PONTO FINAL

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A missa de sétimo dia acabara muito tarde e Ivan e sua mãe saíram apressados da catedral afim de pegar o ônibus para casa. O ponto de embarque estava cheio e os ônibus saiam abarrotados de gente, a maioria fiéis que saíram da missa.

Dois ônibus encostaram e o pessoal no ponto se acotovelaram para entrar.

– Entra pela porta de trás que eu vou entrar pela frente e pagar nossas passagens – disse a mãe de Ivan, sua voz soando longe e distante, nem parecia está falando com ele.

Ivan estava jogando Free Fire no celular.

– Tá – disse ele sem olhar para a mãe e balançando a cabeça.

Sem desgrudar os olhos da tela, entrou no busão de trás. O que estava mais vazio. Deu sorte moleque. Sentou-se numa cadeira lá nos fundos, ao lado de uma garota pálida e esperou pela sua mãe. O busão acelerou e a mãe do Ivan, cadê?

O garoto terminou a sessão de jogatina levando um tiro na cabeça e xingou. A menina pálida ao seu lado colocou uma mão na boca e abafou uma risadinha. Ivan olhou para a cara da menina. Parecia uma caveirinha, os olhos fundos.

– Parece que está sem sorte não é mesmo amiguinho? – disse ela ainda rindo.

Ivan achou a menina idiota.

– É só um jogo – disse ele. – Na próxima vou sobreviver.

– Sobreviver – disse a garotinha num tom alto e ao mesmo tempo perdido como se a palavra lhe trouxesse alguma lembrança a muito esquecida. Alguns passageiros viraram a cabeça na direção deles, seus rostos pálidos e inexpressivos.

– Sim. Foi o que eu disse.

– Mas você vai ter uma segunda chance?

– Claro. É só reiniciar. Depois vou esperar que outros jogadores entrem na partida, porque estou jogando online. Ranqueado.

A garotinha conteve novamente outro risinho com a mãozinha ossuda.

– Qual a graça? – perguntou Ivan. – Nunca jogou Free Fire?

– Não é isso.

– Então do que se trata. Fala logo. O jogo já vai começar.

– Eu não estava falando sobre o jogo.

Nesta hora, o busão deu uma sacolejada e Ivan olhou para a janela. Que paisagem era aquela. Deveriam estar passando pelo rio que atravessava a cidade. Mas pela janela ele via apenas sombras turvas e um luar lívido.

– Não conheço este lugar. Para onde estamos indo?

A garotinha abafou outro risinho.

– Pensei que você soubesse, Ivan.

– E como você sabe meu nome?

Ela não respondeu e seu olhar de repente ficou vítreo. Pela janela sombras e pesadelos. Ivan se arrepiou.

– Preciso sair daqui – disse ele se levantando e puxando a cordinha do sinal para o ônibus parar. Mas ele não parou. Ivan sentiu outro arrepiou e se lembrou de uma coisa que não deveria ter esquecido. – Pera aí...cadê minha mãe?

Colocou o celular no bolso. Ia perder outra sessão. Cair de nível, mas ele não estava nem mais pensando nisso. Só podia pensar em sua mãe. Puxou mais uma vez a cordinha e nada do ônibus parar.

– Não vai adiantar garoto – disse a garotinha, seus olhos fixados no nada. – Ele só vai parar agora no destino.

Ivan andou pelo corredor enquanto puxava a cordinha, mas nada acontecia. Ele começou a chorar. Tentou achar sua mãe sentada em alguma poltrona. Nada. Mais choro. Os passageiros olhavam para ele e riam. Ivan teve medo dos passageiros pois não pareciam normais. Seus rostos eram pálidos e pavorosos. Ivan puxou mais uma vez a cordinha;

SOMBRAS DA NOITEOnde histórias criam vida. Descubra agora