Capitulo 16

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⚠️ Atenção: este capítulo pode conter possíveis gatilhos mentais. Aos leitores mais sensíveis recomenda-se cautela.

A fêmea não podia deixar de notar o padrão se repetindo. Era a segunda vez que quase beijava um macho. Cinco meses separavam as duas ocasiões, mas dessa vez, quem saíra fugindo fora ela. Ah, as ironias do destino!

Elain encarava as próprias mãos trêmulas, tentando se concentrar em um fôlego de cada vez. Sua mente estava um caos. Pensamentos desconexos iam e vinham, cada um sendo substituído pelo outro sem que houvesse tempo de sequer entendê-lo. O assunto que sempre tentava evitar estava perigosamente perto. Precisava fazer algo a respeito, não poderia deixá-lo vir à tona. Não ali, não agora.

Olhando ao redor do solário, Elain avistou uma roseira - plantada por ela própria tantos anos antes em menção ao apelido dado à ela por Graysen. Mecanicamente, levantou-se da espreguiçadeira em que havia sentado nos últimos minutos e caminhou até lá. Segurou a haste de uma das rosas vermelhas com a mão inteira, sentindo os espinhos cravando em sua pele. A dor era conhecida e bem-vinda. Com não mais que um puxão, arrancou a flor, descartando-a ao seu lado e passando para a próxima. Podia sentir o sangue escorrendo de suas mãos, mas não se importava. O ferimento estaria curado em menos tempo do que levaria para olhá-lo - seu novo corpo feérico sempre se curava, mesmo que ela não quisesse ser curada. Estava concentrada na tarefa; cada uma daquelas rosas representava cada uma das escolhas que lhe foram impostas, cada uma das decisões que tomaram por ela. Mas, acima de tudo, cada uma daquelas rosas representava a possibilidade do que poderia ter sido, do que foi, mesmo que por pouco tempo. Cada uma daquelas rosas representava a esperança que se esvaiu dela - sentimento esse que, às vezes, ela achava estar recuperando, apenas para ser lembrada que não, não havia esperança. Nenhuma. Não para ela. Estaria sempre à mercê das vontades dos outros, sempre sendo guiada pela onda, nunca forte o suficiente para remar contra a maré.

- O que está fazendo? - A voz deveria tê-la assustado, no entanto, Elain estava tão entorpecida que nem mesmo piscou diante da voz da humana.

Vassa aproximou-se lentamente, temerosa.

- Elain? Está tudo bem? - Sentiu a rainha se aproximando mais. - Oh, você está sangrando!

Elain não havia se dado conta de que havia parado e se virado para encarar Vassa. Sentia-se oca novamente. A única coisa constante no momento eram as batidas do coração dele ecoando em seus ouvidos. Queria que aquele som parasse. Queria que tudo parasse. Levou as mãos aos ouvidos para abafar o ruído, mas foi impedida por um par de mãos pequenas e bronzeadas. Vassa a fitava com um semblante preocupado.

- Venha, vamos limpá-la.

Deixando-se guiar pela rainha humana, Elain se viu sentada novamente sobre a espreguiçadeira. Estava entorpecida demais para se importar com qualquer coisa. Vagamente tomava consciência do pano que Vassa pegou em algum lugar ali perto, molhou na fonte de pássaros, e usava para limpar o sangue das mãos e dedos de Elain, tagarelando sem parar sobre alguma coisa enquanto retirava um ou outro espinho que ficara preso a pele. A fêmea teve vontade de mandá-la calar a boca, mas conteve-se. Não seria educado.

- Ainda bem que não chegou a sujar seu vestido. - Quem se importa com o vestido? - Seria uma pena. Mas o que você estava pensando, afinal de contas? - Não importa para você.

- Eu plantei aquelas rosas. - Respondeu, sua voz saindo de algum lugar além dela.

- Ah... - Vassa parou por um instante, olhando para cima. - Entendo... - Elain duvidava que ela entendesse.

Terminando de limpar suas mãos, a rainha-pássaro se levantou graciosamente, o vestido de cetim amarelo ondulando parecendo o Sol ao redor dela. Era uma mulher magnífica, tinha que reconhecer. Não só bonita, magnífica. Vassa possuía uma aura de presença, de poder, que ia além da beleza física. Era uma força vital que Elain sabia que nunca teria.

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