‧₊˚ vinte e cinco.

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Henrique.

Cambaleei pelo corredor, à procura de equilíbrio e precisei sustentar minha mão contra parede para evitar tombar para a frente. O sono ainda predominante, fazendo com que meu raciocínio não estivesse excepcional naquela manhã. Eu mal era capaz de formular pensamentos ou manter os olhos abertos.

Mesmo com a breve distância, era possível ouvir um som baixo de fundo, assim como uma breve movimentação na cozinha. Eu não sabia dizer com propriedade o que poderia estar acontecendo, mas arriscava dizer que talvez Gabrieli estivesse preparando o café, embora o cheiro ainda não tivesse me atingido.

Ao acordar naquela cama vazia, eu tive uma breve percepção do que ela deveria estar fazendo de pé tão cedo; já faziam semanas desde que Gabrieli estava histérica, se dividindo para dar conta de todas as tarefas cotidianas. Eu disse a ela, mais de uma vez, que ela deveria desacelerar antes que ela ficasse sobrecarregada, mas ela não me deu ouvidos. E, à distância, não havia muito o que eu pudesse fazer.

Tomado pela curiosidade, com aquela observação recente, segui o curto trajeto mantendo um olho aberto e o outro fechado, na tentativa de conseguir assimilar toda a luminosidade do ambiente. Encontrei Gabrieli junto à pia, de costas para a minha direção. Ela trajava o mesmo pijama da noite anterior, excepcionalmente curto, o que me levou a piscar algumas vezes para enfim ser capaz de assimilar o comprimento — de forma a deixar a bunda dela parcialmente descoberta. É claro que ela não perderia a oportunidade de me atiçar, especialmente após daquela noite.

— Bom dia! — cumprimentei, estranhando meu próprio entusiasmo, mas Gabrieli não demonstrou reação imediata.

Não demorei até perceber que o notebook ligado sobre a bancada. Estendi o olhar, encontrando o word aberto sobre a tela a algumas centenas de palavras compondo o documento. Ao tocar a bancada, ela finalmente pareceu despertar a atenção.

Ah! — a ouvi exclamar, como se a minha aparição fosse, de alguma forma, uma surpresa. — Eu não te vi aí, amor.

Com a caneca em mãos, o que eu deduzi se tratar de água fervendo para o café, Gabrieli se debruçou sobre o balcão e então apertou algumas teclas, antes de se virar para terminar de passar o café.

Eu quis perguntar, mas a falta de atenção de Gabrieli era nítida e eu deduzi que ela não me ouviria. Caminhei, então, até adentrar o espaço entre as bancadas da cozinha e estendi os olhos até a tela do computador. Aquilo, de fato, parecia ser uma dissertação extensa para a faculdade.

— Cê não tá mexendo no seu TCC enquanto prepara o café, né? — resmunguei, desejando que eu estivesse errado. Muito errado.

Ainda que suas reclamações fossem frequentes e não exatamente uma surpresa, eu ainda não esperava que ela estivesse achando adequado deixar de aproveitar uma refeição para redigir um trabalho em um domingo de manhã. Ela possivelmente sabia o que eu pensava, mas faria questão de tentar se esquivar do assunto.

— Eu sei que parece loucura, mas eu preciso enviar esse arquivo até quarta, e pra enviar, eu preciso revisar alguns pontos no texto que a minha orientadora disse que poderiam estar confusos — Gabrieli começou a se lamentar. — Só que essa semana tá foda, você sabe disso, e para conseguir enviar até quarta, eu preciso estar com ele pronto até amanhã pra poder passar mais um pente fino até lá e não acabar mandando qualquer coisa, porque eu sei o que eu preciso melhorar e eu sei que eu posso fazer mais do que isso — ela dizia com tanta pressa que retribuiu o olhar ao perceber que eu estranhava. — Mas eu tenho tudo sob controle. Não precisa me olhar como se eu fosse uma maluca.

— Gabrieli...

Ela não me respondeu em um primeiro momento. A assisti despejar o conteúdo da caneca sobre o coador e então descartar a caneca na pia. Quando achei que ela talvez pudesse ceder a atenção, ela passou a mexer o conteúdo do coador com uma colher e eu senti necessidade de repetir:

(Im)perfeitos | Ricelly HenriqueOnde histórias criam vida. Descubra agora