Cedar não conseguia se mexer, sua mulher estava desfalecida em seus braços e seu filho sem respirar.
O doutor Bishop soprava em sua boquinha e massageava o peito.
— Não... - murmurou Confidence, se ajoelhando. Cedar verificou a pulsação de Clara; estava muito fraca. Sentiu um dedo gelado passar por sua coluna e aumentar seu medo.
Lembrou-se de quando estava em Mercille e a única vida que conhecia era sofrer na mão dos humanos. Depois, já livre, prometera que aquela raça nunca mais o faria sofrer. No que competia a ele, faria de tudo para evitar os homens.
E lá estava ele, sofrendo muito mais do que jamais sofrera e por amor à uma humana.
Seus olhos encheram de lágrimas e ele não impediu as lágrimas de cairem. Era Cedar, do Alto Conselho da ONE, respeitado por seu povo e até pelos humanos com quem era obrigado a conviver. Era um guerreiro que havia matado para se defender e proteger fêmeas. Aprendera a usar armas especificamente contra humanos que atentassem contra a ONE.
Toda a sua força, coragem e poder não impediram o seu choro e não se envergonhava.
Quando achou que não aguentaria mais, Isaac deu um espasmo e berrou, um som agudo e sofrido.
Bishop deitou o bebê, rasgou uma faixa do tecido de uma blusa e amarrou na base do cordão umbilical e, num gesto muito rápido, usou a faca e o cortou. Embrulhou o bebê em algumas camisas e o estendeu para Cedar.
— Leve-o, Cedar, o mais rápido que puder!
— Clara... - Cedar balbuciou.
O médico olhou para Confidence.
— Consiga alguém para levá-la. - encarou Cedar. — O bebê precisa de você agora!
Confidence se levantou e Verity estendeu os braços para Clara.
— Deixe-a comigo, Cedar.
Ele se levantou e Verity tomou o seu lugar. Confidence abriu a porta e gritou algo para fira.
Cedar pegou o filho e sentiu um choque ao perceber o quanto era pequeno e leve.
Um macho entrou no escritório e, do lado de fora, os convidados abriram caminho para Cedar. Disparou para fora do Clube em direção ao Centro Médico. Correra pela vida de Clara e corria agora pela vida do seu filhote.
Mesmo com o vento zunindo em seu ouvido, percebeu que
Isaac não chorava mais. Estacou, apavorado. Só então notou que outros espécies corriam com ele.
Seguindo seu treinamento em primeiros socorros, ergueu o queixinho do filho e, cobrindo sua boquinha e nariz, soprou nele. Aguardou alguns segundos e não vendo reação soprou de novo.
O corpinho estremeceu e Cedar, respirando de alívio, voltou a correr.
Viu o Centro Médico e algumas pessoas à frente das portas.
Blade saiu pelas portas e colocou o braço em seus ombros.
— Venha, irmão, minha mulher está esperando.
Ouvindo o borburinho às suas costas, Cedar entrou no Centro Médico. A enfermeira espécie o guiou até a UTI neonatal. O espaço fora criado quando a companheira de Starlight havia engravidado, porém nunca fora usado.
Entrando na sala a doutora Thainá, vestida com o pijama hospitalar e as mãos enluvadas se dirigiu a Cedar.
O enfermeiro, também espécie, mexia numa encubadora.
— Cedar, pode me passar o bebê. - Thainá pediu.
Ele demorou um instante para entender que deveria se separar do filho. Estendeu o corpinho embrulhado na camisa, que estava úmida de sangue. Suas mãos tremeram quando entregou Isaac.
A médica rapidamente deitou o bebezinho na encubadora e colocou uma minúscula máscara de oxigênio sobre o nariz e a boquinha.
O enfermeiro se aproximou dele.
— Precisa sair agora, Cedar.
Ele não queria, contudo precisava receber sua companheira. Tentou ver Isaac, mas a médica estava na frente, inclinada sobre o bebê.
Respirou fundo e , de cabeça baixa, saiu da sala.
Do corredor ouviu vozes altas. Rapidamente foi para a recepção e seu coração deu um salto quando viu Maple entrando com Clara. O macho estava coberto de sangue.
Correu e estendeu os braços para pegar Clara. Ela estava com os olhos semicerrados.
— Amor. - ele chamou. — Minha fadinha.
Clara abriu totalmente os olhos.
— Isaac...
Está com a doutora Thay.
Naquele momento, dois machos chegaram carregando o doutor Bishop e Josivaldo nas costas.
A enfermeira Sueli bateu nas costas de Cedar.
— Por aqui, senhor Cedar.
Ele seguiu a senhora até uma das salas de cirurgia. Uma enfermeira humana apontou a mesa cirúrgica e ele deitou Clara. A mulher começou o atendimento à Clara e o olhou.
— O senhor não pode permanecer aqui.
— Eu ficarei.
Ela desviou o olhar e continuou atender Clara. Cedar acariciou os cabelos crespos, lembrando de como gostava de senti-lo em seu peito. Sentia-se esgotado. Quase perdera sua mulher quando desconfiara dela, quase a perdera quando fora sequestrada e agora... Estava pagando ao Universo por odiar tanto os humanos? Era isso, não ficaria com a humana que amava?
Clara estava muito pálida e ele sentiu desespero em não poder fazer nada por ela.
— O bebê, amor.
— Senhor Cedar... - ele virou -se e viu a enfermeira Sueli. — Não pode ficar aqui. - falou gentilmente.
— Preciso ficar.
— Não é o protocolo.
— Leve-o para se limpar e vista um pijama nele. - disse o doutor Bishop.Cedar o encarou um instante. Tinha medo de se afastar de Clara. — Vá, por favor.
Ele seguiu Sueli para fora da sala. Ela o levou até o lavatório onde o fez lavar muito bem as mãos e o ajudou a vestir o traje cirúrgico. Desde que fora libertado de Mercille aquela era a primeira vez que permitia que outra humana, que não fosse Clara, o tocasse.
A mulher o encarou com um olhar de pena.
— Dias conturbados, senhor Cedar. Dias conturbados.
Ele concordou e a seguiu quando saiu da sala.
Ao voltar, a enfermeira mexia num equipo de soro e Clara estava com uma máscara de oxigênio. Bishop fazia uma massagem no ventre dela, enquanto puxava lentamente o cordão umbilical. Cedar sabia que ele estava retirando a placenta.
Se colocou à cabeceira da mesa cirúrgica e abaixou a cabeça para sua mulher vê-lo.
— Estou aqui. - falou, acariciando seu rosto.
— O bebê...
— Ele está bem. - disse para acalma-la.
— Fique com ele... - Cedar sentiu-se dividido. Não queria deixa-la. — Não o deixe sozinho.
Respirando fundo, Cedar decidiu obedece-la. Inclinou-se e encostou a testa na dela.
— Eu voltarei logo.
— Não, por favor. Fique com Isaac.
Ele acariciou novamente o rostinho e saiu. Voltou para a sala da UTI neonatal.
Se alguém ficou incomodado com a sua presença, ele não percebeu.
O choro de Isaac parecia um miado fraco e seus bracinhos e pernas se agitavam. A doutora Thainá colocava esparadrapo no umbigo de Isaac e Cedar entreabriu os lábios ao ver que um equipo de soro estava preso ali.
Cedar não percebeu quanto tempo havia passado desde que entrara.
A doutora se virou para ele.
— Tire as luvas, Cedar. - ele não entendeu. — Quero que o bebê receba o toque do pai
A enfermeira tirou suas luvas.
Quando ele caminhou para a encubadora, sentiu vontade de uivar. Seu pequenino filho estava de fraldinha apenas, com a máscara de oxigênio e um tubo preso ao seu umbigo, os olhos cobertos por uma faixa de tecido. Sentiu que ali não conseguiria protege-lo.
Enfiou as mãos nas entradas da encubadoras; lá dentro era quente.
Tocou o bracinho e os pés com cuidado. A pele era muito macia. Fechou as mãos e ficou cou um tempo apenas o segurando.
Thainá parou ao seu lado.
— Nós faremos todo o possível por ele. - Cedar anuiu com a cabeça. — Ele é um Nova Espécie; é forte.
— Obrigado.
Cedar suspirou e tocou a bochechinha. Pensou que passara a maior parte da sua vida sem possuir nada; tudo pertencia à Mercille. Agora tinha uma mulher que o amava e um filho.
Fechou os olhos e, mais uma vez pediu ao Deus de Clara que ele e sua família pudessem ser felizes.
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CEDAR: Uma história Novas Espécies 5
Science FictionCedar é um dos Novas Espécies, seres humanos criados em laboratórios da indústria farmacêutica Mercille. As Novas Espécies tiveram seu DNA alterado com DNA de alguns animais. Cedar é membro do Conselho das Novas Espécies e atualmente cumpre seu trab...