‧₊˚ nove.

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Gabrieli.

Eu estava sentada a mesa quando ouvi a porta se bater pela primeira vez. Ergui os olhos, acompanhei o som de passos e, ao perceber que Henrique não desceria, tornei a me atentar aos itens a minha frente.

Entre as pendências que eu precisava entregar ao final daquela semana, havia uma dúzia de atividades para corrigir. O tempo contado havia me feito pedir para que Henrique trouxesse algo para o jantar, na volta para casa. Eu levava a caneta ao papel, me atentando a resposta, quando escutei Henrique chamar por mim:

Amor! — ergui o olhar, embora não pudesse vê-lo. Mesmo sem esperar por uma resposta, ele me indagou: — Onde tá aquela camiseta branca que eu coloquei pra lavar ontem?

Ri comigo mesma, me lembrando das incontáveis vezes que meu pai havia feito o mesmo com a minha mãe, sob o meu olhar. Minha mãe me disse, pouco após a minha mudança, que as coisas seriam daquele jeito — que Henrique certamente me veria como responsável por qualquer grampo de cabelo que sumisse em casa — mas eu desacreditei. Um ano depois, eu poderia dizer que ela estava certa.

— Tá pra lavar, uai. Eu não lavei roupa ontem — murmurei, me excedendo no tom para que Henrique pudesse me ouvir. Por um breve instante, não houve resposta.

Merda! — ouvi ele resmungar baixinho. Certamente não o tipo de palavreado dirigido a mim, mas uma lamentação própria.

Ouvi os passos se distanciarem da escada, e me atentei a ele. Eu poderia continuar com minha atenção focada na correção das provas, ou poderia ir descobrir o porquê Henrique soava tão agitado e inquieto. E, entre as opções, eu escolheria qualquer coisa que dissipasse minha concentração — de certa forma, eu queria uma desculpa para justificar a minha procrastinação.

Levei dois minutos para chegar até o quarto. Com os braços cruzados, parada à porta, observei o movimento. Henrique se desfazia de algumas peças no guarda-roupa, mexendo sobre as gavetas. Apoiei meu corpo contra o batente da porta e continuei medindo suas reações. De costas para mim, Henrique praguejava baixo conforme remexia nas peças. Após alguns instantes, abandonei a postura para questioná-lo:

— Por que é que você tá tão tenso assim?

— Eu não tô tenso — Henrique se empenhou em se justificar, erguendo as costas, embora não tenha me procurado com o olhar. — Eu só tô um pouco atrasado, e eu não tô com muita moral com o Wander pra poder me atrasar.

— Você sabe que tem outras camisetas brancas no guarda-roupa, certo?

Meu questionamento pareceu ser recebido com surpresa. Henrique me observou por cima do ombro, com um semblante perplexo, talvez se questionando se estava agindo à toa por tanto tempo. Foi inevitável rir.

— Eu pego pra você.

Henrique se afastou do guarda-roupa quando me aproximei. Fechei a gaveta em questão e passei as peças sobre a arara, à procura do tecido branco. Ao encontrar, retirei a peça do cabide e entreguei sobre as mãos de Henrique, que ainda seguia surpreso, mas tentou desmanchar a postura.

— Eu sabia que tinha outra, só pra constar.

É claro — concordei, semicerrando os olhos.

Henrique riu em conjunto comigo. Então, se desfez da camiseta para vestir a peça limpa.

Ele havia chegado da agenda de shows apenas pelo final da tarde, o que nos levou a nos encontramos em casa. Henrique mal teve tempo de me cumprimentar propriamente antes de subir com o pretexto trocar de roupa, porque Wander pediu que ele estivesse no escritório às sete — e já passavam das seis e meia.

(Im)perfeitos | Ricelly HenriqueOnde histórias criam vida. Descubra agora