43. O suspiro

1.5K 152 395
                                    

Aquela semana foi uma loucura.

Entre os preparativos da formatura, revisões no cursinho, maratona de técnicas de oratória e uma pilha de rascunhos amassados, mal respirei.

Me arrependia da decisão que me trouxe aqui: bastidores do palco, coração acelerado, repetindo mentalmente um discurso que, embora elogiado pela diretora, não parecia bom o bastante.

Tudo porque, meses atrás, decidi me expor a desafios como treinamento para encarar o "chefão". Quando a professora de linguagens pediu um voluntário para orador da turma, o silêncio reinou. Então ela tentou soar descolada:

— Vamos lá, galera! É como um jogo de videogame. Quem encara um desafio final desses, pode vencer qualquer adversário nesta vida!

Foi uma conexão imediata com o que eu estava buscando naquele período: me tornar alguém que Alexander não intimidasse. Quando percebi, já tinha levantado a mão e me oferecido. O arrependimento foi instantâneo.

Isso aconteceu há quatro meses. Agora, de beca, me sentia idiota por ter achado que aquilo fazia sentido.

— Você vai arrasar — a voz de Ícaro me arrancou dos pensamentos ansiosos.

— Obrigada — sorri nervosa, mas grata pela distração.

— Sofie, eu só queria... — começou, mas a diretora chamou seu nome. — Boa sorte no discurso — disse, antes de sair apressado.

Outros colegas também me incentivaram, gratos por eu ter impedido um sorteio para essa tarefa torturante.

A oradora seria chamada por último. Cada aplauso para os nomes anunciados revirava meu estômago. Auditório lotado, mas a cadeira reservada para o meu responsável, vazia.

Menti para Gutierre sobre a data da formatura, pois não queria ver Alexander nunca mais. No entanto, não esperava que a solidão doesse tanto hoje.

— Sofie Avelar Francis!

Minha barriga congelou.

Apertei a cola do discurso na mão suada e entrei.

Os aplausos vieram, mas nenhum par de mãos especialmente por mim. Caminhei até a diretora, recebi o tubo e me virei para a plateia, como no ensaio.

Foi quando vi.

Os olhos azuis, que passei a semana tentando esquecer, se destacavam entre tantas faces desconhecidas.

Como eu podia ficar tão feliz se me comprometi a odiá-lo? Uma semana longe, achei que o tinha superado, mas bastou um olhar para destruir meu esforço.

— E para fechar esse momento emocionante, nada melhor que ouvirmos as palavras de uma jovem inspiradora. Com vocês, a oradora da turma!

Oh, não, ele ia me ouvir discursar.

Não importava. Ele não era importante.

A questão é que, não intencionalmente, algumas partes do discurso serviam tanto para o fim da escola quanto para o do casamento.

Fui ao púlpito sem sentir o chão. Pernas trêmulas e estômago em reviravoltas. O som dos aplausos cessou quando me posicionei no microfone. Apoiei o papel úmido amassado, olhei para um ponto qualquer no fundo do auditório e comecei:

— Não fui escolhida por ser boa nisso. Estou aqui porque ninguém quis e eu agarrei a chance de me humilhar em público sem pensar duas vezes. Então não esperem grande coisa.

Risadas ecoaram, me surpreendendo. Algo dentro de mim se acalmou, como se aquelas reações validassem meu improviso nervoso. Respirei fundo e busquei um fio condutor no papel.

Meu marido indesejadoOnde histórias criam vida. Descubra agora