‧₊˚ um.

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Gabrieli.

Palmas, TO.

Agosto de 2010.

O aroma de livros velhos e mofo poderia ser de torcer o nariz para muitas pessoas, mas eu sempre achei reconfortante. Talvez fosse por isso que eu preferia passar meu tempo livre dentro da biblioteca a resolver os exercícios em casa — o conforto e a sensação acolhedora.

Era final da manhã de uma quinta-feira qualquer. Eu repassava algumas questões, me preparando para uma prova que aconteceria na semana seguinte. Sempre tive tendência a ser antecipada e raramente deixava qualquer coisa para a última hora, principalmente se tratando de estudos.

O intenso calor de Palmas, no entanto, era uma distração, fazendo o ambiente soar abafado. Dessa forma, todos os ventiladores da biblioteca ecoavam baixinho, na tentativa de tornar o ambiente um pouco mais arejado.

Enquanto repassava a mesma questão pela terceira vez, observando com atenção a resposta, eu me abanava, tentando me concentrar naquelas palavras.

Gabi... — Meu apelido ecoou baixo e eu ergui a cabeça, tentando acompanhar.

— Se a sua pergunta inclui bebida, sábado à noite e algum lugar que não seja a minha casa... — Apontei a lapiseira em sua direção enquanto falava. — ...então não conte comigo.

— Caralho, o que eu fiz para merecer uma amiga com alma de velha?! — Natália se jogou sobre a cadeira ao lado, estendendo o braço de forma dramática, talvez pedindo por atenção. — Você tem vinte anos, Gabi.

— Ah, jura?

— Faz bem lembrar, porque às vezes você parece não saber.

Contive minha vontade de proferir uma resposta extremamente atravessada e joguei minha lapiseira sobre a mesa, analisando a postura de Natália.

— Desembucha. — Resmunguei, chutando sua perna por debaixo da mesa.

Show, amanhã à noite. — Ela mencionou, se limitando a me olhar enquanto mantinha sua pose dramática. — Henrique e Juliano, naquela boate perto da praça dos Girassóis. — Inclinei a cabeça, confusa, e foi suficiente para que Natália entendesse: — Ah, amiga, eles são daqui, eu acho. Já ouvi falar, o som deles é... legal.

— Legal... — Repeti, desencorajada. — Eu imagino qual seja o tipo de show para você falar murcha desse jeito.

— Em minha defesa... — Natália se levantou, erguendo os ombros e ajeitando a postura, como se achasse que aquilo seria o suficiente para me convencer. — ...eu nunca fui num show deles. Eu conheço o que a galera fala, eles são bem conhecidos aqui na UFT e tipo... as pessoas falam bem.

— Nat...

— Amiga, eu vi uma foto dos dois, em um cartaz, alguma coisa assim, não tô lembrando... — O toque sobre minha mão era um como um pedido que eu não a interrompesse antes que terminasse. — ...tem um deles que é exatamente o seu tipo.

Natália esboçou um sorriso contido enquanto me observava com atenção — medindo minha reação. Eu cheguei a balançar a cabeça em recusa, incapaz de camuflar meu sorriso retraído.

— E qual seria o meu tipo, Natália? — Questionei-a, a título de curiosidade.

— Carinha de quem não presta. — Seu tom era carregado de malícia e ela voltou a rir logo após. Eu apenas balancei a cabeça em negativa. — Não, agora é sério, Gabi... Uma barba meio rala, um olhar bem... sei lá, poderia ser impressão minha, mas ele parecia ter um olhar bem marcante.

(Im)perfeitos | Ricelly HenriqueOnde histórias criam vida. Descubra agora