Capítulo 19

151 23 1
                                    

Dean e Castiel estavam novamente com as mãos na massa no quarto de Charlie.

Era a tentativa de Dean de ajudar Castiel a enfrentar seu luto, e uma tentativa de Dean de se manter ocupado e não pensar no estranhamento que estava rolando entre ele e Sam, ou ao menos era como eu entendia a situação.

Sam queria caçar, queria cair na estrada, e Dean não queria saber de caçar. Queria ficar em casa comigo, cuidando de mim, acompanhando a gravidez.

Se fosse somente isso, eu não estaria realmente preocupada, mas havia outra coisa acontecendo, algo que eu e Castiel havíamos notado há muito tempo.

Sam estava diferente. A percepção que eu tinha de seu rosto havia mudado, mas eu nunca entendi ao certo o motivo.

Na última vez em que ele e Dean saíram juntos para resolver um caso, Castiel e eu secretamente fomos atrás deles. Ele me manteve de baixo de sua asa, para que ninguém me notasse, e então seguimos Sam durante uma madrugada.

Ele continuava se encontrando com Ruby, o que em si era uma coisa que nenhum de nós gostava ou aprovava, mas que por si só não era reprovável.

Isso até Castiel e eu vermos eles entrando num quarto de motel e ela cortar o próprio braço, oferecendo seu sangue a Sam, que ele bebeu como se fosse água no meio do deserto. Aquele era o motivo de eu enxergar seu rosto de forma diferente.

Dean não sabia, sequer desconfiava, ou assim pensávamos. Castiel e eu estávamos de mãos atadas, pois recebemos ordens de não interferir, e para mim, era o pior. Ver Sam daquela forma, cada vez mais...

Demoníaco.

Vê-lo daquele jeito e não poder fazer nada era terrível, porque da última vez que interferimos em algo, destruímos uma família. Gabriel eventualmente apareceu em uma das vezes que saímos para espionar Sam e nos censurou.

– Você tem que deixar acontecer – ele disse. – Lembre-se do que ela falou. Se faça de cega, finja que nada de mais está acontecendo. Não interfira no que acontecer entre Sam e Dean, apenas preste seu apoio.

Obviamente eu precisava perguntar:

– É por isso que abandonou Sam?

E obviamente, Gabriel sumiu sem me dar respostas, o que por si só já respondia a minha pergunta.

Quando Sam e Dean eventualmente se estranharam e Sam saiu para caçar sozinho, imaginei que talvez Dean tivesse visto algo, ou que ao menos suspeitasse, mas não perguntei. Ele estava organizando o quarto de Charlie e parecia feliz com isso, assim como Castiel, e eu decidi que não valia a pena chateá-lo trazendo o assunto à tona.

Os dias se passavam e cada vez mais ficávamos só nós três em casa, e Sam passava mais tempo ainda com Ruby, para meu desespero.

Porque nós havíamos nos afastado além da possibilidade de remediação. As coisas nunca mais foram as mesmas, mesmo que, no que dependesse de mim, pudéssemos recomeçar. Eu só precisava que ele confiasse em mim, que não escondesse o que fazia, e, no entanto, Sam era movido à segredos agora.

Cass e eu vez ou outra éramos ordenados a comparecer em campo, e eu acabava pedindo para Dean ir conosco, para que ele não ficasse sozinho em casa. Nós três éramos efetivos caçando demônios, isso era um fato. O problema, na verdade, era que Lilith era muito mais rápida que nós e que os outros anjos da guarnição de Castiel e de outras guarnições. Não importava o quão rápido eles seguiam pistas, a desgraçada sempre estava um passo à frente de todos.

Mais de trinta selos haviam se rompido e eu não tinha mais esperanças de pará-la. Gabriel me dizia que eu deveria deixar as coisas acontecerem, mas como eu poderia não me incomodar com o que Lilith estava fazendo, deturpando a ordem natural das coisas? Massacres acontecendo, professores matando seus alunos de jardim de infância, médicos presos por envenenar pacientes...

A Terra estava lentamente sendo engolida pelo caos dela e ser constantemente lembrada de que deveria deixar rolar não era reconfortante. Eu estava sem paciência para todo aquele drama, mas minha preocupação com o distanciamento de Sam e Dean só aumentava. Sam cada vez mais estava na estrada, enquanto nós diminuíamos as nossas caçadas.

Então setembro havia chegado. Já era outono de novo e eu logo estava ocupada varrendo as folhas que se amontoava do lado de fora da igreja do padre Kellan. Já passávamos tanto tempo em casa que mesmo Dean e Castiel me acompanhavam no trabalho voluntário da igreja.

Cass me acompanhava por segurança, depois de cada ronda que fazia na cidade, conforme suas ordens, para manter eu e Charlie seguras e a salvo de quaisquer demônios que surgissem. Já Dean se empolgava em me ajudar a levar comida para os eventos da igreja, cujo número de fiéis gradualmente crescera desde o ano anterior.

Vê-los cada vez mais próximos era uma das poucas coisas que me deixavam tranquila e feliz ultimamente. Eu não me saía muito bem como o pilar da família, mas ao menos nós três permanecíamos unidos em meio ao caos.

Unidos demais, até.

Dean achava que eu não percebia seus olhares indiscretos na direção de Castiel e vice-versa, ou que eu não notava que ele mordia o lábio quando Cass começava a desabotoar sua camisa na nossa frente, depois de eu muito insistir que ele trocasse o figurino de vez em quando. Ele havia aderido a um terno completamente negro, que quase havia se tornado sua segunda pele.

Mas no que dependesse de mim, não seria sua segunda pele por muito mais tempo. Meu aniversário estava chegando e eu tinha muitos, muitos planos em mente para nós três, já que estávamos sozinhos em casa na maior parte do tempo, e Sam, nosso querido rebelde, não dava sinais de que lembraria da data.

Depois de resolvermos um caso envolvendo fantasmas, não demorou muitos dias para Sam encontrar outro caso, um que ele suspeitava se tratar de um ghoul. Eu sabia que era apenas uma desculpa para ficar a sós com Ruby e beber o sangue dela para ficar mais dependente dela, e mais forte para matar demônios.

Eu já havia desistido de tentar intervir, então, quando ele fez as malas de novo e sumiu com Ruby, eu apenas deixei nas mãos de Deus. Ou da estranha, quem quer que fosse. Se deveria deixar rolar, então que rolasse.

Enquanto Lilith estivesse rompendo selos, eu me ocuparia com outras coisas.

Winds of FortuneOnde histórias criam vida. Descubra agora