Capítulo 32: A primeira foi você

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Pov Rafaella

O Diogo me paga!

Fomos acompanhadas por um garçom até a saída da forma mais gentil possível. Pelo que vi, não estamos longe da casa de ópera. Eu gosto de ópera. Parece me acalmar. Embora eu esteja estranhamente desconfortável aqui.

— Sabe... eu me sinto brava.— eu não falei, eu pensei alto. Estávamos descendo uma das ruas, a fim de chegar à praça da Bastilha, onde se encontra nossa próxima distração. Tanto eu quanto Bianca, tínhamos as mãos dentro dos bolsos, estávamos usando um sobretudo. Ela vestia um tom de bege, e eu... preto. Embora tenha um parecido com o dela.

Bianca me olhou, perfeitamente atenta a qualquer coisinha que pudesse sair de minha boca. Como se fosse a boca que controla o que falamos... E eu não sabia o que dizer, ela estava me olhando curiosamente enquanto as ruas de Paris presenciavam essa cena de... sei lá. Um grande, enorme, colossal: sei lá.

Deve ter escrito em neon na minha enorme testa agora, para chamar bastante atenção apenas duas palavras: sei lá.

— Estou ouvindo.— então ela finalmente disse algo. Notei que ao mesmo tempo, seu olhar já não me focava mais. Fui trocada por Nicholas, o que está totalmente bem. O tempo não estava diferente dos dias anteriores: estava gelado. E Bianca tinha as bochechas, e a ponta do nariz, em uma coloração vermelha. Assim como todo o resto da cidade. Inclusive eu... e Nicholas.

Pode ser coisa da minha cabeça, mas o ar gelado faz parecer que estamos a todo momento com os olhos marejados. Certo? Talvez sim... se o ar for ressecado. Caso contrário, é só mais um efeito colateral do tempo frio influenciando sobre nosso cérebro.

Eu fechei os olhos por breves segundos, suspirando em seguida e ainda estava em movimento. Enfiei minhas mãos nos bolsos mais ainda, como se fosse possível. Então abri os olhos, sem saber o que dizer. Sem saber como achar a resposta para a minha frustração e nervoso.

— Acho que estar aqui representa muito mais do que eu esperava. E estar aqui sem ele me deixa completamente frustrada, perdida. Com a sensação de ter sido traída. Sei que não fui... mas ainda assim, ele não foi capaz de falar com o pai e aparecer? De verdade? Todas essas cidades são apenas um combo do que eu realmente queria. Era aqui. Eu queria estar aqui, de preferência com ele. E agora...

E agora o quê? Minha fala foi interrompida por um longo suspiro perdido. Ótimo! Agora ela vai pensar que eu sou uma louca desesperada pela atenção do marido e que não dá a mínima para a carreira dele, que no caso está crescendo. Sério isso? Só essa descrição já me deixou deprimida.

Mas é Paris... estamos falando de Paris e um relacionamento longo o bastante para ele saber que eu me importo.

Preferia uma hora aqui, em Paris, do que todo o resto. Nem que ele fosse embora no mesmo dia, ele poderia só...

— E agora você vai entrar em uma casa de ópera acompanhada pelo seu filho e uma mulher que diz coisas completamente opostas às suas crenças de amor.— ela sorriu de canto, e eu também. Esse era o propósito dessa fala, eu suponho.— E ficará ocupada pelas próximas duas horas e meia, enquanto escutamos uma das seleções de melhores títulos escolhidos por profissionais que trabalham aqui. É, você pode ter o direito de ficar frustrada. Só não agora.— ela apressou um pouco o passo, já que estávamos ali.

Eu fiquei sem reação, claro! Não sei o que isso quer dizer.

— Não estou reclamando de estar aqui com você, eu— eu a alcancei antes que ela entrasse. Ela se virou e tudo parecia normal em seus olhos. Mas não pude terminar meu pensamento.

— Você tem total direito de se sentir assim. Apenas não agora.

Pov Bianca

Eu soube desde o início do dia que algo estava errado pela forma que Rafaella franzia a testa de vez em quando, pensando em possíveis mortes para o marido. O que eu entendo. Essa cara de poucos amigos piorou após Diogo entrar na jogada, então eu o afastei pelo resto da noite. Eu compreendo Rafaella, tudo o que ela tem aqui sou eu e o Nick, mas convenhamos... ela quer uma conversa de verdade. Com pessoas que ela conhece. Eu sinto que ela está frustrada, aflita, brava e principalmente confusa. Então meu plano de ataque é: dar atenção. O máximo que eu puder. Exceto pelas próximas duas horas e meia.

Nós entramos, o aglomerado de pessoas era somente na entrada mesmo, pois dentro parecia calmo. Cheio, sem dúvidas, mas calmo. O lugar abrigava cerca de 2.700 lugares, e todas essas pessoas estavam esperando pelo espetáculo. Ouviríamos Mozart, Bizet, Verdi, Donizetti, Weber e Rossini. As melhores de cada um. Rafaella é adepta ao clichê, eu diria que ela gosta de Mozart e Rossini. Não sei, pelo jeito dela.

Nossos lugares eram privilegiados, sem sombra de dúvidas! Rafaella ficou ao meu lado, e Nicholas ao lado dela. E mesmo que eu estivesse super confortável no assento, Rafaella parecia não estar. Na verdade ela estava sim, mas estava longe. Sua mente estava em São Paulo, eu suponho.

— Apenas sinta o que essas pessoas podem fazer com a garganta.— falei baixo, e com aquela pitada de humor. Deu certo, pelo visto. Ela sequer me olhou, mas acenou com a cabeça e seu mínimo sorriso fazia parte também. Mas fiquei em dúvida se o sorriso foi para mim, ou se ele acompanhava as palmas que ela estava dando em direção ao palco. Esse questionamento ficou comigo pelas próximas... duas horas e meia.

(...)

Foram 28 músicas, quatro pausas, e muitas palmas. Como eu previ, sua linguagem corporal se mostrou muito mais favorável quando os sons de Mozart e Rossini soaram. E agora, como têm sido todas as noites, estamos andando pelas ruas. O objetivo é voltar para o hotel dela e minha casa, mas confesso que demos algumas voltinhas aleatórias.

— Como você se sente sendo assim?— de repente ela começou a falar. Eu a olhei com certa curiosidade.— Tão elegante, Bianca...— ela explicou sorrindo.

— Oh... é por que eu estou vestindo um sobretudo e estamos na França?— minha pergunta era dividida entre humor e seriedade. Rafaella levou pelo lado humorado. Eu também.— Sabe... qualquer pessoa aqui ganha esse ar elegante, esse charme absurdamente poderoso. Claro, eu sou daqui, então o meu charme é natural. Mas você, por exemplo, exala o mesmo charme. Nesse momento.— não menti.— Você nunca notou, mas parou alguns olhares em cada lugar que estivemos. Você foi tomada pelo charme francês.— brinquei.

— Sério... você e o Diogo?— oh Deus!

Eu sorri. O mais posso fazer?

— Ele foi a segunda pessoa que vi assim que coloquei meus pés dentro da faculdade. No mesmo dia nós almoçamos juntos, ele me apresentou por aí dizendo que eu era francesa e toda vez que ele dizia isso, ganhava um tapa. Claro, os dias passaram e eu até esperava pelo pior, sabe? Como se ele fosse estar lá somente aquele dia. Mas não, para a minha surpresa ele estava lá no próximo, e no próximo, e no próximo...— eu acabei sorrindo, desejando por breves segundos que o tempo voltasse.— Daí para frente ficamos amigos, brincamos com o tal casamento e depois tive que vir embora. Bom, alguns beijos em festas não podem ser descartados. O engraçado durante os seis meses que fiquei, foi ele ter escondido que não queria ser só meu amigo. E com o humor alterado por causa da viagem de volta, nós brigamos antes de eu entrar no avião. Quero dizer... eu tinha o direito de saber, certo?— assim que parei de falar algumas perguntas surgiram.

Eu tinha o direito? Certo? Ou não?

— Você teria correspondido se ele tivesse...— ela me olhou, eu olhei para Nicholas. Ele observava algumas plantas muito bonitas que aquela rua tinha.

— Não. E saber disso me deixa confusa com a minha reação tão agressiva quando soube...— eu iria embora de qualquer jeito, não é como se eu pudesse corresponder.

E novamente eu vi ela franzindo a testa bem de leve. Ao mesmo tempo, chegamos ao hotel dela.

— Você disse que ele foi a segunda pessoa que você viu por lá...— paramos em frente a porta.— Quem foi a primeira?

Como se isso fosse importante...

Pelo olhar dela, era.

— Você.

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