Capítulo 25

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Acordar suando em uma sala quente como um forno...

Não era a primeira vez que aquilo acontecia.

E nem a primeira vez que eu acordava presa.

Victoria e outro demônio cujo nome eu desconhecia já tinham feito isso antes e eu sabia o que acordar presa e com frio significava.

Ou ao menos eu achava que sabia.

Porque quando eu abri meus olhos naquela sala, amarrada em uma mesa ginecológica onde estranhas tiras de couro mantinham meus braços, pernas e torso presos, além da minha boca estar presa de forma que mesmo que eu tentasse, não conseguiria abrir minha boca por nada, algo dentro de mim me dizia que daquela vez seria diferente.

Daquela vez seria pior.

Daquela vez eu tinha Charlie comigo, pequena e indefesa, assim como eu.

Ouvi uma porta se abrir, e dela alguém passar, empurrando o que eu deduzi ser uma mesa metálica. E Alastair...

Alastair estava cantando.

– Heaven, I'm in Heaven, and my heart beats so that I can hardly speak – ele cantarolava enquanto posicionava a mesa ao meu lado.

E lá eu vi os instrumentos de tortura.

– And I seem to find the happiness I seek, when we're out together dancing, cheek to cheek – sorriu para mim, mostrando uma faca. – Olhe só pra você, quietinha e comportada, do jeito que eu gosto. Mansinha e dócil. Imagino que Dean seja um grande fã disso também. Sabe, lá em baixo, enquanto a gente se divertia, ele também era mansinho – sorriu de canto. – Um garoto comportado. Isso, é claro, depois de eu arrancar a língua dele, entre outras coisas – deu de ombros. – Depois de arrancar umas fatias de pele, todo mundo fica educado, não é verdade?

Franzi o cenho, irritada. Queria mandá-lo pro Inferno.

– Mas você, mocinha, já ganhou fama lá em baixo. Inveja nos falou de você, e posso dizer que ela está muito, muito ansiosa pra pôr as mãos em você, mas, sabe, eu gostei de você. Você tem coragem, não é à toa que se casou com o Dean, dentre todas as pessoas. Mas se minha opinião vale de algo, você deveria ter ficado com o vampiro. Teria se tornado imortal, e não teria se tornado Santa. Não estaria aqui agora se tivesse ficado onde estava.

Revirei os olhos, desviando o olhar.

– Ah, não, não seja assim, Isabella. Modos, ouviu? Apesar de eu estar ansioso para fatiá-la toda, eu tenho certas ordens a cumprir, então vamos por partes, sim? Sabe o motivo de termos pegado você?

Neguei com a cabeça, o máximo que podia.

– Um dentre as centenas de selos existentes diz respeito a um dos seus. Veja, está escrito: ''Quando um humano santo, nomeado por Deus, derramar sangue dos inocentes que foi ordenado a proteger, um selo será rompido''.

Arregalei os olhos, o encarando.

– Lilith não gostava muito de você antes, mas, mocinha, você é feroz! – ele riu. – Tem seu estilo. Ela gosta disso, gosta das ferozes e determinadas, e você conquistou a atenção dela. Lilith quer fazer de você uma de nós, torná-la uma das melhores. Se você se aliar à nossa causa e virar um demônio, assim como Dean e Sam, viverão eternamente, e nas graças do nosso pai. Nunca mais serem perseguidos por coisa alguma, não é tentador?

Eu sabia que aquilo nunca aconteceria, mesmo que eu fosse burra e cedesse. Desviei o olhar, irritada.

– Nós só queremos que nosso criador seja libertado. O Apocalipse acontece, alguns humanos morrem... – deu de ombros. – Imortalidade aos que sobrarem, e muitas almas para torturar – ele suspirou sorrindo. – Não está cansada de sofrer pela causa de Deus e dos anjos? Eles não podem proteger a sua família. Se pudessem, você não estaria aqui agora. Mas você, indo pro Inferno e se tornando um novo animal, como Dean se tornou, será forte o suficiente pra acabar com qualquer um no seu caminho.

Franzi o cenho para ele, esperando que ele se explicasse. ''Novo animal''?

– Ah, você não sabe o que ele fez, não é? – ele sorriu, aproximando a faca ao meu braço e começando a me cortar, no que eu prendi a respiração para não gritar. – O Dean, ele... Como posso dizer? Não tinha tanta fibra quanto o pai. John era difícil. Construiu uma reputação no Inferno. Por cem anos eu o torturei e por cem anos ele negou minha proposta. Muita força de vontade. E aí ele escapou, quando os portões do Inferno se abriram... – suspirou. – E Lilith precisava de um substituto. Não qualquer um, é óbvio.

Precisavam que Dean rompesse o selo no lugar do pai e começasse tudo.

– E quando o garotinho do papai apareceu eu pensei: ''puxa, mais um Winchester!'' – ele riu. – ''Será que esse é durão também?''. Imagine o misto de decepção e surpresa que eu senti quando Dean desistiu em trinta anos e topou torturar outras almas!

Engoli a seco, descrente, enquanto ele continuava cortando meu braço.

– Um aluno exemplar! – ele disse animado. – Um animal formidável, se quer saber. Meu aluno favorito, a propósito – ele deu uma piscadela. – Mas acho que você poderia me surpreender ainda mais. Lilith, no fundo, é uma romântica. Ela gosta da ideia de vocês dois serem demônios e continuarem juntos, sabe? Chega a ser fofo. Mas sabe a coisinha crescendo no seu ventre?

Eu estremeci, sentindo um frio na espinha.

– Essa coisinha não tem lugar nesses planos. Seria um empecilho mal vindo, desagradável – ele fez uma careta. – Mas não se preocupe com seu bebê agora, eu não farei mal à pequena Charlie. Lilith nunca comeu o bebê de um Santo e ela está com água na boca para provar o seu. Sabe, talvez ela até deixe você ter a criança no tempo certo, só pra ter mais carne pra saborear – abriu um largo sorriso. – Deve ser uma iguaria apetitosa, mas confesso que nunca entendi o apelo de tal prato... Até agora – ele percorreu a ponta da faca sobre o meu ventre, me provocando.

Eu não sabia o que fazer. Estava presa da cabeça aos pés e refém de um demônio que definitivamente devia ter me escondido em algum lugar onde anjos não pudessem entrar. Eu não tinha para onde correr.

Como pude ser tão estúpida?!

– Tudo isso pode parar, minha cara. Basta você romper o selo – ele se aproximou, removendo a tira de couro que cobria a minha boca. – O que me diz? Romper o selo e virar a casaca, ficar do lado do Inferno sem precisar temer os anjos, já que em breve o nosso senhor estará entre nós. Você só precisa derramar o sangue de um inocente qualquer – deu de ombros. E se voltou para a porta. – Tragam!

A porta se abriu novamente, no que pude levantar a cabeça para ver um demônio entrar, trazendo consigo a última pessoa que eu esperava ver ali. Havia sofrido pesadas agressões, seu rosto já delicado estava cheio de hematomas e coberto de sangue. Um de seus olhos estava inchado e roxo.

– Padre Kellan! – o chamei.

– Irmã Isabella? – ele indagou. Talvez sua visão estivesse tão ruim que nem ao menos conseguia me reconhecer. – Você está bem, minha filha?

– Sem papo furado – Alastair nos interrompeu. – Como eu ia dizendo, você precisa romper o selo, mocinha. Mate o padre e nada acontecerá à sua família. O que me diz?

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