Capítulo 59

873 98 28
                                    

Tão logo Lucien afastou o rosto do beijo casto que havia lhe dado, Duncan já estava a postos para apoiar o macho ferido e ajudá-lo a voltar para os Jardins Primaveris. Elain não era capaz de tirar os olhos daquela flecha de freixo cravada no abdômen do ruivo, e acabou ficando para trás, sem perceber que estava estática no meio da pilha fumegante de corpos humanos.

- Quantas desgraças mais a sua família trará a essas terras? - Uma voz soou ríspida.

Piscando algumas vezes, Elain voltou os olhos para Naim, cuja expressão era tão ríspida quanto sua voz soava.

- Perdão? - Ela conseguiu responder. Não entendia onde o macho queria chegar com aquilo.

Naim rosnou para ela, os dentes à mostra e as garras prontas.

- Não bastou tudo o que sua irmã fez ao meu Grão-Senhor, agora querem trazer o caos e a morte?

O choque de tal afirmação deve ter transparecido no rosto de Elain, pois Naim soltou uma risada áspera e sem qualquer traço de humor.

- Essa sua cara de sonsa não me engana, Senhorita Archeron. - O tom desagradável com que aquele ser desprezível disse seu nome fez Elain se retrair. - Não confio em você.

- Eu também não confio em você! - Ela respondeu tardiamente, pois Naim já estava a meio caminho de Duncan e Lucien.

Elain abraçou o próprio corpo e lançou um olhar para os corpos carbonizados. Eles vieram a mando de Graysen para buscá-la, não importando as consequências disso. Será que ele sabia que estava condenando seus homens à morte ao enviá-los para terras feéricas? Como ele foi capaz disso? O Graysen que ela conheceu jamais mandaria homens à morte certa dessa forma. Mas uma voz lá no fundo da sua mente lhe gritou, dizendo-lhe que talvez ela não o conhecesse tão bem quanto imaginava ou, o que talvez seria ainda pior, ele a enganara desde o princípio.

Bem, qualquer que fosse o caso, Elain se sentia grata por não estar mais presa àquele homem. Ela queria uma pessoa boa como companheiro; alguém que lhe entendesse, respeitasse e amasse. Alguém em quem ela pudesse confiar a própria vida. Alguém como... Soltou um suspiro. Alguém como Lucien, constatou.

Assim que ergueu o rosto, assustou-se com uma visão horrenda que a encarava em meio às árvores. Um ser alto, tão magro que sua pele estava colada aos ossos; não possuía lábios, as imensas presas estavam à mostra. Muito menos possuía olhos, mas aqueles dois buracos negros pareceram enchergar através de sua alma antes de o monstro virar as costas para ela, o manto negro desgastado e puído farfalhando ao redor do corpo esquelético. Um arrepio lhe percorreu a espinha com o presságio de morte, e a fêmea se apressou em voltar aos Jardins.

Elain teve que desviar da pequena multidão que agora cercava a tenda onde, poucos momentos antes, ela estivera com Lucien. Não foi difícil descobrir o porquê. Duncan deitara o macho ruivo sobre uma mesa de madeira precária que, aos olhos dela, cederia a qualquer minuto com o peso do parceiro. Lucien debatia algo com Duncan, enquanto Naim e Cedric conversavam entre si. Incapaz de se manter afastada, Elain caminhou em direção a ponta da mesa onde estava acomodada a cabeça de Lucien. O silêncio caiu entre os comandantes quando a viram se aproximar, mas um sorriso gentil surgiu no rosto do único macho que importava para ela.

- Você está bem? - Ele questionou, fazendo uma careta com o esforço.

- Graças a você. - Foi a resposta da bela fêmea.

Elain correu os olhos pelo corpo de Lucien, a camisa de linho branco manchada de sangue, um pouco dele, um pouco dos homens que ele havia matado. Uma flecha de freixo estava fincada no lado direito de seu abdômen, pouco acima da linha da calça, e outra flecha estava em sua coxa esquerda. Teriam que removê-las logo. Ela não sabia muito bem como aquela madeira simples poderia enfraquecê-los tanto, mas sabia que aquilo poderia matar Lucien.

Corte de Flores FlamejantesOnde histórias criam vida. Descubra agora