Capítulo V

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       Eu olhei a mala que Rodrigo trouxe e encontrei escova de dentes, alguns cosméticos e algumas roupas, dessa vez de grávida. Inclusive uma calcinha, que eu estava sem. Também encontrei alguns cremes para o rosto, um celular e uma caixinha de presente.

        Senti uma leve onda de animação, e até isso tinha se tornado novo para mim. Eu não sentia nada há dias. Ao abrir, havia três pequenos macacõezinhos de bebe, com estampas do ursinho Pooh. Parecia três pequenos girassóis. Eu os abracei contra o peito e os beijei, como se estivesse dando um beijo nos meus bebês. Me emocionei com o gesto, claro, e chorei um pouco.

         Já não era mais aquele choro tão dolorido e desesperado. Vesti o pijama que Rodrigo trouxe e dormi abraçada com as roupinhas de bebe.

        Acordei de madrugada, com o barulho de uma chuva muito forte, com vários trovões. Me virei na cama algumas vezes e não consegui mais dormir, então resolvi ir até a varanda olhar a chuva.

        Passei por Manolo e ele dormia na sala, no sofá. A tv estava ligada e seu som bem baixinho, praticamente impossível de ouvir com o barulho da chuva, que parecia não perturbá-lo.

        Eu me sentei na rede e fiquei olhando a chuva, o mar e as ondas. A imagem era linda, eu amei. Poderia ficar olhando aquilo o resto da vida. Lembrei da minha mãe e de como ela amava chuva. Fiquei tão distraída que não percebi quando Manolo se aproximou de mim com uma manta.

          - Não quis te assustar.

          - Está tudo bem, eu estava distraída.

        - Está tudo bem?

         - Sim, só perdi o sono.

        - É uma vista linda, não é? - ele disse e puxou uma cadeira que estava próximo a churrasqueira, sentando se perto de mim, sem se incomodar com alguns respingos de chuva que nos acertavam.

         - Poderia olhar isso para sempre.

        - Eu também.

         Ficamos em silêncio por um tempo.

         -  Minha mão adorava chuva, ela teria adorado aqui.

          - Sinto muito pelos seus pais.

        - Obrigada. Faz quanto tempo? estou perdida no tempo?

        - Acho que uns... - ele pensou um pouco - vinte dias?

        - Vinte dias dos quais não me lembro de nada.

       - A mente nos prega peças às vezes...

        - A minha barriga já está aparecendo e eu ainda não tenho um plano.

        - Um plano?

        - É, sobre o que fazer, como criar essas crianças... Meu Deus, nem estou fazendo pré-natal...

        - Calma, não é como se fossem nascer amanhã. você ainda tem algum tempo

        - Mas não muito tempo.

        É verdade. mas antes de se preocupar com as coisas externas você devia se preocupar com as coisas aqui ó - e com o dedo indicador ele apontou para minha cabeça e para meu peito, indicando o coração.

        - Essa é a parte mais difícil

         - Por isso deve começar por ela.

         - Ai!

        - O que foi?

         - Ai! acho.... hum... acho que estão se mexendo! Sente! - eu peguei a mão dele e coloquei sobre a minha barriga, onde eu sentia mexer.

        - Nossa! parece mesmo!! são três, é isso mesmo?

        - Sim - disse sorrindo e soltando a mão dele.

        - Não podia ser um de cada vez?

       - Poderia mais... - me lembrei que Alexandre estava me drogando, com remédios indutores de ovulação sem meu consentimento, para facilitar a gravidez. Cheguei a pensar se ele não havia me inseminado artificialmente, não é tão comum a gestação múltipla. Me lembrar disso me deixou triste.

        - Coloque para fora, quem sabe ajude. - eu respirei fundo e tentei, precisava ser forte por esses pequenos chutadores dentro da minha barriga.

        - Acho que meu marido me deu remédios para que eu engravidasse. isso pode ter feito com que fossem trigêmeos.

        - Como um tratamento para engravidar

       - Sim, mas sem que eu soubesse

        - E como você descobriu?

       - Rodrigo me ajudou, achei alguns documentos no computador do consigliere dele.

       - hum...

       - E você chegou a falar com ele sobre isso?

       - Não, eu fugi.

       - E já pensou no que vai fazer agora, em relação aos bebês?

       -Não, não tenho certeza, mas sei que ele não vai me deixar em paz a menos que eu volte com ele, ainda mais agora... acho que o mais seguro é que ele não saiba aonde eu estou.

         Descobri que Manolo era mais velho do que aparentava. Devia ter quase sessenta anos, mas nem de longe aparentava isso. Ele era forte, energético, cheio de vida e de bom humor. Ele era espanhol e embora falasse o idioma das ilhas, mantinha suas raízes. Ele me lembrava um pouco meu pai pelo bom humor e pelo sorriso fácil, além de sempre me fazer sentir a vontade, sem que eu precisasse dizer uma única palavra. 

Eu te faço livreOnde histórias criam vida. Descubra agora