Capítulo 19

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Vendo Draco Malfoy encolher como uma ostra e inquieto, Harry suspirou. Na esperança de apaziguá-la, ele sussurrou suavemente, num tom tão razoável quanto possível.

— Escute, Malfoy. Não importa o passado, ok? Não vou tentar machucar você ou...

Malfoy rosnou e interrompeu, saindo da cama com uma leve careta, sem se importar por estar apenas de cueca.

— Ah, por favor, Potter. Eu não tenho medo de você. Só preciso chegar em casa e trabalhar.

Harry hesitou e encolheu os ombros, com a desagradável sensação de ter fracassado. Vendo que Malfoy parecia inflexível, ele bufou.

— Vou pegar suas roupas. Elas deveriam estar limpas, pelo menos.

Ele encarou seu ex-rival por um longo tempo, mas este evitou cuidadosamente seu olhar, então ele se virou para ir buscar as roupas. Franzindo a testa, ele não pôde deixar de ficar ressentido com o sonserino por ser tão teimoso, embora eles tivessem conseguido se comunicar brevemente.

Embora conhecesse Draco Malfoy tão bem quanto seus amigos mais próximos, ele não podia dizer que sentia falta dessa parte de sua personalidade.

Harry sabia que não fazia sentido insistir ainda. Quanto mais ele pressionava Malfoy, mas Malfoy se voltava contra ele e resistia. Porém, ele odiava a ideia de vê-lo partir tão rapidamente, de mandá-lo de volta para a proximidade de Voldemort, principalmente depois de ver o estado em que ele se encontrava.

Harry o tratou da melhor maneira que pôde, limpando seus cortes com ditame e usando pomada em seus hematomas, curando o que pôde com os feitiços que teve que aprender durante a guerra para ter alguma esperança de sobreviver, mas o corpo de Malfoy permaneceu com cicatrizes.

Assim que saiu da sala, Harry fez uma pausa e cerrou os punhos, tentando se acalmar. Ver a pegada no peito nu de Malfoy reacendeu sua raiva e mesmo que não fosse dirigida a Malfoy, se ele o encarasse naquele estado de espírito, eles entrariam em conflito, como antes.

Ele tinha milhares de motivos para querer acabar com o reinado de terror de Voldemort. Seja para vingar seus pais, para viver livre, para proteger seus entes queridos, para ajudar os bruxos ou para socorrer as famílias das vítimas, naquele momento, tudo parecia muito menos importante para ele do que tirar Draco Malfoy das garras do bruxo das trevas.

Harry realmente não entendia por que esse de repente se tornara seu objetivo principal, mas tinha certeza de uma coisa: odiava a resignação e o medo que via nos olhos cinzentos do jovem.

Agora que tinha seus sentimentos sob controle novamente, Harry caminhou até a pequena, frágil e gasta mesa de fórmica que ficava no meio da sala e acenou com a cabeça satisfeito ao ver a pilha de roupas perfeitamente ordenadas e, acima de tudo, limpas.

Ele pode ter se refugiado no coração do mundo trouxa, em um apartamento miserável e minúsculo que alugou por uma ninharia, mas manteve uma ligação inesperada com o mundo mágico. Embora o elfo negro o tenha traído e levado seu padrinho Sirius à morte, o velho elfo rabugento mudou. Ele se transformou no momento em que Harry lhe contou sobre Regulus e lhe deu o medalhão que o irmão de Sirius colocou na caverna amaldiçoada como isca.

Ele havia se tornado mais amigável com Harry, mais respeitoso. Quando Harry finalmente lhe disse que havia destruído a horcrux — e de fato todas as horcruxes, incluindo a abominável serpente de Voldemort — Monstro se tornou seu aliado mais leal e mais próximo.

O velho elfo cuidou dele, certificou-se de que ele tivesse algo para comer, veio contar tudo o que ouviu sobre o mundo mágico.

Monstro foi quem o ajudou a desaparecer quando ele deixou Hogwarts e cuidou pacientemente de Harry depois de recuperá-lo quando ele voltou da terrível batalha.

Mesmo que Harry estivesse ressentido por ele ser uma das causas da morte de Sirius, ele acabou perdoando-o. De uma forma um pouco estranha, embora Sirius e Monstro se odiassem apaixonadamente, Harry se sentia mais próximo de seu padrinho por ter o elfo perto dele e a criatura parecia ter encontrado uma nova juventude para cuidar de Harry.

Harry balançou a cabeça e pegou a pilha de roupas. Sem surpresa, Monstro colocou um prato de sanduíches bem próximo a ele e havia mais do que suficiente para duas pessoas. Harry imaginou que Malfoy provavelmente recusaria ou ficaria insatisfeito com o que lhe oferece-se, mas pegou o prato mesmo assim e se virou para voltar para o quarto.

Malfoy estava sentado na beira da cama, de cabeça baixa e parecendo infeliz. Harry só teve tempo de vê-lo com essa expressão vulnerável por um momento, pois ao ouvi-lo se aproximar o jovem se endireitou e drenou toda emoção de seu rosto.

Ele ergueu uma sobrancelha para a bandeja de sanduíches e zombou, forçando seu tom a ser zombeteiro.

—Você está planejando tentar me envenenar, Potter?

Harry não se importou, apenas entregou suas roupas a Malfoy. Ele sentou-se ao lado dele na cama e colocou a bandeja entre eles, antes de se servir e dar uma grande mordida em seu sanduíche.

Depois de mastigar e engolir o pedaço de pão, ele se explicou com calma.

— Você não precisa comer claro, mas pode se servir se quiser. E por falar nisso, você não arrisca muito, não sou eu quem cozinha.

Malfoy fez uma pausa enquanto se vestia, franzindo levemente a testa, mas permaneceu em silêncio, terminando de se vestir, um pouco mais devagar do que deveria. Ele parecia imerso em pensamentos, seus olhos constantemente voltando para Harry, que estava fazendo o possível para ignorá-lo enquanto comia em silêncio.

Malfoy parecia dividido entre aceitar o convite e fugir, e acabou sentando na ponta da cama, sem comer nada.

Harry terminou seu sanduíche silenciosamente e fez uma careta enquanto voltava a conversa sobre a guerra e Voldemort.

— Você precisa saber algo sobre ele antes de fazer esta poção... Você está perdendo algumas informações e aposto que isso mudará muitas coisas…

Harry fez uma pausa antes de encontrar o olhar de Malfoy. Este último olhou para ele, congelado, com os olhos um pouco arregalados. Harry poderia facilmente adivinhar o medo do jovem e o que ele iria dizer a ele não iria ajudar em nada…

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