Rafael Laurent
Havia uma mensagem piscando no meu celular quando acordei.
"Podemos conversar?" - Davi.
Não lhe respondi imediatamente. Podia ser uma mensagem simples, mas eu tinha que pensar bastante antes de responder: se dissesse que não, estaria aumentando o abismo entre nós. Posso ter me distanciado da minha família, mas ainda me preocupava com ele, com Davi, com Diego, com Kevin. Mesmo sendo o mais novo irmão, eu tendia a procurar saber da vida dos meus irmãos. Havia problemas? Eu saberia, eu tentaria ter o controle mesmo que passivamente e se algo desse errado era só eu aparecer e ajudá-lo mesmo de modo indiferente. A situação aconteceu com Davi quando estava fugindo do ex lunático de William. A vida dos irmãos para mim, é uma novela.
Foi por este motivo que disse sim a meu irmão.
Não pude deixar de pensar, ainda deitado, que a vida dos meus irmãos pareciam atrair o drama: Diego se casou com um rapaz que conheceu em uma ponta, não no carro, não em um acidente. Hall queria tirar a própria vida e Diego apareceu como mágica ao lado dele, o impedindo. Kevin era noivo, um noivo babão com uma noiva péssima e acabou conhecendo o total oposto dele, um garoto de programa gostoso que é bem esperto, foram perseguidos por um louco obsessivo que por acaso eu conhecia muito bem e no final estão casados, com um filho ainda por cima. Davi namora o próprio segurança particular que foi para a prisão por motivos totalmente desconhecidos, ninguém sabe exatamente a verdade do caso, os dois agora moram com o irmão de William, acho que o nome dele é o nome de uma cidade.
Espero que o drama nunca chegue a mim. Não teria como.
Levanto da cama e decido me vestir, já tentei parar de dormir sem roupa, mas não posso mudar isso assim como não posso mudar a vontade de fazer sexo pela manhã. Hoje, infelizmente, é um dos dias em que não há ninguém na minha cama para me ajudar com essa necessidade, terei que me segurar por algumas horas. A vontade de fazer sexo é transmutável, não me ocorre todo o santo dia, geralmente eu só sinto atração no corpo de alguém e imagina a cena na cama, depois só. Quando queria fazer sexo era uma coisa mais direta, menos gentil. Eu não conseguia ser gentil, já me disseram isso incontáveis vezes.
Sai do meu quarto com uma calça social e uma camisa azul que está um pouco apertada. Passei diretamente para à cozinha e peguei água na geladeira. Se minha mãe me visse de pés descalços indo abrir a geladeira ela me mataria.
Quase derrubei a garrafa ao ouvir a voz dele atrás de mim.
- Bom dia.
Tinha esquecido totalmente da existência de Gideon.
- Ficou me esperando acordado?
Ele sorriu abertamente e negou.
- Claro que não. Eu dormi como uma pedra.
Ele tinha um sotaque engraçado. O jeito como aumentava a duração das vogais: dormii, nãooo. Não sei de onde ele pode ter vindo, mas de perto é que não foi. Talvez tenha se acostumado com algum sotaque e agora não percebe que o fala. Estendi uma garrafa para ele, eu precisava testar uma coisa.
- Valeuu.
Ele bebe diretamente do gargalo da garrafa como eu estive fazendo. Ele com certeza não foi criado em algum lugar nobre, mas tinha postura quando queria. Havia aprendido com alguém, talvez. Gideon coloca a garrafa em cima da minha mesa e depois se vira limpando a boca com a mão.
- Eu meio que mastiguei um pouco de pasta de dente depois que acordei.
- Metade do tubo? - Pergunto.
- Um pouco menos. Podemos... conversar sobre ontem?
Não. Não podemos conversar sobre ontem, era o que eu queria dizer. Mas ele iria insistir e a voz de Gideon era irritante quando repetia a mesma coisa muitas vezes: pedi que fossemos para a sala, alguns minutos de atrasos não fariam diferença, depois que sairmos daqui eu ainda teria que deixá-lo no Hot e depois eu passaria na casa de Davi e por fim, iria trabalhar.
- O que você fez com ele?
Observei sua postura mais uma vez: costas eretas, dedos colocados nas pernas e joelhos juntos. Olhos que encara tudo menos a mim. Ele deve ter aprendido a não encarar e só tenho duas alternativas viáveis: a) ou a mãe dele o ensinou isso, b) ele deve ter ido para um colégio interno. Eu nem mesmo sabia das coisas que ele não sabia.
- Nada de mais.
- Eu vi o sangue, aposto que ainda estou com o sangue dele, nos meus sapatos.
Sei que é uma conversa séria, mas após ele falar isso foi inevitável não soltar um risinho de escárnio. A expressão dele não se alterou, ele era um garoto feito uma escultura de gelo imaculada, cabelos lisos mas que formavam cachos rebeldes nas pontas e olhos azuis que eram misteriosos, ao mesmo tempo em que mostrava uma inocência mostravam também que ele sabia de muitos truques caso quisesse. Estou admirando o corpo dele de novo, sei disso, mas não quero levá-lo para a cama. Apenas curiosidade, digo na mente.
- Digamos que... Ele precisará de um hospital depois disso.
Isso fez Gideon dar uma risada quase infantil.
- O que foi?
- Nada é que você falou como um vilão de um filme... me encarando como se eu fosse... sei lá, o mocinho.
- Você não é?
As bochechas assumiram um tom rosado cômico, mas ele não estava tão embaraçado ao ponto de não falar, muito pelo contrário.
- Claro que não sou.
- E eu sou o vilão então?
Ele nega também, parece se esquecer de que estávamos falando de um assunto sério. Seu rosto fica contente como o de uma criança com muito açúcar no sangue.
- Vilões não salvam as pessoas.
- Eu quase matei ele.
- Bom - ele deu de ombros - ele quase me matou de medo ontem, nada mais justo. Estou errado em dizer isso?
- Não. Não está Gideon.
Mais um riso.
- O que foi desta vez?
- O jeito como você fala meu nome é tão hilário! Gideon, como neon e não com o "O" solto. Gideo. É assim que você fala.
- Você sabe falar meu nome?
- Rafael.
- O próximo. - Se divertir às custas dele poderia passar a ser um hobby divertido.
- Lau... rente?
Ia ser um hobby muito, muito divertido.
O deixei no Hot.
Perdemos mais de meia hora conversando na minha casa. Ele falando mais, logicamente. Respondia suas perguntas de modo mais curto que conseguia, logo depois ele fazia um monólogo que parecia interminável, mas nunca falou nada sobre si.
Disparei para a casa de Davi com o peito acelerado.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Minha Submissão | Série Irmãos Laurent-(Livro 4) (Romance Gay)
RomanceRafael Laurent é o mais novo, o mais sagaz e misterioso dos irmãos Laurent. Gideon veio de muito longe, deixou várias pessoas para trás e chegou para cumprir um objetivo difícil. Uma mistura de mistério, sexo, descobertas de sentimentos e loucura...