voando para longe... sem saber o caminho de volta.
Após sair do banho, tento vestir um short, mas o mesmo acaba não fechando. Depois de tanto sofrimento para emagrecer... eu estava passando por tudo novamente.
Me olho no espelho, tendo nojo do que via. Sinto lágrimas escorrerem pelo meu rosto e a falta de ar chegando. Minhas pernas começam a falhar e eu caio no chão, chorando cada vez mais.
"Gorda"
"Idiota"
"Ele merece coisa melhor"
"Ele tem dezoito por cento de chances de sobreviver"
"Dezoito por cento"
A imagem do meu filho sendo enterrado me vem em mente, fazendo-me pegar uma lâmina e começar a fazer cortes em meu pulso, afim de aliviar a dor que eu estava sentindo.
Eu precisava do meu filho aqui... eu não sabia mais qual rumo tomar na minha vida. Eu precisava da minha corda. Precisava do meu filho.
Eu me perdi no meio dessa confusão e já não sabia mais como retornar. Eu havia me perdido.
-Cheguei... -Olho para porta e vejo Julie parada, assim que olha para o meu estado, ela corre até mim, se abaixando para ficar na minha altura, já que eu estava sentada no chão. -Amiga! O que aconteceu? Por que está fazendo isso... calma, eu vou ligar para alguém.
-Julie... não. -Digo antes dela discar algum número no telefone. -Eu estou bem... só... me ajuda a levantar.
Ela assente, deixando o celular de lado e me ajudando a levantar.
Me deito na cama, jogando a lâmina no chão. Respiro fundo na tentativa de cessar o choro. Eu não podia fazer isso novamente...
Julie sai do quarto, e volta com a caixa de primeiro socorros em mãos. Ela vem até mim, limpando os cortes e enfaixando em seguida.
-Crise de ansiedade... me desculpa. -Digo após beber um pouco de água.
-Não precisa se desculpar. -Ela diz se sentando ao meu lado. -Quando isso começou?
-Desde a morte do Bê.
-Liam sabe? -Pergunta e eu nego. -Por que não contou?
-Ele passa a maior parte do tempo fora... Não queria preocupa-lo. -Digo com sinceridade.
-Amiga, isso é sério... O Bê se foi a dez meses... -Ela lamenta. -Ainda dói em mim também, mas você precisa seguir a sua vida.
-Eu sei é que... É difícil entende? Talvez se eu não deixasse que fizessem a cirurgia, ele ainda estaria aqui. -Digo respirando fundo para não chorar novamente.
-Você não tem culpa, Mallu... você lembra o que a médica disse? Se ele não fizesse a cirurgia, teria chances maiores de não sobreviver. -Ela diz e posso ver que seus olhos estavam marejados. -Conversa com Liam... ele te ama e vai entender.
-Acho que nosso amor esfriou... sabe? Eu quero ter ele por perto, mas sinto que se continuarmos, eu vou acabar machucando-o.
-Amiga...
-Não, Julie... eu o amo demais, faria qualquer coisa para ver ele bem. -Suspiro. -E a minha maior prova de amor, é deixando ele viver... eu estou doente, e não posso prende-lo a mim.
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A Cor dos Teus Olhos
Teen FictionAqui vocês irão ver a história de Mallu. Uma jovem que vive um relacionamento extremamente abusivo, mas que se nega a acreditar que é abusada psicológicamente pela pessoa que mais ama na vida. "-Ele está te matando aos poucos, você não vê? Se olha...