Capítulo 54

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Quando eu imaginava aquela luta, eu imaginava que seria brutal, sangrenta, dolorosa, e definitivamente barulhenta.

Mas as coisas que estavam acontecendo enquanto presenciávamos a luta eram bem piores do que eu poderia ter imaginado.

Não apenas isso, como Lúcifer não calava a boca, tentando, de todas as formas, fazer com que seus irmãos se sentissem culpados pelo fato de ele ter sido expulso, reclamando dezenas de vezes por não ter recebido o apoio deles, reclamando do fato de Miguel ter o chamado de monstro.

Além de uma prima-dona irritante, era uma criatura detestável por natureza.

Do jeitinho que Deus queria.

Ele não levava em consideração toda a dor que seus irmãos tiveram que suportar por culpa dele, e o mesmo valia para Miguel, que nunca se importou verdadeiramente com nenhum deles.

De certa forma, Miguel conseguia ser terrivelmente pior que Lúcifer.

Porque Lúcifer era o rebelde, o sanguinário, todos já sabiam que não podiam confiar nele e que sempre deveriam esperar o pior de sua parte.

Mas Miguel conseguiu enganá-los direitinho, com discursos pomposos sobre união, sobre família, sobre o plano de Deus e obediência cega, e o fez com tanto empenho que mesmo Rafael caíra em sua lábia.

Agora o filho mais velho e o filho mais novo e rebelde se enfrentavam, finalmente, como Ele havia planejado por puro sadismo.

Me fazia pensar que mesmo que tudo aquilo tivesse seguido seu curso calculado, ainda não mudava o fato de que eles haviam escolhido ser daquele jeito.

Lúcifer atacava com raiva, expondo seu ego monstruoso, e Miguel apenas deixava que ele gastasse sua energia, que reclamasse como uma criança irritada.

Porque, quando Miguel decidia que Lúcifer já tinha falado demais, e decidia atacar, a coisa ficava ainda pior.

Miguel não brigava brincando, como o mais novo. A impressão que eu tinha era de que Lúcifer, de alguma forma, ainda esperava que o irmão ficasse ao lado dele. Os dois contra o mundo, e tudo mais.

Ele não podia estar mais enganado.

Lúcifer parecia não entender, ou não querer aceitar, que Miguel apenas queria matá-lo. Não havia mais nenhum resquício de amor fraternal ali. Aquela era uma tolice a qual Lúcifer tentava se agarrar para nutrir esperanças, talvez.

A noite já tinha caído, e nada da luta se encerrar. Estávamos todos impacientes com o fim, e, no entanto, era preciso esperar a hora adequada de abrir as portas da jaula.

Abrir na hora errada poderia custar nossas vidas, e mesmo que eu soubesse que poderia ser trazida de volta, eu não estava nem um pouco entusiasmada com o conceito de morrer de novo. Uma vez foi mais que o suficiente para me fazer agradecer por ainda respirar e ter uma chance de continuar lutando.

Um golpe ousado da parte de Lúcifer me tirou dos meus devaneios.

Ele havia cortado o braço do mais velho com sua lança.

Miguel, lentamente baixando os olhos para o corte em seu braço esquerdo, tocando o sangue fresco, mostrou um sorrisinho maligno.

Fodeu.

Foi ali que ele decidiu lutar pra valer, finalmente. Com golpes sequenciais e intensos, ele tentava desarmar Lúcifer ou quebrando sua lança, ou cortando um de seus braços, mas Luci, como imaginávamos, tinha uma excelente defesa.

Afinal de contas, tinha seu orgulho, e não planejava perder para o mais velho.

A luta se tornou gradualmente mais rápida, mais difícil para que meus olhos acompanhassem, mas eu sabia que ambos estavam cada vez mais feridos. Por mais que fossem arcanjos e que sua tolerância à dor fosse maior que as nossas, suas lanças ainda eram especialmente feitas para o propósito de os matarem.

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