Capítulo 20

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Elain permitiu que Lucien atravessasse com ela. Estava tomada por uma série de sentimentos aos quais não estava acostumada: ira, raiva, rancor. Mas acima de tudo mágoa e muita, muita tristeza. Entre os sentimentos desconhecidos, havia um que lhe era corriqueiro: desesperança.

Lembrar de tudo o que se passou foi como abrir as comportas de uma represa de sentimentos. E agora ela não sabia mais como voltar a si.

Estava vagamente ciente da forte luz vermelha permeada por fumaça que os rodeava enquanto atravessavam. Desejava chegar logo em casa. Queria afundar em sua cama e simplesmente esquecer daquela noite. Esquecer de tudo. Esquecer que sequer existia.

Quando sentiu o chão sob seus pés novamente, deu um passo atrás. Não conseguia respirar direito. Seu peito doía. Olhou para Lucien e tudo o que foi capaz de pensar foi que ele era apenas mais uma compensação do Caldeirão; um parceiro, uma ligação rara para atenuar a morte do filho que sequer tivera chance de nascer.

- Elain, eu... - Lucien começou, passando a mão na nuca. Suspirou profundamente. - Sinto muito pelo seu filho.

Ela não respondeu. Não sabia o que responder. Sentia-se frouxa, zonza. A garganta estava apertada e o coração martelava em seu peito.

- Não fazia ideia de tudo aquilo. - Lucien continuou. - Por que não me contou?

- Que diferença faria? - Elain abraçou o próprio corpo e desviou o olhar do macho à sua frente.

Lucien suspirou novamente.

- Sinceramente? Não sei... Eu... Eu só...

Elain olhou ao redor, para a cidade de luz. Apenas agora reparava que Lucien havia os deixado um pouco mais afastados do centro da cidade, próximo de onde estava a lápide de seu pai. Sem pensar no assunto, Elain começou a caminhar naquela direção. Sabia que, não importava o que fosse, seu pai teria uma palavra gentil para ela. Ele sempre tinha uma palavra gentil para ela.

Sentiu Lucien logo atrás, acompanhando-a. Os minutos se passaram silenciosamente, até que a fêmea começou a ficar irritada.

- Pode ir para sua casa. - Disse sem se virar ou diminuir o passo. - Só vou falar com meu pai e já irei também.

- Acho que vou ficar por aqui. - Podia ouvir a preocupação no tom de voz dele.

Ela parou e, virando-se, olhou para cima, tentando sorrir, apesar de achar que não estava sendo muito efetiva. Estava tão vazia que mal tomava conhecimento de suas ações.

- Vá descansar um pouco. Estou bem.

Lucien estendeu a mão para o rosto dela, passando o polegar por sua bochecha e limpando uma lágrima que Elain não sabia que escorria.

- Sei como é perder alguém que se ama, Elain.

- Você não sabe. - Ela negou com a cabeça. - Não é simplesmente como se ele tivesse morrido. Ele foi tirado de mim da forma mais brutal possível, Lucien.

- De novo, sei como é. - Uma sombra nublou aquele olho castanho avermelhado, mas não foi o suficiente para acender a curiosidade de Elain.

Nada poderia trazê-la de volta agora.

- Sabe? - Amargura dançava em seu tom de voz. - Sabe como é ser tirado da sua cama no meio da madrugada, ser acorrentada junto à sua irmã, enquanto um bando de feéricos feios e nojentos ria das suas súplicas? Sabe o que ser atirada em um caldeirão, enfeitiçada, mudada, ver seus planos e sonhos escapando por entre seus dedos? - Negou novamente com a cabeça. - Duvido muito.

- Sou mais familiarizado com isso do que você imagina. - O tom de voz do macho estava tão amargo quanto o dela.

Elain suspirou, cansada. Não debateria com ele, não tinha forças para isso. Virou-se e começou a caminhar novamente.

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