CAPÍTULO SESSENTA E DOIS - CHRISTOPHER

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Sentei-me na beirada da maca e peguei a mão de Dulce que me olhava desconfiada. Eu tinha acabado de sair de uma longa conversa com diversos especialistas, e eles chegaram à conclusão final.

— Por que está me olhando assim? — Perguntou ela um pouco inquieta.

— Você se lembra que eu falei que você levou um tiro.

— Tem como esquecer?

— Eu acabei de conversar com seus médicos.

— E o que descobriram?

— O tiro que te deram não afetou diretamente a região do seu cérebro, mas quando a bala entrou, fez uma pressão que acabou pressionando seu cérebro e isso danificou um pouco seu córtex pré-frontal, que é a parte responsável pela memória.

— O que isso quer dizer?

— Esse é o local onde ficam armazenadas as memórias.

— Tá, mas tem como arrumar?

Eu neguei. — Infelizmente não. Não é algo que possa reverter e há uma probabilidade eu você não consiga mais se lembrar de coisas a longo tempo.

— Oi?

Aquilo era cruel demais, principalmente para ela que já tinha sofrido tanto. Dulce soltou minha mão e desviou o olhar.

— Eu sinto muito.

— Quem fez isso comigo?

— Quem fez não importa mais, tá bom? Essa pessoa já pagou por isso.

— Eu quero nomes, quero motivos... não... não é justo. Sabe o que é você se olhar no espelho e não saber quem você é?

Sua voz falhou, Dulce enxugou o canto dos olhos. Eu daria qualquer coisa para reverter aquilo, mas não tinha nada que eu pudesse fazer.

— Eu sinto muito.

— Eu vou me esquecer desse momento também?

— A gente só vai ter certeza disso no futuro. Não há como ter certeza, mas há uma probabilidade que sim.

Dulce escondeu o rosto sobre as mãos e se deixou chorar. Vê-la daquela forma me deu tanto ódio. Alexia conseguiu destruí-la, tudo por um ódio que nem deveria existir.

— Eu... eu quero saber o que houve.

— Dul...

— Eu vou me esquecer de qualquer forma, então me fala o que aconteceu, por favor. Me fala quem eu sou, por que fizeram isso comigo, eu tenho esse direito. Eu já entendi que minha história não é a mais feliz, mesmo assim eu preciso saber o que me fez chegar nessa situação.

Eu hesitei, mas o desespero em seus olhos me venceu. Não seria uma história fácil de se ouvir, eu não sabia como ela iria reagir a tanto caos, mas uma vez que eu começasse, eu não poderia mentir nem omitir nenhum detalhe, nem mesmo o fato de que eu poderia ter evitado muita coisa se eu simplesmente tivesse aberto meus olhos.

Fiz com que ela se acomodasse, então eu comecei a falar o eu tinha acontecido. Foi como se eu tivesse voltado no verão de 1992, quando me deparei com Fernando dentro da minha casa depois de eu ter reclamado de comer ovos repetidamente no café da manhã. Eu queria que comer ovos fosse o meu maior problema hoje em dia, nenhum de nós teríamos passado por isso.

Dulce me ouvia atentamente, ela não questionava, não me interrompia, simplesmente me escutava falar de sua história. Uma história marcada por dor, separação, perda, drogas e violência. A medida que eu contava, eu via a decepção aumentar em seu olhar, não tinha nada que pudesse fazer ela querer voltar a ser quem era.

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