Capítulo 38

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Clara sentia um buraco enorme no coração, como se tivesse sido arrancado e houvesse gelo ao redor. Não conseguia acreditar que Cedar duvidava da sua fidelidade, que colocava a paternidade de Isaac em dúvida!
Suas lágrimas demoraram a cair, pois estivera em choque. Agora escorriam pelo seu rosto como rios de dor.
— Por favor, por favor, Clara.
Cedar implorava que ela dissesse que não o havia traído ou enganado sobre sua gravidez. Desejava dizer a ele a verdade e aplacar o seu sofrimento, mas ela a estava ferindo demais!
Cedar a afastou, mas Clara continuou olhando para o chão e chorando.
— Quando... Clara...
Ela tentou recuar mais, porém ele a conteve.
— Me solte... - murmurou.
— Me diga a verdade.
Ela levantou o rosto e o encarou, vendo, borrado pelas lágrimas, o rosto do seu companheiro que oscilava entre o ódio e o sofrimento. Ele nunca poderia ter aqueles sentimentos, não poderia pensar tão mal dela!
— Me solte. - repetiu, agora com mais força.
— Você precisa me dizer.
Clara ergueu a camisa e secou os olhos. Todo o seu corpo tremia de pura decepção.
— Você já falou.
Ele a soltou tão de repente que ela caiu sentada no sofá.
— O que está dizendo?
Ela fungou, sentindo a raiva surgir em meio ao sofrimento.
— Esta criança é de Painting. - falou entredentes. — Você já disse.
Ele deu um passo para trás, os olhos arregalados.
— Não.
Clara se calou, vendo os olhos dele escurecerem. Não tinham mais nada de calmos e firmes; estavam sombrios e inquietos.
— Você está mentindo.
Clara ergueu o queixo.
— Como diz isso, se tem tanta certeza?
Cedar apertou novamente os punhos e agora Clara viu o sangue escorrendo.
— Como pôde fazer isso? - ele perguntou com a voz cavernosa.
Cedar estava tão ereto que parecia mais alto do que era, as presas pontiagudas aparecendo.
Ela não respondeu. Tudo o que queria era deitar em sua cama, fechar os olhos e esquecer. Mas não sabia se aquela ainda era a sua cama. Cedar abrira um abismo entre eles.
— Aquele macho está morto. - declarou e uivou.
Clara se assustou e abriu a boca enquanto ele se virava e saltava até a porta. Alarmada, ela correu, apenas para vê-lo abrí-la e sair. Ela mal o viu, porque Cedar correu numa velocidade inumana.
Ela sabia para onde ele estava indo; atrás de Painting! Pensou em correr, porém nunca o alcançaria. Voltou-se e correu até a mesa de centro, onde estava seu telefone celular. A ligação foi atendida no segundo toque.
Clara?
— Onde você está, Painting?
Na clínica. Fui buscar luvas no depósito.
Por favor, saia daí e não vá para casa!
— O que está acontecendo?
— Eu deixei Cedar pensar que o bebê era seu!
Que bebê?
— O meu!
Como é que é?
Clara balançou a cabeça, angustiada.
— Depois eu explico. Você precisa se esconder.
— Não, explique agora.
Clara recomeçou a chorar, contou o acontecido para o amigo e terminou se desculpando.
Aquele idiota acreditou no que você disse?
Painting, por favor, se esconda! - pediu chorando.
— Não farei isso. Cedar enxergará a razão.
Não! Ele quer te matar!
— Fique calma, ok? Se ele não me ouvir, eu pedirei ajuda.
Sim!
Vá para o dormitório feminino. Eu ligarei para Verity e Emerald. Avisarei Creek.
Está bem. - concordou, chorando.
Encerrou a ligação, abalada demais. Foi ao quarto, calçou um tênis e saiu de casa. Aquela seria a primeira vez que circularia pela colônia sem escolta.

Cedar corria velozmente, ignorando qualquer espécie que encontrasse no caminho. Sabia que àquela hora encontraria Painting na clínica.
Viu a construção surgir no limiar da floresta.
Entendeu o que fizera Oak agredir a sua fêmea; fora a dor. Para não ferir Clara preferira ir em busca do macho.
Seu coração doía e tudo o que desejou foi que Painting conseguisse matá-lo. Não conseguiria viver e presenciar Clara com o filho do outro macho no colo. Não queria mais viver sabendo que, em algum momento, Clara se entregara para Painting. A visão de sua fêmea compartilhando sexo com o outro passou por sua mente e ele uivou novamente.
Quando se aproximou mais, viu Painting saindo da clínica. O macho parou do lado de fora e esperou. Esperava por ele.
Cedar não diminuiu a velocidade e quando encontrou Painting se lançou sobre ele e os dois rolaram por alguns metros entre as folhas do pátio.
Quando pararam, Cedar agarrou a garganta do outro e começou a apertar. Alguns instantes se passaram até ele perceber que Painting não lutava, apenas puxava suas mãos, tentando diminuir o aperto.
Ergueu o macho e começou a bater sua cabeça no chão. Painting fechou os olhos, mas continuou puxando suas mãos.
Odiando que o macho não revidasse, o soltou e pulou em pé.
— Lute!
Painting se ajoelhou, puxando o ar com força e se engasgava, tossindo em seguida. Cedar viu as marcas em seu pescoço cobertas de sangue. O seu sangue.
Sua respiração estava tão irregular como a de Painting. Ver o macho ali sem revidar a agressão o despertou para o absurdo da situação. Paiting não era seu inimigo. Até saber da sua atração por Clara jamais sentira nada diferente de amizade e respeito por ele.
Encostou-se no tronco de uma árvore, subitamente exausto. Aos poucos, sua respiração voltava ao normal. E sua mente também.
Reviu o que ouvira da conversa em sua casa, reviu seu ódio e a surpresa de Clara. Sua Clara.
Ela o amava, demonstrara desde o início que o queria. Fora ele que se mostrara relutante, contrário mesmo à uma relação com ela. E Clara somente o tratara como uma pessoa preciosa.
Seu acasalamento fora algo maravilhoso e a gravidez um acontecimento extraordinário.
Agachou-se devagar, enquanto Painting o olhava. O macho era considerado como mais do que bonito pelas fêmeas, fossem espécies ou humanas. Clara confessara que chegara a cogitar ter algo com Painting, nunca escondera aquilo dele.
O triângulo amoroso entre Oak , Cristal e Mount mexera mais com ele do que imaginara. Como pudera imaginar que sua fadinha poderia traí-lo?
Mas por que ela admitira que o filho era de Painting?
Porque eu disse isso a ela!
Cobriu o rosto com as mãos e sentiu o cheiro do seu sangue; poderia ser o sangue de Painting agora.
O que Clara estaria pensando dele?
Meu Deus! - invocou o Deus dos humanos. Ele teria misericórdia de uma criatura não-humana? Ele o ajudaria para que Clara o perdoasse?
— Cedar? - Painting chamou com uma voz enrouquecida. Cedar abaixou as mãos. — Não é verdade. Clara estava magoada. Ela não é como Cristal. - tossiu.
Cedar apertou os lábios antes de responder. Jamais Clara seria como Cristal.
— Sempre foi você, amigo.
— Eu sei.
Paiting o olhou espantado.
— Você sabe? Então por que...
— Eu tive a clareza apenas agora.
Paiting engoliu fazendo uma careta e Cedar observou como seu pescoço estava inchado.
— Clara te ama muito. Acho que beira à obsessão. - Painting pareceu pensar. — Não me ataque, mas eu a quis antes de você.. - Cedar rosnou. — Eu a teria aceitado mesmo sabendo que ela te queria.
Cedar achou que era demais.
— Você continuou querendo acasalar com ela?
— Sim.
— Clara sabia?
— E me tratava com compaixão. Ela é humana, não é dura como nós.
Levantando-se, Cedar encarou o macho.
— Não quero mais você perto dela.
Painting lhe deu um olhar desafiador.
— Você deveria pensar se Clara quer você perto dela.

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