PRISCILLA NARRANDO...
10 de outubro, sempre será o pior dia da minha vida. O dia que meu filho foi atropelado, o dia que eu percorri o corredor do andar de cirurgia até a porta do bloco cirúrgico sob aplausos, era uma tradição do hospital, onde todos os médicos e enfermeiros faziam uma fila dos dois lados dos corredor e aplaudiam a pessoa que doaria os órgãos e salvariam outras vidas. Fui ao cemitério com as meninas, a Natalie estava lá. Ela e eu não nos falamos desde a discussão do jantar. Só falamos sobre as meninas, mais nada. A noite na missa, decidimos comer uma pizza para quebrar aquele gelo todo, e ela não quis ir e ainda disse que cancelou a passagem dela. Ela não iria com a gente. Eu não ia insistir mais. No dia seguinte viajamos. A Inácia estava petrificada dentro do avião, era a primeira vez que ela voava. A filha dela já estava super enturmada com as meninas. Helena foi também, com as filhas, uma das filhas da Alisson tia da Natalie também foi. Foram 7 dias bem divertidos, e a Natalie não mandou uma mensagem sequer. No dia que cheguei fui ao hospital precisava dar a resposta ao chefe e aceitei o cargo. Ninguém saberia ainda, até que eu estivesse a par de tudo. Fui procurar Natalie na casa dela e como sempre, acabou em briga. Me chamaram no hospital, era um paciente meu antigo. Eu cheguei e os pais dele estavam desesperados. Bryan tinha 12 anos. Ele não tinha expectativa de chegar nem aos 5 e eu consegui fazer com que ele chegasse aos 12 anos. Ele tinha câncer e o operei 28 vezes e agora já era metastático fazia 2 anos, e ele estava vivendo bem até então. Eu o operei novamente, consegui ressecar o máximo que eu podia dos tumores, mas havia tomado boa parte do coração dele e o cérebro. Quando terminei de ressecar o câncer do coração dele a neurologista veio verificar a função cerebral dele.
Marcela: Tarde demais Priscilla. Pupilas fixas e dilatadas. Ele está com morte cerebral. Em 6 horas faremos novos exames se não houver resposta pode declarar. Sinto muito.
Eu: Droga – terminei de fechá-lo e o mandei para UTI. Tirei aquela roupa, me lavei e fui até os pais. A cirurgia durou 10 horas.
André: E então como ele está?
Rita: Conseguiu ressecar os tumores? Já podemos vê-lo?
Eu: Eu ressequei o máximo que pude, mas além de já ter se espalhado por todos os órgãos dele que eu poderia alcançar, espalhou por todo o cérebro dele.
André: Chamou um neurocirurgião?
Eu: Sim, chamei, mas já era tarde demais. As pupilas dele estavam fixas e dilatadas. Isso significa que ele está com morte cerebral. Um novo exame será feito em 6 horas que é o tempo de protocolo do hospital para declarar 100% a morte cerebral de uma pessoa. Eu sinto muito André e Rita, mas não dava mais para fazer nada.
Rita: Você é a melhor, você sempre o salvou. Ele não viveria nem até os 5 anos e hoje ele tem 12. Volta lá e faz o seu trabalho, eu não vou admitir perder meu filho – falava nervosa.
Eu: Rita eu entendo sua dor...
Rita: NÃO, VOCÊ NÃO ENTENDE... – gritou vindo para cima de mim e o marido dela a segurou.
Eu: Entendo sim... Eu perdi meu filho de 2 anos a 8 anos. Ele foi atropelado na calçada por um bêbado e teve morte cerebral. Eu doei todos os órgãos do meu filho eu vi meu filho partir e não pude fazer nada. Eu sei o que está sentindo eu sei que doi, mas o Bryan se foi, a missão dele acabou e ele já estava sofrendo muito. Não sejamos egoístas com ele agora. – sequei a lágrima que caia – Uma enfermeira vai leva-los até a UTI, para ficar com ele o tempo que quiserem. Eu sinto muito de verdade. Eu fiz tudo por ele. Eu estudei tudo que eu podia e não podia, eu quebrei protocolos por ele que custariam minha licença médica inúmeras vezes, para dar mais alguns anos de vida pra ele e eu consegui, mas agora não está mais nas minhas mãos. Eu Creio em Deus, e só um milagre o tiraria de uma morte cerebral. Não sejam injustos e não sejam ingratos com ele. Ele suportou muito tempo por vocês. Entendam isso, por favor. – sai e fui para a minha sala. Eu me sentei e chorei. Era duro perder uma batalha ainda mais quando era uma criança e ele era uma criança extremamente alegre. Logo bateram na porta e abriram. Eu levantei a cabeça era a Gabriela. Ela se sentou e colocou um copo de café na minha frente.
Gabriela: É café...
Eu: Obrigada. Estou precisando. – dei um gole.
Gabriela: Fez o que pode doutora, não estava mais na suas mãos. Ele chegou praticamente morto aqui hoje.
Eu: Sim, eu sei. Ele não ia viver nem até os cinco anos e ele hoje tem 12. Eu quebrei inúmeras regras. Eu passei por cima do FDA pra cuidar dele com tratamentos experimentais que poderiam mata-lo e ele sobreviveu. E no fim eu saio diante da mãe dele como uma provável médica ruim. Eu fiz tudo que eu pude e eu não vou pedir desculpas por isso. – falei nervosa.
Gabriela: E nem deve. O quadro dele, qualquer outro medico de qualquer outro hospital o medicaria até que ele morresse. Ninguém ia tentar, ninguém ia gastar recursos nele porque saberiam que era caso perdido e você tentou.
Eu: Quando a pressão dele subiu eu imaginei que o cérebro dele poderia ter herniado. Por isso chamei a neuro. Ele estava consciente quando eu cheguei. Ele não me reconheceu, ele pediu pra jogar bola na praia, ele não sabia quem era. Ele falava palavras desconexas, e o pai dele disse que ele estava assim a cerca de um mês.
Gabriela: Já era o tumor falando por ele.
Eu: Sim, estava se espalhando pelo cérebro dele. Cirurgia nenhuma no mundo o salvaria.
Gabriela: Sim...
Eu: Mudando de assunto... Você não deveria estar estudando para o seu exame final?
Gabriela: Sim. Mas eu precisava cortar alguma coisa, eu estava ficando louca, fiquei com medo do meu cérebro murchar e secar e eu nunca mais conseguir ser médica. Ou dele se liquefazer no meio do teste.
Eu: Que exagero. Você não vai para o holocausto, é só um teste. Se não passar, você não vai parar de praticar medicina, só vai fazer outro ano que vem e continuar sendo residente até lá. – ri.
Gabriela: Doutora... Tem a possibilidade, de continuar aqui no hospital depois do teste? – sorriu sem graça.
Eu: Sim claro. Temos uma vaga em cirurgia geral, uma em ginecologia e uma em ortopedia, você já escolheu sua especialidade?
Gabriela: Cirurgia geral. Eu amo a cirurgia geral.
Eu:Tem grandes chances. Temos 3 residentes que farão testes contando com você quefarão para cirurgia geral. Você terá meu voto – mal sabia ela que ela seria minha staff e eu anova chefe... Alguém a chamou e ela saiu rapidamente.
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NATIESE EM: A CULPA
FanfictionMeu nome é Priscilla Álvares Pugliese Felix, tenho 34 anos, sou médica cardiologista e cirurgiã geral, atualmente moro num condomínio na Barra da Tijuca no Rio de Janeiro. Sou divorciada de Natalie Kate Smith de Almeida 35 anos arquiteta e engenheir...