Capítulo 19

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Mallu

Bebo meu segundo copo d'água e respiro fundo. Eu ainda estava abalada por tudo que havia acontecido no dia anterior, mas senhora Smith tinha razão... eu precisava ir até a polícia.

-Pronta? -A mãe de Jul pergunta e eu concordo. -Essa é a advogada que vai te representar no tribunal, Doutora Courtney.

-Como vai? -A cumprimento.

-Bem... Querida, nós iremos abrir um processo contra o Ryan, está bem? -Ela diz e eu assinto mesmo sem entender nada. -Nós iremos prestar o boletim de ocorrência, e a única coisa que você deve falar, é a verdade! Que ele ameaçou você, e que manteve relações sexuais com você a força.

-Mas... eu deixei. Quer dizer, eu não impedi da forma que podia. -Digo.

-Querida... as vezes nós não podemos fazer nada, por mais que achamos que poderíamos ter feito algo a mais... talvez até poderíamos, mas se tivéssemos feito, seria pior. -A doutora Courtney diz segurando minhas mãos.

-E como sabe disso?

-Porque eu passei pela mesma coisa que você. -Ela diz e posso ver seus olhos marejados. -Durante anos eu fui abusada sexualmente pelo meu padrasto... Ele não só abusou do meu corpo, mas como da minha mente também. Ele fazia eu me sentir culpada, eu sentia que eu poderia ter feito mais... porém, talvez se eu tivesse reagido, algo pior poderia ter acontecido.

-Doutora Courtney, eu devo falar sobre a minha gravidez? -Pergunto.

-Claro... saiba que você terá o apoio da justiça.

Além da senhora Smith, Julie fez questão de ir comigo até a delegacia.
Eu estava nervosa e com medo. Medo de me julgarem assim como minha mãe me julgou. O não acreditarem na palavra de uma menina de dezoito anos, como minha mãe não acreditou.

-Você pode começar, Mallu. -A policial disse enquanto posicionava a câmera na minha frente.

Admito que por a policial ser uma mulher, eu me sentia mais tranquila em ter essa conversa. Talvez, ela poderia me entender.

-Por onde começo? -Pergunto.

-Quando o relacionamento da sua mãe com o Ryan começou, como você se sentiu? -Ela faz a primeira pergunta.

-Normal... no começo ele era simpático, me tratava bem e fazia minha mãe feliz.

-Quando o comportamento dele começou a mudar?

-Alguns dias antes do meu aniversário... Ele começou a me olhar estranho, chegou a me assediar, mas ameaçou que se eu contasse a alguém, ele acabaria comigo e com a minha mãe.

....

-Como foi lá? -A doutora Courtney pergunta.

-Não sei... eu contei tudo, inclusive sobre a gravidez. -Digo bebendo um copo d'água.

-Certo... agora é só deixar a lei agir. -Ela diz e eu assinto.

O meu meio medo era que Ryan fizesse algo contra a minha mãe. Ela não acreditou em mim, então não pode se proteger, pois não saberia do que se proteger. Eu não poderia perder a única pessoa da minha família...

-Posso dar uma palavra com você? -A delegada pergunta.

-Eu terei que está junto. -Minha advogada diz e a delegada concorda. A seguimos para a sua sala, presumo.

-Bom senhorita Mary... -A delegada diz se sentando em seu lugar. -Nós indicamos que você comesse a frequentar um psicólogo para poder...

-Está me chamando de maluca? Eu não vou a lugar algum.

-Não é isso... É que você passou por momentos difíceis ultimamente... -Ela tenta de explicar mas me levanto rapidamente, saindo dali.

-Eu quero ir para casa. -Digo assim que vou ao encontro de Jul.

-Antes nós precisamos ir fazer seus exames, para comprovar... -A Doutora Courtney tenta dizer.

-O estupro? A minha palavra não basta? -Pergunto passando a mão nos cabelos irritada.

-Para mim? Sim, mas para a justiça? Não.

Eu já estava exausta, passamos o dia inteiro na rua. Depois que saímos da delagacia, eu tive que ir para um hospital fazer alguns exames. E como o previsto, todos deram positivo... eu havia sido abusada sexualmente e... eu realmente estava grávida. Eu carregava um fruto daquele monstro.

A primeira coisa que fiz assim que cheguei na casa de Jul, foi correr para o banheiro. Eu estava enjoada e exausta.
Separei um roupa confortável e fui para o meu banho.

Após retirar minhas peças de roupas, me olhei no espelho. Meu corpo estava normal, quem me olhasse, nem imaginaria que estava grávida.
Desci minhas mãos até minha barriga, ainda olhando meu reflexo pelo espelho, e alisei a mesma. Eu não queria odiar meu filho... eu estava perdida.

Enquanto eu fazia os exames, uma enfermeira me perguntou se eu abortaria. Na hora eu neguei, assustada pela pergunta. Mas agora... talvez não seja uma má idéia.

Olha para mim, eu não sei cuidar nem de mim mesma... Não tenho onde cair morta, estou vivendo de favores... e ainda por cima, corro o risco de quando olhar para o meu próprio filho... lembrar daquele monstro.
Eu não poderia criar uma criança. Eu não sei nem se poderia continuar aqui.

Eu enchi a banheira e vesti a roupa velha que havia separado.
Alguns podem achar que é frescura ou drama... mas quem já passou ou passa por uma situação assim, vai me entender.

Eu não tinha mais condições de continuar aqui... e nem um porque para continuar.

Podem me julgar o tanto que for... mas só quem já passou por um momento assim, que já viveu o que eu vivi, vai entender.

Eu peguei a lâmina que estava sempre comigo e fiz o primeiro corte, liberando sangue na água. Fiz outro corte no outro braço e fiquei ali...

Eu pensei em Julie, em Lia, em Isabella, e até em Liam... mas o engraçado, é que eu pude ver um futuro para casa um, e adivinhem só, eu não estava nele.
Por mais que doesse, eu sabia que eles iriam esquecer, e logo, voltariam a viver.
Eu sabia que estava perdoada.

Dizem que quando você está morrendo, passa um filme na sua cabeça sobre a sua vida... mas que estranho, eu não vi nada. Quer dizer, eu vi um rosto... Um menino loiro, e A cor dos teus olhos me chamou atenção, era um azul feito o céu e idêntico aos meus... Ele me trouxe paz... e então, eu vi tudo branco, e por último, ouvi alguém me chamando, mas a voz estava distante... e cada vez mais distante.

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