Gabrieli.
— Bom dia. — Matheus cumprimentou, com a voz carregada de rouquidão, talvez reflexo do sono. Eu acenei, de uma forma contida.
Era início da manhã. Como a primeira casa a levantar, me propus a passar o café, também com o intuito de que a bebida me despertasse. Matheus adentrou a cozinha assim que eu me servia, não trajando nada além de um shorts.
— O gato comeu sua língua, foi? — ele murmurou em descontração.
Deixei a garrafa sobre a pia e me sentei em uma das banquetas dispostas de frente ao balcão. Conhecendo o apartamento quase tanto quanto eu, Matheus não precisou perguntar sobre as xícaras para encontrá-las. Ele repetiu o gesto, se servindo de uma xícara generosa de café e apoiou o próprio corpo contra a pia.
— Tá tudo bem, Gabi? — ele insistiu pela terceira vez, talvez preocupado pela minha reação.
— Não. — declarei, por fim. Ele franziu o cenho, como se pedisse que eu falasse sobre e eu encolhi os ombros.
— É sobre o Henrique? — Matheus questionou, tratando o nome de Henrique com malícia.
— Não. Quer dizer, sim. — suspirei. Eu poderia não entrar no assunto com Matheus, mas ele sempre foi um ótimo conselheiro. Logo,não pensei que ele faria questão ou sequer sentisse incômodo. — Sabe, eu fui ver ele ontem à noite...
— Suspeitei quando você saiu daqui parecendo uma adolescente fugindo de casa. — ele riu da própria piada, talvez com intenção de tornar o clima ameno. Eu logo me perdi sobre os meus próprios pensamentos. — Mas o que aconteceu?
— Ah... meio foda falar sobre isso... — cocei a nuca. Matheus franziu o cenho.
— Ele tentou alguma coisa? — Matheus supôs, adquirindo uma postura ereta.
— Sim. Não. Sei lá. — encolhi os ombros, mas tratei de entrar no assunto com cautela logo a seguir: — Eu acho que ele queria, mas... ai caralho, que vergonha.
— O que foi? — Matheus insistiu, não soando precipitado, apenas preocupado.
— Ma... eu sou... — não conclui a frase porque fui consumida pela vergonha. O rubor crescia pelas minhas bochechas de forma tão intensa que eu acredito que tenha sido ali que Matheus tenha deduzido onde eu pretendia chegar.
— Certo. — ele apoiou a xícara sobre a pia e cruzou os braços, talvez determinado a mostrar que estava atento a cada palavra. — E você acha que ele queria alguma coisa?
— Sei lá. A gente começou a se beijar e, a família dele 'tava' lá então nunca teria acontecido mesmo, mas... — suspirei antes de conseguir continuar: — Foi... diferente.
— O beijo?
Foi no momento em que assenti em que percebi como eu estava sendo ridícula. Eu poderia ter abordado o assunto com Priscila ou Natália, mas nenhuma me traria conforto com Matheus. Eu sabia que aquele era um ambiente seguro. Matheus jamais me julgaria - contrário a minhas melhores amigas.
— Você acha que ele tinha a intenção de algo a mais?
— Eu não sei. — confessei. Desviei o olhar por vergonha, sem saber se Matheus internamente me julgava por ser ridícula ou se o sorriso que ele mantinha por fora era genuíno. — Talvez? Não ali, com certeza. A gente 'tava' ali sozinhos, ele começou a... não sei como falar...
— Então ele não te forçou a nada? — pela forma como o olhar de Matheus recaiu sobre mim, acompanhando a pergunta, se tornou ainda mais óbvia sua confusão com o assunto.
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(Im)perfeitos | Ricelly Henrique
RomanceUm romance de conto de fadas não era nada do que Gabrieli esperava. Príncipes estavam para ela tanto quanto sapatos de cristais e carruagens que se transformam em abóboras: meros conceitos de filmes da Disney. Ironicamente, foi exatamente o que ela...