Clara abriu a porta para receber Confidence; ela seria sua nova escolta. Não queria saber de Emerald e só esperava que não se encontrasse com ela.
— Olá, Clara.
— Bom dia, Confidence.
— Boa tarde, já.
— Já?
— Sei que quer ir para a clínica, mas é melhor passarmos no Clube para almoçarmos.
Clara não sentia fome, porém sabia que deveria se alimentar bem.
— Tudo bem.
Saíram e foram para o Clube. Ela imaginava que todos com que encontrava sabiam da sua separação.
Entraram no refeitório e Estela a chamou. Clara respirou fundo e foi até a mesa da amiga. Estela se levantou e a abraçou.
— Fiquei preocupada com você. - falou baixinho.
— Eu estou bem.
— Ficou tudo bem entre vocês? Eu queria voltar, mas Ven não deixou. Disse que era assunto do casal.
Clara abaixou os olhos e sentiu o rosto corar.
— Podemos conversar depois?
— Quer que eu passe na sua casa quando você voltar da clínica?
Erguendo o rosto, Clara engoliu em seco.
— Eu voltei para o dormitório feminino.
— Como é que é? - perguntou Estela que cobriu a boca com a mão, assustando-se com o seu próprio tom de voz. — Desculpe-me. - olhou para os lados. — Você está bem?
— Vou ficar.
Estela continuou fitando-a de olhos arregalados.
— Clara...
— Eu preciso almoçar. Me ligue mais tarde.
Clara foi para a fila do bufê. A maioria ali era humana, os Novas Espécies eram escoltas. Serviu-se e procurou uma mesa vazia. Sentaram-se e Confidence respeitou o seu silêncio. O quanto Creek contara para ela?
Terminou de comer com má vontade e saíram. Ela viu o olhar triste de Estela para ela.
A caminhada até a clínica foi cheia de pesar. Normalmente era Cedar que a trazia e levava. A vegetação, que sempre lhe trazia uma sensação de paz, agora parecia pálida e triste.
Chegaram na clínica e ela se preparou para encontrar Painting. Não sabia o que havia acontecido quando Cedar saíra desvairado de casa.
Encontrou o amigo limpando a mesa de exames. Ele olhava para a porta, porque sabia que já havia sentido o seu cheiro. Clara abriu a boca quando viu as marcas em seu pescoço.
— Cedar fez isso? - perguntou, apontando para ele.
Painting largou o pano de limpeza.
— Você está bem?
Ela balançou a cabeça.
— Não.
— Sinto muito.
Ele deu um passo em sua direção e Confidence se aproximou dela. Painting parou.
— Estamos conversando, Confidence.c- ele reclamou.
— Recebi ordens de não deixar ninguém se aproximar dela.
— Somos amigos.
— São ordens.
— Certo.- ele tornou a olhar para Clara. — Quer conversar?
— Não. Quero trabalhar.
Ele ficou um momento apenas a encarando. Depois deu um tapinha na coxa
— Então vamos trabalhar.
E, de fato, Clara trabalhou. Aproveitou que estava sem pacientes e limpou todas as gaiolas, arrumou o escritório, por último , organizou todos os arquivos dos animais.
De início, Confidence apenas observou, mas depois ajudou Clara.
Quando voltaram para o dormitório, Clara estava exausta. Painting ainda tentou conversar, porém ela não quis. Não queria falar sobre sua separação.
Tomou um banho longo e, depois de Confidence dar à vez a Verity, foi para o Clube jantar. Encontrar Órion foi uma distração ótima. O pequeno havia machucado o joelho e mostrava o curativo a qualquer um que passasse perto dele. Clara sabia que ele tinha apenas dois anos, mas parecia ter o dobro da idade.
Não encontrou Estela, pois ela passara a jantar em casa com o filho e com o companheiro.
A volta para o dormitório foi silenciosa. Clara olhava para todas as direções, temendo encontrar Cedar. Quando chegou dispensou a oferta de Verity em dormir com ela e se escondeu no quarto. Não queria conversar, queria apenas se encolher no escuro e chorar. E fez assim.No dia seguinte, na hora do almoço, recebeu a visita de Creek; ela queria verificar como estava, mas também entregou uma mensagem de Cedar, perguntando se era desejo dela permanecer como veterinária em Homeland III. Clara apenas disse que tinha um contrato e o cumpriria. Creek a olhou com admiração e voltou para os escritórios.
Quando retornou para a clínica, Painting aproveitou que Confidence estava no escritório lendo e puxou conversa.
— Clara, podemos conversar? - ela suspirou e assentiu com a cabeça. — Clear me contou que você voltou para o dormitório feminino. É verdade?
— É.
— Cedar a mandou para lá?
— Eu quis ir.
— Você... você o deixou?
— Deixei. - respondeu, sentindo uma dor no peito.
Ele mordeu o lábio inferior, encarando-a por um longo tempo.
— Para sempre?
— Sim.
Painting engoliu em seco e suas narinas inflaram.
— Eu... gostaria de me lamentar por você, mas... eu sonhei com isso.
Clara se abraçou.
— Por favor, Painting...
— Eu nunca tive esperança, mas sonhei.
Ela abaixou os olhos.
— Cedar não sairá da minha vida.
— Mas você disse que o deixou.
Clara suspirou e ergueu os olhos.
— Ele é o pai do meu filho. Terei que conviver com ele.
— Ele não pode te forçar.
— Não é este o caso. - apertou a ponte do nariz. Sua cabeça começava a doer. — Podemos falar de outra coisa?
Quando abriu os olhos, Painting estava bem à sua frente, seus rostos muito próximos. Ela recuou um passo, porém ele a segurou.
— Painting!
— Eu disse ao Cedar que você o amava, disse que ele era o único para você. - os olhos dele brilharam. — Eu não me importo que você o ame agora.
— Por favor, me solte.
— Eu amo você. Eu te amei antes dele. Me dê uma chance, Clara.
Ela admirou o Nova Espécie. Ele era lindo como um anjo de antigas pinturas e a amava ao ponto de ficar perto dela apenas pelo prazer de estar ao seu lado. Se ela nunca houvesse conhecido Cedar, não seria difícil se apaixonar por ele.
Acontece que ela amava Cedar. Muito.
— Não posso dar o que você quer, meu amigo. - ela se afastou novamente e, dessa vez, ele a deixou ir. — Eu não perdoo Cedar, mas eu o amo profundamente. - seus olhos se encheram de lágrimas. — Eu respeito o que você sente, porém você é meu amigo querido, apenas meu amigo.
Painting franziu as sobrancelhas.
— Se Cedar pensou o pior sobre você é porque não te conhece. E não te merece.
Clara quis dar um fim naquela situação.
— Painting, eu ainda não resolvi o que fazer. Sei apenas que não posso criar meu filho fora das terras da ONE, mas onde será isso eu não sei. - olhou-o com firmeza. — Enquanto não decido, pretendo ficar aqui. Se você quiser ficar, tudo bem, mas precisa saber que seremos só amigos.
Ele piscou e ela imaginou o que ele estava pensando.
— Tudo pode mudar, Clara.
— Não. Eu deveria ter sido mais firme sobre esse assunto. - respirou fundo e descansou os braços ao lado do corpo. — Não haverá nada além da amizade entre nós.
— Pode ser que...
— Não, Painting, não.
— Eu não a pressionarei. Quero apenas ficar do seu lado.
— Isso não deu certo. Emerald sentiu que poderia fazer uma intriga, porque eu aceitei o amor que você ofereceu.
— Aquela fêmea foi muito maldosa.
— Foi. Mas ela fez Cedar duvidar de mim pela nossa proximidade.
— E você quer que eu fique longe agora? - ele perguntou, com um olhar triste.
— Sim. - Painting abriu a boca, surpreso. — Só me dê mais espaço.
— É isso o que quer? Você e Cedar nem estão mais juntos. O que importa o que ele pensa?
— Importa o que você sente.
— O quê?
— Tem que lembrar que, mesmo que eu não esteja com Cedar, sou dele.
— Não pode.
— Eu sinto ódio pelo que ele fez, mas estou marcada. Sempre será Cedar. - Painting parecia receber cada uma das suas palavras como um golpe. Engoliu em seco e Clara sabia que ele estava se controlando. — Você vai continuar na clínica?
— Você quer que eu saia?
— Quero apenas me dedicar ao trabalho.Não quero nada além disso.
Ele ficou parado, fixando o olhar em seu rosto. Depois, seu olhar perdeu a intensidade e abaixou os ombros.
— Você não quer sequer receber o meu amor?
— Não.
— Mas eu te amo.
— Não, Painting.
Passando a mão na juba cacheada, ele franziu os lábios. Passeou os olhos pelo consultório e, só então, tornou a olhá-la. Seu rosto era uma máscara de decepção.
— Será difícil para mim.
— Então um de nós terá que ir.
— Isso não é justo.
— É o certo.
Painting percorreu seu rosto mais uma vez e assentiu com a cabeça.
— Farei como você quer... mas não deixarei a clínica.
— Tudo bem.
Clara viu seus olhos perderem o brilho. Ele respirou fundo e se virou, passando a conferir o estoque de medicamentos.
De verdade, Clara sentia muito. Sabia o que era amar. Sentindo que lágrimas se formavam em seus olhos, foi para os fundos da clínica, fingindo que verificava as gaiolas.
Estava cercada pela tristeza.
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CEDAR: Uma história Novas Espécies 5
Science FictionCedar é um dos Novas Espécies, seres humanos criados em laboratórios da indústria farmacêutica Mercille. As Novas Espécies tiveram seu DNA alterado com DNA de alguns animais. Cedar é membro do Conselho das Novas Espécies e atualmente cumpre seu trab...