CAPÍTULO DEZESSETE - CHRISTOPHER

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O olhar de Dulce me queimava de longe. Ela se encontrava no sofá, segurando-se para não surtar a cada coisa que eu, sem pena, jogava num saco que iria para o lixo. Ela não queria falar comigo desde que a ameacei e não a julgava por isso, mas eu tinha dado a minha palavra. Eu preferiria mil vezes que ela passasse a vida me odiando, a saber que eu, depois de grande, deixaria ela se afundar cada vez mais nas drogas.

— Eu já volto. — comentei antes de me retirar.

Dulce permaneceu em silêncio e eu segui na direção da saída, trazendo comigo toda aquela porcaria que eu havia encontrado. Eu tinha intenções de jogar fora, mas pensei por um instante que manter na lixeira, poderia ser um erro, afinal, não queria correr o risco de ela tentar resgatar aquilo ou que qualquer outra pessoa tivesse essa chance, então fui deixar no meu carro, com intenções de incinerar aquilo quando tivesse a chance.

Quando voltei para dentro, ela já não estava mais lá, e eu, por instinto, me pus a procurar, silenciosamente, por ela. Primeiro procurei nos cômodos debaixo, e só quando conclui, resolvi checar os de cima. Eu queria poder confiar nela, mas não era bem assim a realidade. Sentia que por um deslize, ela esconderia algo que eu ainda não tinha encontrado para poder usar quando eu estivesse ausente. Topei com ela quando cheguei no corredor do segundo andar, ela estava saindo de seu quarto, agora vestida com uma roupa de luta completamente preta.

— Onde pensa que vai? — Perguntei imediatamente.

— Desde quando eu te devo satisfações?

— Você não vai voltar naquele lugar.

— E quem vai me impedir? Você? — Dulce cruzou seus braços e de sua garganta saiu uma risada sarcástica. — Você não aprendeu nada com o tempo, não é? Acha que tenho medo de suas ameaças? Acha mesmo que se você me internar, você sai vivo pra contar história?

— Está me ameaçando?

— Estou citando os fatos. As pessoas que você está tentando impedir que eu tenha contato, são as mesmas que não pensariam duas vezes em ir atrás de você. E eu nem preciso pedir.

— Mas é para o seu bem.

— Tente fazê-los mudarem de opinião quando eles estiverem com um revólver apontado na sua nuca.

Dulce descruzou os braços, juntou o cabelo em um rabo de cavalo e o prendeu. Aquilo me fez sentir náuseas. Como ela podia ser assim tão fria?

— O quarto para a bastarda da sua irmã é o do final do corredor, se é que ela ainda vem.

— Sobre isso, acho que não é uma boa ideia.

— Por quê? Logo agora que eu ia começar a me divertir? Não vejo a hora de me apresentar a ela, enfim, fique a vontade, mas não tanto.

Então ela saiu. Fiquei parado ali no corredor por alguns minutos sem conseguir reagir. Havia uma Dulce ali e não era a mesma que eu conhecia. Ela era fria, calculista e não tinha o menor medo de ameaças. Por um instante um estalo me veio à mente, eu não estava ali me livrando daquelas coisas somente porque eu queria, senão porque ela queria que eu fizesse isso. Dulce deixou claro, em poucas palavras, que eu não conseguiria fazer nada que ela realmente não quisesse.

Dulce não saiu de casa como pensei que faria, senão passou o restante do dia trancada no porão onde suas coisas de luta estavam. Eu queria ouvi0la, entretanto, o som que ela colocou era tão alto que fazia os vidros das janelas da casa inteira tremerem e eu fiquei pensando que a qualquer momento os vizinhos chamariam a polícia.

Apesar de me incomodar com o volume, eu deixei que ela fizesse o que queria, por que, apesar dos pesares, não queria que ela me odiasse. Eu já tinha invadido sua privacidade exageradamente, e eu sabia também, não tão no fundo, que eu tinha culpa de ela quase ter morrido de overdose, mesmo assim, eu não queria simplesmente deixá-la ali e desaparecer de sua vida.

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