Gideon
Coisas como "Um mastro enorme", "Sucção", "Fisionomia invejável de um Laurent" são as coisas que meu chefe preparou para que eu lesse. Sinceramente, eu ria. Além de ler eu ria muito, não sabia que um ser humano conseguia ser tão cheio de si, mas Rafael Laurent superou minhas dúvidas e não sei nem como vou encará-lo depois dessas frases. Outro fator era, depois de concluir uma linha, eu ainda tinha que reescrevê-la em outra folha. Sim, às vezes eu ficava entediado, cansado, chateado. Mas havia uma parte boa nisso tudo, eu estava perdendo o que acontecia lá fora, estava livre dos olhares maliciosos e do odor da aglomeração bêbada e suada. Uma súbita vontade de vasculhar aquele escritório me percorreu enquanto eu terminava de escrever, meus dedos já estavam vermelhos e minha mão, suada. Levantei e sem pensar, comecei a vasculhar aquela sala, sem interesse nenhum, não tinha muita coisa, ele parecia um homem sem hobby nenhum.
Rafael Laurent podia ser bonito e afins, mas parecia mais ainda ser um homem que deixava o tédio ser parte de si.
Por fim, sentei de novo naquela cadeira velha e comecei a ouvir do que vinha de fora: a porta estava aberta, a chave estava na fechadura. Sei que não quero ir para fora, mas sei que aqui dentro já perdeu toda a graça.
Penso.
Saio da sala de Rafael Laurent (esse nome era ridículo) e fui em direção a um quarto abandonado do Hot. Os quartos eram próximos aos banheiros únicos, logo depois um corredor que só era usado como depósito e na última porta ficava o silêncio, ficava uma janela enorme que deixava que as paredes recebessem a luz da lua, deixando as paredes e o chão prateados de um jeito encantador. Fiquei de frente para a janela sem abri -la, eu estragaria tudo se ousasse abrir. Para quê? A música horrível e gritos, risadas e cheiros viriam até aqui e logo, eu não teria paz.
Respiro tão fundo que quase me engasgo com o ar, mas isso não importa, fecho os olhos.
Então escuto a voz dele atrás de mim.- O que está fazendo?
Não passa de um sussurro que pareceu vim do nada; vim das sombras. Não me assusto tanto, apenas decido deixar meu coração desacelerar por um instante antes de responder a Rafael Laurent.
- Apenas procurando paz.
Silêncio. Penso na possibilidade de estar sozinho de novo ou de ter apenas imaginado sua voz mas isso me tornaria um louco e sei que sou completamente lúcido. Balanço a cabeça e decido olhá-lo. Ele está parado tão perto de mim que tenho certeza que respiramos o mesmo ar do quartinho abandonado. Ambos ficamos em silêncio.
- Não se esqueça que me deve um favor.
- Seria impossível com você falando nisso a cada minuto.
Não o vejo sorrir. Também sei que ele não está com raiva. Não havia como decifrar as expressões do meu chefe, ele era esculpido em gelo, em cerâmica ou qualquer outra coisa dura. Simplesmente inelegível. Eu tinha certo medo dele.
- Não pense que seu trabalho aqui será apenas leitura. Aqui não é o primário.
- Estou sabendo.
- Porque veio parar aqui?
Percebo que paro de respirar. Encarei tanto seus olhos frios que congelei e tenho certeza de que ele sabe sobre a pressão que causa em mim. Nunca quis tanto que alguém interrompesse uma conversa como agora. Quero me livrar deste homem insuportável, mas ele parecia não querer sair daqui sem uma resposta e tenho tanta vergonha de falar algo agora que sinto meu rosto esquentar.
- Eu... - minha gagueira o faz rir. Calo-me.
- O gato comeu sua língua?
- Não.
- Qual a dificuldade?
- Não.
- Então, porque está respondendo apenas com monossílabas?
Olho para meus pés e os encaro como se fossem a coisa mais maravilhosa do mundo. A luz da lua faz as mãos de Rafael brilharem, ele usa anéis. Um com um pássaro e outro com o que parece batimentos cardíacos. Não o encaro mais. Viro-me de novo para a janela.
- Porque está pegando no meu pé? É porque não gosto de sexo? Porque não sei ler?
- Não se faça de vítima. Odeio isso tanto quanto odeio mentiras.
Era verdade. Ele já havia me dito que sabia quando alguém estava mentindo. Como posso me tornar imune a isso? Tenho medo de passar mais tempo perto dele e não poder mentir sobre algumas certas coisas. Era estranho. Me deixava irritado.
Então eu o odiava mais um pouco por ter qualquer efeito sobre mim.
Gaguejo até conseguir falar.
- Vou voltar a ler.
Quando me viro para encará-lo, Rafael já tem ido embora.
Ótimo assim ele não precisava dizer que eu estava mentindo. Prefiro ficar observando a paisagem pela janela. Encosto minha testa no vidro gelado, por um momento me permito pensar. Talvez eu não sirva para este lugar. Vejo isso nos olhos de todos os garotos com quem divido o quarto, eles me veem como um E.T. e não posso nem me defender, eu não tinha argumentos para provar que era igual a eles. Em um momento me desafiaram a fazer sexo como prova de que podia ser igual a eles e foi daí que tirei a ideia de apagar os caras que me escolhiam e fingir que havia feito sexo de verdade. Na primeira vez achei que não daria certo, meu coração estava doendo e minha cabeça dizia para mim que o que eu estava fazendo era errado. Mas fiz. Quando o homem acordou sorriu para mim e me jogou um maço de dinheiro. Continuei assim até pouco. Mas já descobriram meu plano. Vejo que não pertenço a este lugar no olhar de Rafael. Ele me subestima, não sei o que fazer para tirar este olhar do seu rosto e talvez eu nunca consiga. Me odeio por querer mudar sua opinião sobre mim. Do que importa?
Suspiro.
Era isto que eu estava pensando antes.
Saio do quarto e me nego a olhar para a janela mais uma vez.Deito na cama e agarro o travesseiro.
Os sons festivos abafados pelas paredes me dão coragem para olhar para o teto. Agora desejo saber escrever e ter um diário, será que eu conseguiria? A ideia me parece absurda, mas quem sabe. Acho que começaria escrevendo o quanto odeio este lugar e de como gosto de não estar fazendo sexo.
De uma maneira absurda, também escreveria que estou grato a Rafael Laurent.
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Minha Submissão | Série Irmãos Laurent-(Livro 4) (Romance Gay)
RomanceRafael Laurent é o mais novo, o mais sagaz e misterioso dos irmãos Laurent. Gideon veio de muito longe, deixou várias pessoas para trás e chegou para cumprir um objetivo difícil. Uma mistura de mistério, sexo, descobertas de sentimentos e loucura...