Henrique.
Acordar antes das nove não era um hábito frequente. Quando muito, era porque eu tinha algum compromisso inadiável pela manhã e precisava estar de pé antes das oito, para ter tempo de me ajeitar antes de sair. No entanto, naquela manhã em particular, eu acordei de bom grado.
Não fazia ideia de horas deveriam ser, em um primeiro momento. O sol já se esforçava para tentar aparecer, adentrando todas as pequenas brechas possíveis no ambiente, embora não tivesse sucesso. Foi ao tentar me levantar, com a cabeça tomada por memórias da noite anterior, que eu senti um breve impacto e então guiei o olhar ao que me prendia à cama.
Sorri ao perceber meu braço dormente, em conjunto com uma tapeçaria de cabelos; fios castanhos extensos, que se projetavam até eu me perder de vista. Eu toquei aqueles fios, encontrando o rosto de Gabi há centímetros de distância, perdida em um sono profundo. Ela tinha os lábios entreabertos e aparentava estar em um sono profundo.
Teria sido bom — ótimo, na verdade — ter continuado na cama por mais algum tempo. Porém, eu acabei despertando e tive medo de acordar Gabi mesmo sem querer. Por isso, me esquivei dela com cautela e me levantei da cama, deixando o quarto logo após.
Estranhei a claridade ao chegar à cozinha, mas alcancei o fogão mesmo com os olhos entreabertos e decidi passar um café. Para mim, parecia uma ótima forma de começar aquela manhã.
Não mais do que cinco minutos depois, enquanto eu esperava pelo café coar, ouvi o som de passos se arrastando pelo corredor e ergui meu olhar. Gabrieli trajava apenas a minha camiseta, que se levantou para a metade das coxas quando ela decidiu levar a mão à boca para bocejar. Aquela mulher estava perfeita. Absolutamente perfeita.
— Bom dia — desejei, enquanto ela ainda se aproximava. Assim que Gabi me alcançou, coloquei duas mechas do seu cabelo para trás da orelha e aproveitei a brecha para tocar seu rosto, tecendo pequenas carícias. Percebi que ela se esforçou para tentar forçar um sorriso, mas sem muito sucesso.
— Você achou mesmo... — ela se interrompeu para bocejar e, ao fim do gesto, balançou a cabeça, como se tivesse intenção de dispersar o próprio sono. — ...que podia levantar da cama e me deixar sozinha?
Sua reação não era lá exatamente... contente. Ainda que Gabi não tivesse uma postura muito firme, aquela era sim uma queixa real, o que só a tornava mais engraçada, mas eu não usei aquela abordagem com Gabi.
— Desculpa, amor — pedi, de forma sincera. — Eu não queria te acordar...
— Tá tudo bem.
Quando ela se aproximou, foi para se aninhar ao meu corpo, repousando a cabeça entre o meu peito e o meu ombro. Com o queixo apoiado sobre ela, esbocei um pequeno sorriso ao sentir seu toque sobre minha pele despida, me abraçando pelas costas. Eu senti tanta falta de momentos como aquele, de uma intimidade tão profunda, mas que não era dependente de palavras para acontecer.
— Cê vai viajar hoje? — Gabi supôs, nitidamente torcendo por um não em resposta. Eu respirei fundo, sem querer admitir, mas ciente de que não havia como escapar. Lá estávamos nós, enfrentando nosso maior problema, outra vez.
— Final da tarde, só — confessei. — O show é aqui pertinho. A gente vai sair lá pelas seis, eu acho.
— Ah! — sua exclamação não tinha nada de contentamento. — Você devia ir ficar um pouco com os seus pais, então. Eles devem estar morrendo de saudade.
— Ah, eles definitivamente estão — concordei, prevendo que Gabi não ficaria contente por eu concordar, ainda que ela não me dissesse. — Mas, eu também tô com saudade de uma certa pessoa. Eu não posso ir passar o dia com os meus pais e deixar ela de lado.
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(Im)perfeitos | Ricelly Henrique
RomanceUm romance de conto de fadas não era nada do que Gabrieli esperava. Príncipes estavam para ela tanto quanto sapatos de cristais e carruagens que se transformam em abóboras: meros conceitos de filmes da Disney. Ironicamente, foi exatamente o que ela...