‧₊˚ vinte e dois.

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Gabrieli.

As palavras me atingiram com um certo tipo de sutileza. Embora fosse uma informação árdua de assimilar, eu não podia dizer que estava surpresa — ou, de alguma forma, estaria mentindo. O sentimento sempre existiu, embora eu nunca tenha tido coragem de confrontar Henrique. E não foi por falta de vontade, apenas por medo de imaginar o que meu namorado poderia me confessar. De certo modo, eu estava sendo covarde evitando aquele confronto inevitável.

Talvez tudo fosse menos doloroso se isso tivesse sido confessado por ele. Talvez o sentimento não fosse tão amargo ou tão profundo, ou tão cruel. Ou então, talvez tivesse doído um milhão de vezes mais. Mas eu preferia me agarrar à primeira ideia, porque certamente soava menos dolorosa e eu faria o possível naquelas circunstâncias para evitar com que eu me magoasse mais.

A mulher a minha frente aparentava surpresa. Ligeiramente boquiaberta, era notório que ela se empenhava para não transparecer tanto assim. Talvez ela não tivesse o objetivo de ser solidária e eu, sinceramente, não poderia culpá-la. Foi ao perceber a demora por uma reação que ela supôs:

— Você não sabia...

— Você esperava que eu não soubesse, é isso? — ironizei. A mulher à minha frente não se atreveu a me responder.

As lágrimas já haviam surgido sobre os meus olhos, mas eu não me permitiria demonstrar fraqueza. Mantive a cabeça erguida, ainda que custasse um pouquinho da minha dignidade.

— Isso foi em fevereiro?

Contraindo os lábios, como se ela tivesse algo a se lamentar — e, por pouco, não me fez revirar os olhos — ela disse baixinho:

— Então você já imaginava.

— Eu conheço o meu namorado — pontuei, com amargura. — Eu sabia dizer que tinha algo de errado com ele. Ele não é o tipo de pessoa que costuma ficar quieto de uma hora pra outra e... enfim, quando ele voltou de Goiânia, eu imaginei que pudesse ter acontecido.

— Foi, foi em fevereiro.

Ouvi-la confirmar pela segunda vez me deixou sem reação. Com o olhar vago, perdido, sobre nada em particular, eu apenas me concentrei na sensação do vento batendo contra a minha pele. Aquela noite era fria e a sensação de arrepio que me trazia, devido às pernas e braços descobertos, apenas tornava tudo ainda mais dramático. Minha pele estava arrepiada, e nem era pelo assunto.

— Se você suspeitava tanto assim, por que aceitou voltar?

Ainda havia um tom de superioridade quando sua pergunta surgiu. Eu não gostava da forma como aquela mulher me olhava. Nem um pouco. Ela parecia saber que, se Henrique precisasse escolher entre nós, ela seria a primeira opção — como se ele estivesse disposto a trocar uma certeza por um lance casual de uma noite. Eu me condenava por pensar daquela maneira, mas sinceramente, era inevitável.

— Justamente porque eu tinha uma forte intuição sobre isso, eu levei isso em consideração quando decidi perdoar ele — mordi o lábio inferior e flagrei o olhar dela. Ela não parecia impressionada. — Eu já sei o que deve estar pensando, mas eu não me incomodo de admitir que eu perdoei o meu namorado, mesmo imaginando que ele tinha me traído. Vamos ser sinceras, a última pessoa que deveria ter vergonha dessa situação toda sou eu. Não fui eu que traí, nem eu que me envolvi um cara comprometido.

— E mesmo assim você tá se prestando a dar satisfação pra mulher que beijou o seu namorado. Você tem certeza que sou eu que estou me doendo?

— Considerando que é você que veio me procurar, eu diria com toda certeza — assim que abri um sorriso, parte da postura dela se desfez, porque ela sabia que era insustentável. Foi cômico, com toda certeza, mas eu não havia dito tudo aquilo que precisava, por isso me contentei em manter o tom de voz ameno enquanto dizia: — Você quer me dizer que eu sou a pessoa que tá passando vergonha aqui? Eu nunca teria te procurado se eu soubesse quem você é, nunca teria aceitado começar essa conversa, em primeiro lugar.

(Im)perfeitos | Ricelly HenriqueOnde histórias criam vida. Descubra agora