Elain se sentia estúpida. Idiota, infantil. Covarde.
Covarde, covarde, covarde.
Por que não podia simplesmente dizer o que tinha na cabeça ao invés de ficar com preâmbulos, dizendo sempre o mais cordial e o que achava que as pessoas esperavam ouvir? Sim, fora criada para ser exatamente assim, mas sua mãe já não estava viva há muito tempo e ela era uma mulher adulta, deveria ser capaz de expor seus desejos e opiniões.
Covarde. Era isso o que ela era. Deveria ter rejeitado Lucien assim que pôs os olhos nele; não fora isso o que tinha decidido pouco antes? Mas ao invés disso, ficou de conversa fiada, desafiando-o sobre o refresco de Mipha. Sim, era bem verdade que não pôde se conter, Lucien continha algo que a fazia querer ser mais leve, mais como ela mesma - antes de tudo aquilo. Se Elain se permitisse, sabia que passaria facilmente várias horas apenas conversando e olhando para Lucien, admirando a beleza exótica do macho. Por isso jamais se permitiria àquilo. Estava condenada ao sofrimento, condenada a viver eternamente imutável, com a sombra daquele luto permeando seus pensamentos para sempre. Já havia se conformado com isso.
O pequeno discurso de Letshas não ajudou em nada.
Enquanto Lucien se afastava, Elain cortou um pedaço da torta de salmão e ficou observando as costas angulosas se afastarem enquanto comia. Lucien movia-se com graça e confiança. Pegou-se perguntando se talvez, apenas talvez, se não houvesse acontecido tudo o que aconteceu, se não tivesse certeza de que a parceria não tivesse sido dada a ela como uma forma de o Caldeirão a compensar pelo que lhe fora tirado, se talvez ela pudesse se apaixonar por Lucien. Tivera um pequeno vislumbre de sua personalidade e de como ele agia durante aquela noite, a noite em que se beijaram. Talvez, apenas talvez, pudesse encontrar paz nos braços do parceiro. Mas eram apenas conjecturas. Isso não aconteceria.
Elain jamais permitiria que uma parceria imposta substituísse o filho que fora roubado dela. Se não era forte e corajosa o suficiente para rejeitá-lo, era para ignorá-lo, como já havia feito. Não importa o quanto aquele fio de luz que os conectava implorasse para que ela cedesse, Elain estava disposta a ignorá-lo.
• • •「🌸 🔥」• • •
Lucien caminhou sem pressa por entre as ruas de Velaris. Não tinha vontade nenhuma de ir até Feyre e escutar seja lá o sermão que a Grã-Senhora havia preparado. Desejava poder voltar a perambular por aí em paz, mas sabia que isso não seria possível enquanto não resolvesse os assuntos com a Corte Noturna.
Apressou o passo, caminhando sobre os paralelepípedos ao lado do rio Sidra. Quanto antes acabasse com isso, mais cedo poderia voltar para a Corte Diurna, onde, dentre todas as cortes e cidades que visitara nos últimos meses, fora a que lhe trouxe mais paz e conforto. Tinha amigos lá, e sair para se divertir com eles estava sendo uma distração bem vinda. Ainda não fora capaz de ir para a cama com uma fêmea sem pensar em Elain, mas estava chegando perto.
Logo que viu a Casa do Rio se erguendo majestosamente do outro lado do Rio, Lucien atravessou a ponte de pedra que conectava as margens. A luz do Sol brilhou sobre as águas e refletiu no olho de metal de Lucien, fazendo um pequeno facho de luz dourada cintilar em sua visão e borrá-la por um instante. Instante esse em que ele podia jurar ter visto Elain à sua frente, com aquele maldito vestido verde, o corpo meio virado, como se estivesse esperando por ele. Lucien piscou e, tão rápido quanto viera, a visão desapareceu. Meneando a cabeça, Lucien culpou o forte calor - ou talvez tivesse sido aquele refresco feio.
Decidido a esquecer o ocorrido, o macho abriu um pequeno portão de ferro entalhado e entrou no jardim. Caminhando sobre as pequenas pedras redondas que formavam um caminho até a porta da casa, observou com cuidado cada uma das plantas à vista. Lembrava-se de algumas vezes em que havia chegado na casa para um relatório, ou simplesmente para visitas a pedido de Feyre, e Elain estar trabalhando naquele jardim, os cabelos presos para não atrapalhar a visão, um chapéu enorme na cabeça para protegê-la do Sol, e as mãos nuas - sem luvas, nem mesmo aquelas que ele ridiculamente lhe dera de presente.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Corte de Flores Flamejantes
Fanfiction"Havia fogo por toda parte. E em meio a todo aquele fogo... Ele. Elain não conseguia se mover. Não conseguia gritar. Não conseguia avisar Lucien para que corresse, para que se salvasse. Ele morreria, ela sabia disso. Sentia em seus ossos. Sentia...