CAPÍTULO QUARENTA E UM 🍁

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1812 (nove anos antes), em uma manhã qualquer...

Martha estava retornando para casa após uma saída para fazer compras. Em sua antiga cidade, morando com seus pais, a rigidez era tanta que ela chegava a sentir falta de coisas que poderia simplesmente ter. Roupas, comida, acessórios, amigos... Era quase uma prisão. Mas aquele era o seu lar, ou seja, suas regras. Por isso mantinha a despesa sempre cheia e o guarda-roupa repleto de opções. Investia seu dinheiro sem pena quando via que era necessário em coisas que fossem lhe gerar conforto.

Fechou o guarda-chuva na entrada, o dia estava muito ensolarado para caminhar com a pele tão exposta, uma proteção como aquela era bastante adequada. Não precisou de mais do que três passos porta adentro para sentir o forte cheiro de fumaça, espalhando-se pela casa de forma inconcebível. Ela arregalou os olhos, soltando o guarda-chuva sobre o chão e indo em direção ao lugar onde achou que encontraria a fonte de todo aquele fumaceiro.

— Carter! – Exclamou, tossindo.

O mordomo apareceu em um instante, a expressão preocupada revelando também uma enorme tristeza. O coração dela disparou. Queria saber o que estava acontecendo, mas, acima de tudo, sua mente focou em algo mais importante.

— Onde está a Margot?

Ele comprimiu os lábios, indicando a sala de estar com a cabeça, silenciosamente. O gesto a deixou extremamente confusa e intrigada. Sem dizer mais nada, ela abriu a porta do cômodo com pressa.

A garotinha estava ali, ajoelhada na frente da lareira e de costas para ela. Deu um grito penoso, quase como um pedido de misericórdia. Martha pensou que a jovem havia se machucado ou até mesmo debilitado alguma parte de seu corpo no fogo, mas quando moveu o pé para correr em sua direção, percebeu que Margot não estava ferida. Ao menos não por fora. A menina agarrou um vestido cor-de-rosa de babado e o lançou nas chamas, chorando muito.

— O que pensa que está fazendo? – Gritou Martha, exaltada.

A mais nova finalmente pareceu dar atenção a outra coisa que não fosse o vestido e as chamas.

— Saia daqui – Ordenou ela em um tom perigosamente baixo.

— Margot...

— Saia daqui, por favor – Os olhinhos verdes já vermelhos de tanto chorar a encararam, suplicantes.

— Pare com isso, Margot.

A menina ignorou o pedido e jogou outro vestido na lareira. Martha tossiu, a fumaça não estava lhe fazendo nada bem.

— Se você não parar agora, eu vou...

— Vai o que? – Ela virou a cabeça na direção da tia, os lábios repuxados para baixo – Você não é minha mãe.

Aquela frase fez com que um nó se formasse na garganta de Martha. Era incrível como palavras podiam machucar muito mais que um golpe físico. Ela engoliu em seco.

— Não seja tola, eu sou a responsável por você, e ordeno que pare com isso agora.

— Não – Sussurrou Margot – Ninguém parou quando eu precisei.

A mulher finalmente moveu-se e foi para mais perto da garotinha, batalhando bravamente contra a fumaça que afetava mais seus pulmões a cada segundo.

— O que aconteceu?

— Estou me livrando dessas roupas inúteis – Cuspiu Margot, o olhar perdido e intenso encarando o fogo – Eu não quero mais usá-las. Se o objetivo é cobrir meu corpo, por que não me protegem também das decepções? As pessoas me acham feia, todos. Elas sempre ressaltam o fato de eu estar acima do peso, achando que isso não vai me machucar, mas machuca! Eu estou cansada de ser tão machucada, não suporto ser motivo de chacota, eu só tenho dez anos...

Um raro amor no Outono - Quatro Estações Em Skweny, LIVRO 2Onde histórias criam vida. Descubra agora