Cedar nunca achara tão difícil ser um Conselheiro da ONE quanto nas últimas duas semanas. Dedicara-se ao seu trabalho como líder da colônia e membro do Conselho. Seu povo era muito interessado na vida do outro e no correr dos dias fora interpelado por vários espécies perguntando por que Clara voltara para o dormitório feminino. Ele não sabia o que Clara dizia a quem perguntasse, então apenas respondia que ela desejara assim. Não dizia a ninguém sobre a dor que sentia constantemente em seu peito ou sobre os sonhos vívidos com o seu amor que o faziam despertar com lágrimas nos olhos.
Creek o mantinha ciente de tudo o que acontecia com Clara. Ela conseguia as informações através de Verity e Confidence.
Ele pensara que Clara partiria de Homeland III, mas ela continuara a trabalhar na clínica veterinária. Em casa, livre dos olhos que o observavam, ele uivava ao lembrar que ela continuava ao lado de Painting. Deixara de jantar no Clube só para não encontrar o macho. Mesmo não acreditando num caso entre Clara e Painting ele o odiava apenas por também amá-la. E Painting continuava a ter todas as oportunidades de estar perto dela. Se corroía de ciúmes.
Naquele dia convocou uma reunião com Sky. Precisava tomar uma decisão e dependeria, em parte, da vontade do seu segundo em comando. Kindness, que assumira recentemente como seu secretário, bateu à porta e a abriu.
— Sky chegou. Já pode atendê-lo?
— Sim. Peça para entrar.
Sky entrou e olhou para Cedar com as sobrancelhas erguidas.
— Você está péssimo.
— Já sei disso.
Sky sentou-se no sofá, abrindo os braços sobre o encosto.
— Você não vai atrás da sua fêmea?
Cedar fez uma careta, irritado por não haver privacidade entre seus pares.
— Estou dando espaço para ela.
Sky olhou para o teto parecendo pensar, depois tornou a olhar para o amigo.
— O que Painting tem a ver com a sua separação?
Cedar rosnou baixinho.
— Estão falando sobre isso?
— Ouvi que Clara deixou você e no mesmo dia você surrou o macho. - o rosto de Cedar enrubesceu violentamente. — Sei que a fêmea era louca por você, então não consigo enxergar o problema. Nunca ouvi falar de acasalados se separarem.
— Eu sei.
— E acontecer justamente com um Conselheiro ... Isso era impensável. Você é um exemplo para nós.
Cedar se levantou e começou a caminhar pela sala.
— Eu decepcionei Clara.
— Foi porque bateu no Painting?
Cedar respirou fundo.
— Eu ataquei Painting, porque achei que Clara estava me traindo com ele.
— Você está louco? Todo mundo sabia do amor daquele macho pela sua companheira.
— Sabiam?
— E todo mundo sabia que ela escolheu você.
Cedar parou e esfregou as mãos no rosto. Sentia cada vez mais que Clara nunca o perdoaria. Balançou a cabeça e olhou para Sky.
— Preciso da sua ajuda.
— Quer que eu fale com ela?
— Não. Gostaria de adiar minha partida para Homeland.
Sky o encarou por um momento.
— Quer permanecer como nosso líder?
— Não. Quero que permita que eu fique aqui até Clara me aceitar de volta. Não sairei daqui sem minha companheira e meu filho.
— Ela está grávida?
— Sim.
Sky se levantou e colocou as mãos nos ombros de Cedar.
— Você ajudou a me ajustar quando fui resgatado de Mercille. Você me escolheu para te substituir. O único modo que tenho para agradecer é te apoiando.
— Obrigado.
Quando Sky partiu, Cedar ficou à janela, admirando o dia clarear. Precisava de Clara como se precisasse do ar para sobreviver. Queria estar ao seu lado e ver seu filho crescer em sua barriga
Retornou para a mesa e voltou a trabalhar. Precisava deixar tudo pronto para Sky assumir em menos de dois meses.De frente para o espelho, Clara tentava fechar o botão da calça. Antigamente a usava com um cinto, porém agora sua barriga estava estufada. As blusas largas que usava disfarçaram sua gravidez, mas não serviam mais para isso.
Confidence e Verity prometeram guardar segredo e Emerald fora mandada de volta para Homeland I. Entretanto, não esconderia mais que estava grávida. Já estava na oitava semana, mas parecia estar com o dobro do tempo.
Tirou a calça e pegou um vestido. Era branco e amarelo e Cedar gostava de vê-la com ele.
A lembrança dele lhe causou uma dor real. Sentia falta de Cedar da hora em que acordava até a hora que dormia. Mas uma mágoa a tomava ao lembrar de suas palavras: De quem é esta criança?
Fechou os olhos. Era dor demais.
Terminou de se vestir e calçou a bota. Suas roupas não eram exatamente adequadas para o trabalho, entretanto teriam que servir até que fosse em Santa Rosa. Ou deveria comprar pela internet? Gostaria que sua mãe estivesse do seu lado para ajudá-la, porém sequer contara sobre o rompimento com Cedar.
Saiu dos seus aposentos e foi encontrar Confidence no saguão. A mulher a olhou de cima a baixo.
— Você está muito grávida.
— Dá para ver, né?
— Parece que sua barriga explodiu.
— Isso é um elogio, espero.
— É, sim.
As duas saíram e caminharam para o Clube. Aquele era o horário que os humanos tomavam o desjejum e suas escoltam esperavam ou tomavam um cafezinho.
Clara entrou no refeitório e Estela acenou para ela. Serviu-se de uma enorme porção de ovos mexidos, dois tipos de pães, geleia, manteiga e frutas. Quando se sentou à mesa de Estela seu olhar foi para o prato.
— Que saúde!
— Hoje acordei com muita fome.
Estela sorriu para ela.
— Gostei do vestido. Todos já podem saber do bebê?
— Não tenho mais como esconder.
— Você não tem nada para esconder.
Clara suspirou.
— O que não vão dizer?
— Está preocupada?
— Imagino se não se perguntarão quem é o pai...
— Ninguém terá dúvidas. Todos sabem o quanto vocês se amam.
Abaixando a cabeça,Clara sentiu-se muito cansada.
— Cedar tem dúvidas.
Peace aceitava o mingau de aveia das mãos de Rain e não notou quando ela abriu a boca de surpresa.
— Está grávida? - perguntou para Clara.
— Que felicidade!
— Sim. - respondeu, acariciando o ventre.
— Agora você e Cedar podem se acertar.
Clara enrubesceu, mas não respondeu.
Peace, que percebera que não era o centro da atenção de Rain, estendeu a mão e apertou o nariz da mulher.
— Peace! - Estela chamou, porém Rain o pegou no colo e os dois riram, abraçados. Estela balançou a cabeça. — Eu nunca conseguirei ensinar disciplina a essa criança...
Rain beijou a cabecinha cabeluda.
— Esta é a melhor hora do meu dia. Como vocês são felizes de poderem gerar uma vida.
Clara ficou pensando no carinho que as Novas Espécies tratavam cada criança. Naquele momento exato decidiu que ficaria no Acre. Isaac teria a atenção do povo de Cedar e as visitas dos seus parentes maternos. . Seu filho cresceria longe do pai.
— O que foi? - perguntou Estela ao ver seus olhos cheios de lágrimas.
Clara balançou a cabeça e mordeu um pãozinho com manteiga. Não era porque estava profundamente magoada com Cedar que deixava de sentir sua separação como uma tragédia pessoal.
Confidence segurou sua mão.
— Sabe que não está sozinha.
Clara mastigou o pão, que lhe pareceu amargo como suas lágrimas, e balançou a cabeça assentindo.
Estela e Rain a olharam com compaixão e ela pensou que teria muitas mãos para cuidar do seu filho. Isso teria que bastar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
CEDAR: Uma história Novas Espécies 5
Science FictionCedar é um dos Novas Espécies, seres humanos criados em laboratórios da indústria farmacêutica Mercille. As Novas Espécies tiveram seu DNA alterado com DNA de alguns animais. Cedar é membro do Conselho das Novas Espécies e atualmente cumpre seu trab...