‧₊˚ vinte.

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Gabrieli.

— Você tem certeza de que vai ficar bem?

Ouvir aquele questionamento de Maria me proporcionou sensações adversas. Não, eu não tinha certeza; aquela era a resposta concreta que ela certamente esperava ouvir, mas eu nunca diria a ela, porque, sim, eu precisava estar sozinha naquele momento.

Minha sogra já tinha feito mais por mim do que eu poderia pedir a qualquer pessoa. Ela estava em Goiânia há mais de três semanas, ocupando seu tempo com broncas em todas as vezes em que eu me atrevia a fazer alguma atividade doméstica, preparando comida caseira em todas as refeições e, o principal, servindo de companhia nas minhas noites solitárias, com o seu pedido sempre sutil (ou não) de que eu ficasse com ela na sala até o final da novela.

Todo aquele cuidado era o que me impedia de desabar. Eu sabia, de certa maneira, que havia alguém ali, cuidando de mim a todo momento. Mas, tudo precisava ter um fim, assim como a estadia dela em Goiânia.

Edson havia ligado para se queixar de saudades dela praticamente todos os dias ao longo daquela semana. Ele sabia se virar o bastante para que ter a esposa com ele em casa não fosse uma necessidade, mas eu entendi que eu estava privando-a da rotina dela, e, por fim, compreendi que eu não poderia pedir para que ela ficasse mais. Eu arrumaria uma maneira de encontrar meu próprio consolo quando estivesse sozinha — mesmo contra a minha vontade.

— É claro que eu vou. — Aleguei, com o meu melhor sorriso. — O Henrique chega na terça, tia. Até lá, eu vou arrumar um jeito de me manter ocupada.

Como? — Maria se interessou em saber. Levando a mão à cintura, deduzi que sua intenção fosse me intimidar de certa maneira, mas nem com todo o esforço do mundo ela seria capaz — seu sorriso era muito gentil pra isso.

— Bom, eu tenho a Maria pra visitar. — Comecei pontuando o óbvio. — Ainda tem algumas coisinhas dela que eu não ajeitei em casa, porque eu não estava com cabeça pra isso, e eu pretendo dispensar a Bia essa semana, então... eu vou cuidar da casa eu mesma. Vai ser bom pra mim.

— Você não deveria estar fazendo esforço, Gabi. — Ela me advertiu. Eu ri, encarando meus pés.

— Não é esforço nenhum. Eu só vou passar um pano na casa, lavar uma louça. Coisas do dia a dia.

— Peça para o Henrique fazer isso.

— Não, tia. — Discordei, e vi qualquer menção a um sorriso seu se desmanchar. — Eu juro que eu tô bem. As dores passaram, eu tô me sentindo mais disposta. Não vai ser sacrifício nenhum.

— Isso não é desculpa, Gabrieli, você passou por uma cirurgia há pouco tempo.

— Mas não é esforço. — Aleguei uma terceira vez.

Ela se despedia de mim paradas próximas ao portão de embarque. Seu voo ainda não havia sido chamado, mas o horário estava próximo. Maria segurava sua mala com uma das mãos, e eu tentava manter o tom da conversa baixo, porque não queria que outras pessoas se atentassem a nós.

— Eu vou ter que pedir para o meu filho ficar de olho em você, é?

— Ah, tia, você sabe que não precisa pedir nada. Ele vai fazer de qualquer jeito.

Maria encolheu os ombros, cedendo para a ideia. Eu ri e ela me acompanhou, e eu pude me sentir mais acolhida por um momento — ainda que curto.

— Alguém tem que ter um pouco de juízo, filha.

— E me admira muito que você pense que é o seu filho. — Maria tocou meu rosto. Eu sabia que tudo era reflexo do seu cuidado, mas eu queria que ela tivesse a segurança de que eu ficaria bem. Eu não ousaria mentir para ela. — Ele sabe como cuidar de mim.

(Im)perfeitos | Ricelly HenriqueOnde histórias criam vida. Descubra agora