‧₊˚ vinte e três.

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Gabrieli.

— Eu não deveria estar aqui.

Aquela observação surgiu do constante movimento de pessoas à nossa frente. Pessoas ao telefone, pessoas carregando malas, pessoas se reencontrando em abraços apertados. O aeroporto sempre trouxe aquele sentimento intenso de desconforto e incômodo, mas, naquela manhã em particular, tudo parecia mais acentuado.

Paradas no terminal, com uma constante saída de pessoas, eu podia sentir o suor se acumular sobre as minhas mãos, mas, ainda que estivesse nervosa, não me dispus a olhar para Natália após minha confissão.

— Gabrieli, sem drama!

A advertência de Natália me fez mudar a postura. Eu sorri, mas não era um sorriso verdadeiro, tampouco soava como um.

Depois de três meses fora, Priscila estava finalmente voltando ao Brasil. Seus pais não poderiam ir a Palmas para recebê-la, então eu e Natália nos colocamos à disposição, muito embora eu tenha questionando Natália repetidas vezes se deveria fazer isso.

Encontrar Priscila significava mencionar o acontecido com o seu ex-namorado. Não era o tipo de coisa que eu poderia escolher não compartilhar, ainda que eu quisesse. Eu tinha medo da reação dela, de que ela decidisse passar por cima da nossa amizade por conta dele. Mas, Natália conseguiu me convencer me lembrando que, ainda que eu não quisesse encontrar com ela, nós ainda iríamos nos esbarrar. Em casa. Porque nós ainda compartilhávamos o apartamento.

— Se ela souber...

— Gabi, a gente vai que entrar no assunto? — pela maneira como Natália choramingou, ela não tinha a intenção de falar, mas se forçou, após alguns instantes: — Palmas não é uma cidade muito grande, cê vai deixar ela descobrir isso por ele, por acaso?

Eu havia chegado de Goiânia apenas na manhã anterior. Desde o ocorrido, as coisas com Henrique iam bem, dentro do possível. Era óbvio que havia uma certa estranheza após a confissão, mas nós estávamos nos empenhando para dar o nosso melhor, ainda que eu não soubesse com exatidão o que aquilo significava.

Eu ainda não havia comentando a notícia com ninguém. Cheguei a conversar com o meu cunhado algumas vezes, em noites em que eu não conseguia dormir e acabava esbarrando com Junim. Ele tentou me assegurar, ainda que de maneira não tão evidente, que ele acreditava no empenho do irmão, mas, ainda que eu quisesse acreditar em Junim, parte dele sempre teria uma opinião tendenciosa.

Natália foi quem me recepcionou na rodoviária naquela manhã de sexta-feira. Ela perguntou sobre todos os detalhes possíveis da viagem, mas eu não demonstrei muita animação. Em partes, me senti mal pela minha postura, mas eu queria estar bem antes de me ousar trazer o assunto.

— E se ela não acreditar em mim? — levantei a suposição.

— Você acha que a sua melhor amiga ia desacreditar de você pra acreditar no cara que foi um escroto com ela?

— Coisas como essa acontecem, Nat. O Matheus podia ser insensível pra caralho, mas a Pri não é. Ela ainda tem sentimentos por ele.

Natália não pareceu se convencer. Eu me contentei, por um momento, em me manter o silêncio, observando o terminal parcialmente vazio. A loucura daquele vai-e-vem intenso havia cessado abruptamente, embora ainda houvesse uma ou outra pessoa paradas nas proximidades — ou entretidas à espera de alguém, ou fixamente presas ao próprio celular.

— Se ela tivesse, não teria terminado — foi o que Natália se atreveu a dizer. E, embora eu tivesse o sentimento de que eu não deveria insistir no assunto, eu fiz mesmo assim:

(Im)perfeitos | Ricelly HenriqueOnde histórias criam vida. Descubra agora