‧₊˚ seis.

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 Gabrieli.

Enquanto a conversa discorria na mesa, eu assentia e me esforçava para não transformar aquilo em algo sobre mim, embora meus pensamentos naquele instante fossem um aglomerado de informações desnecessárias e paranóias constantes que faziam eu me sentir à beira de um colapso.

Outra vez, Priscila estava deixando o país para um curso, daquela vez um intercâmbio para a África do Sul. Ela passaria três meses no país, conhecendo a cultura e a língua, antes de voltar ao Brasil. Eu sabia que aquela era uma ideia que aterrorizava Matheus, embora, por fora, ele estivesse se esforçando ao máximo para bancar o desconstruído e apoiar a namorada, afinal, o apoio dele era essencial para que ela se sentisse impulsionada a ir atrás dos próprios sozinhos.

Era por aquele motivo que nós estávamos em uma pizzaria, em uma noite abafada de quinta-feira — eu, Priscila, Matheus, Mohana e Natália — fazendo esforço para que a melancolia não tomasse espaço na conversa, porque nós sabíamos que Matheus estava há um passo de começar a chorar a qualquer momento, como o cara sensível que ele sempre costumava ser.

No entanto, eu só estava presente fisicamente, porque a minha cabeça ainda estava longe dali.

Já faziam três semanas desde que eu havia sido diagnosticada com gastrite, embora eu tenha acreditado veementemente se tratar de uma gravidez, e quase dois meses desde que Henrique havia se mudado para Goiânia. E se até três semanas antes eu achava que as coisas entre nós estavam estranhas é porque eu não fazia ideia de onde nós chegaríamos nas semanas seguintes.

As ligações estavam se tornando cada vez mais curtas ou espaçadas e nem era por culpa minha; a cada vez que a conversa se estendia por mais de cinco minutos, Henrique alegava ter algo para fazer, antes de terminar a ligação de forma abrupta. Ele, por vontade própria, raramente se atrevia a me ligar. Quando acontecia, eu podia sentir aquela tensão palpável do outro lado da linha, como se o objetivo daquela chamada fosse servir como consolo ou ser uma válvula de escape para ele. De alguma forma, eu sabia que Henrique estava apenas me usando, porque aquelas ligações nunca tendiam a acontecer por vontade própria.

Tudo estava me indicando que tinha algo de errado, mas eu custava a acreditar, porque eu queria que ele fosse melhor do que aquilo.

Naquele dia em questão, Henrique havia evitado todas as minhas ligações. Quando mandei mensagem, ele mencionou estar no estúdio e me disse que mais tarde ligaria de volta, assim que estivesse em casa. Aquela primeira mensagem havia sido enviada às onze da manhã. Já passava das nove da noite e ele sequer havia tentado me ligar.

Gabi — Mohana chamou por mim, baixinho. Eu apenas estendi o olhar quando ela tocou minha perna — perna a qual eu movia de forma inconsciente, reflexo do meu nervosismo.

Matheus, Priscila e Natália seguiram entretidos pelo teor da conversa, mas era nítido que Mohana não pretendia chamar a atenção deles, então me voltei a ela, após repousar os talheres no prato. Eu não deveria sequer estar comendo pizza, então era melhor que eu mantivesse o controle e parasse antes de correr o risco de atacar a gastrite novamente, ou eu acabaria passando a noite no hospital.

— O que foi? — indaguei, curiosa.

Calma — ela pediu, ainda baixinho. Eu estranhei sua reação de devo ter deixado explícito, porque Mohana logo se encarregou de me dizer: — Você 'tá' balançando essa perna desde a hora em que a gente sentou, não precisa ficar nervosa assim.

Ri fraco. Ela com certeza não tinha com o que se preocupar, embora fizesse, enquanto eu tentava desesperadamente manter a compostura, ainda que tudo me indicasse que havia algo de errado. Era um pouco irônico que estivéssemos em posições tão distintas, quando Mohana acreditava no contrário.

(Im)perfeitos | Ricelly HenriqueOnde histórias criam vida. Descubra agora