Capítulo 66

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Mallu

-Hora do café da manhã. -Patrícia avisa.

-Já estou indo. -Digo terminando de pentear meus cabelos.

Hoje estava completando dois meses que eu estou internada na clínica de reabilitação. Está sendo difícil... a abstinência chega forte e me abraça como uma velha amiga. A solidão está presente comigo a cada dia que se passa, mas sei que é coisa de momento, e logo eu estarei bem.

-Úrsula. -A chamo. -Vamos tomar café da amanhã.

-Me espera... -Ela pede e eu confirmo.

Não fiz amizades aqui dentro, preferi assim. A única amiga que me permiti aproximar, foi Úrsula. Ela era uma mulher incrível e extremamente forte. Está aqui tentando largar o vício, assim como eu. Porém, a ruiva ainda vivia um relacionamento extremamente abusivo, e lutava a cada dia para manter sua sanidade mental.

-Eduard não veio essa semana. -Ela diz mordendo um pedaço de sua maçã.

-Ele não vai vir, Úrsula. -Suspiro.

-Ele deve estar ocupado... Ele vai vir... -Ela sorri.

-Úrsula...

-Não começa... Eu sei que ele me ama! O sorriso dele ao me ver mostra isso! -Ela diz animada.

-Eu sei, o sorriso dele é bonito mesmo, ele te faz bem demais. Mas você precisa entender que ele não te ama e não pretende amar. Da última vez, ele sumiu por quase um mês até sentir falta do colo que só você consegue dar para ele. E quanto mais ele demora a dar um sinal de vida, mais você espera por algo, que só te faz afundar cada vez mais em um poço cheio de sentimentos incompatíveis e sem uma gota de reciprocidade. Ele não quer compromisso com você. -Digo de uma vez.

-Eu queria ser forte o suficiente para poder me livrar dele... -Ela diz com os olhos marejados. -Veja só, já estou chorando...

-Não confunda sensibilidade com fraqueza... você é forte sim! E pode tudo! -A encorajo.

-Está na hora da sua consulta. -Olho para trás e vendo o inspetor me chamando.

De dois em dois dias, pela manhã, eu tinha consulta com a Doutora Carina, a psicóloga daqui. E todas as tardes, tínhamos consulta coletiva.

-Que bom que veio... -Ela sorri assim que eu entro na sala.

-Não tive opção. -Digo me sentando no sofá ao seu lado. -Como você está?

-Estamos aqui para saber como você está! -Ela diz dando ênfase na palavra 'você'.

-Estou bem... com saudades do meu namorado, mas bem! -Respondo sincera.

-A Gina disse que você está a uma semana sem ter crise de ansiedade, é verdade? -Ela pergunta.

-É. -Dou de ombros. -É questão de tempo...

-Não começa! -Ela me interrompe. -Você vai conseguir, Mallu! Conseguiu até aqui e irá conseguir mais!

-Espero... não vejo a hora de ir para casa. -Respiro fundo. -Estou pensando em fazer prova para entrar no Columbia.

-Quer fazer o que lá?

-Medicina. -Sorrio orgulhosa. -Acha que sou capaz?

-Eu acho... e você? Acha que é?

-Não sei... talvez.

-Tenha confiança em si mesma, Mallu! Quando a gente quer algo de verdade, a gente consegue! -Ela diz.

-Eu vou conseguir... -Sorrio confiante.

-E o que está achando daqui? -Pergunta escrevendo algo em minha ficha.

-Entediante. -Suspiro. -Eu fico cansada de fazer nada.

-Cansada de fazer nada! -Ela ri. -Essa é nova!

-Eu estava tentando meditar, mas não deu certo. -Dou de ombros.

-Por que estava tentando meditar?

-Exercitar a minha energia! É importante para a saúde, sabia? -Sorrio animada. -Todos nós temos energias boas e ruins... temos que cuidar delas.

-Certo... -Ela concorda. -Por que não tenta escrever?

-Escrever?

-É! Você escreve muito bem, Mallu! Tenta escrver algo, e me mostre na nossa próxima consulta. -Propõe.

-Mas escrever sobre o que? -A encaro confusa.

-Sobre a sua história!

[...]

-Já jantou? -Úrsula pergunta se deitando em sua cama, que por sinal, era ao lado da minha.

-Já... estou conseguindo comer bem! -Comento animada pela minha conquista. -Engordei dois quilos, só que de forma boa!

-Parabéns! -Sorri. -Logo você estará fora daqui novamente... Boa noite, Mallu!

-Boa noite, Úrsula!

Pego meu pequeno bloco de notas e faço alguns rabiscos.

Como se começa a escrever algo? Eu não sou boa para isso...

"Era uma vez... "

Não! Cafona demais.

"Em uma tarde..."

De jeito nenhum! Conto de fadas demais.

"Feia.

Burra.

Gorda.

Estúpida.

Esses eram os adjetivos que eu ouvia da pessoa que eu mais amava nesse mundo."

Agora sim... Eu começaria a escrever a história da minha vida. A minha história.

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