Capítulo 72

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Os primeiros raios de sol filtravam-se pelas cortinas do quarto de Elain, banhando o ambiente em uma luz dourada e reconfortante. Ainda envolta pelos resquícios dos sonhos, ela se espreguiçou lentamente, deixando que os pensamentos da noite anterior retornassem à sua consciência como uma névoa que se dissipa ao nascer do dia.

O encontro com o Suriel parecia cada vez mais distante e surreal, como se fosse parte de um sonho antigo tecido pela imaginação. No entanto, a sensação de responsabilidade que agora pesava sobre seus ombros era tão tangível quanto a luz do sol que inundava o quarto.

Sentando-se na cama, Elain passou a mão pelos cabelos, tentando organizar seus pensamentos em meio ao turbilhão de emoções. Não sabia se conseguiria - ou mesmo se desejava - ser a pessoa que o Suriel insistiu tão veementemente que era. Jamais fora aventureira, jamais se arriscara para o que era desconhecido ou pouco além de sua zona de conforto. Demorara meses para se acostumar a todas as mudanças que ocorreram em sua vida, em todas as vezes. A única vez em que aceitara plenamente algo que lhe ocorrera fora quando descobrira a gravidez, e no entanto... Sacudiu a cabeça, dispersando os pensamentos sobre o bebê perdido.

Levantou-se sem muito entusiasmo, apesar de praticamente sentir a energia da primavera pulsar em suas veias. Cada passo em direção ao espelho de corpo inteiro ao lado do roupeiro refletia não apenas sua imagem física, mas também a chama da dúvida que brilhava em seus olhos. "Rainha", o Suriel a chamara de Rainha na noite passada. O que aquilo significava? E essa busca que deveria fazer, será que estava pronta para encarar aquilo?

Elain se observou por inteiro, prestando atenção em cada detalhe de sua aparência, talvez pela primeira vez desde que se tornara aquilo. Era estranho como parecia a mesma pessoa, mas ao mesmo tempo parecia tão diferente. Seus olhos ainda tinham o mesmo tom de castanho, seus cabelos as mesmas mechas que pareciam não se decidir de qual cor exata gostariam de ser. Mas ainda assim... Seu corpo estava mais alto, os braços e pernas mais compridos, o tronco mais esguio. Aquela beleza etérea e aura mágica dos feéricos trazendo algo a mais para a beleza natural que ela um dia possuíra. Ainda era seu corpo sim, mas... Ela levantou a mão direita, sentindo um pouco de falta do peso da aliança de ferro que tirou apenas após o casamento de Graysen, e pôs uma mecha de cabelo atrás da orelha pontuda. Aquelas orelhas, a forma alongada e pontuda, eram a prova irrefutável de que ela não era mais a Elain de sempre, ainda que fosse. Não era mais humana. Mas não conseguia - não, ela recusava - a pensar em si mesma como feérica.

Enquanto se contemplava no espelho, Elain sentia um turbilhão de emoções se agitando dentro dela. Era como se estivesse presa entre dois mundos, dividida entre quem era e quem estava destinada a ser. Os traços feéricos que agora adornavam seu corpo eram como marcas indeléveis de uma transformação que ela mal compreendia.

A sensação de poder pulsando dentro de si era assustadora e ao mesmo tempo sedutora. Elain sabia que possuía habilidades que ia além do entendimento humano, mas ainda não havia aprendido a dominá-las completamente. A visão do futuro, em especial, era algo que a deixava inquieta. Ver além do véu do tempo trazia consigo uma responsabilidade avassaladora, e ela se perguntava se estava preparada para lidar com as consequências de suas visões.

A presença de Lucien em sua vida só complicava ainda mais as coisas. Elain não podia negar a atração que sentia por ele, uma conexão que ia além das palavras e dos gestos. No entanto, havia também a sombra do passado entre eles, lembranças dolorosas que ela preferiria esquecer, mas que insistiam em ressurgir sempre que estavam juntos.

Ela suspirou, desviando o olhar do espelho e caminhando pelo quarto com passos hesitantes. O futuro parecia tão incerto, e ela se perguntava se algum dia encontraria paz dentro de si mesma. Talvez fosse esse o verdadeiro desafio que o Suriel havia lhe lançado: não apenas encontrar o seu lugar no mundo feérico, mas também encontrar a sua verdadeira essência, aquilo que a tornava única.

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