O ruído das rodinhas da mala que eu arrastava era sobreposto pelas gargalhadas de Cecília, irmãzinha de Guilhermo. Ele a levava nas costas, ameaçando derrubá-la, e ela se agarrava aos cabelos escuros dele.
— Não puxa meu cabelo, sua peste! Vou te jogar na lata de lixo.
— Mamãe, Guilhermo disse que vai me jogar no lixo!
— Sem briga, crianças — Raquel respondeu distraidamente e logo voltou para o assunto comigo sobre a receita dos cookies que acabamos de comer.
Era o dia da partida de Guilhermo, vim à sua casa passar os últimos minutos com ele. Não deixei de ser sua amiga, o que aconteceu entre ele e Alexander não me dizia respeito. Saber separar as coisas é essencial.
Chegamos do lado de fora ao mesmo tempo que um carro buzinou ritmadamente, parando na frente da casa.
— Papai! — Cecília comemorou. Guilhermo a colocou no chão e ela correu para Gutierre que saía do veículo. Ele se abaixou e a recebeu num abraço afetuoso.
Guilhermo pegou da minha mão o puxador da mala enquanto eu observava Gutierre se levantar com a filha nos braços e Raquel ir até o marido para lhe cumprimentar com um selinho. Cena mais linda. Será que um dia...
— Sofie! Que bom vê-la — Gutierre sorriu para mim. — Espero que já tenha me perdoado pelo banho de tinta.
Foi no dia seguinte ao resultado do vestibular. Eu havia saído com Fayla, cheguei em casa toda inocente, abri a porta e bum, um balão de tinta lilás, devidamente posicionado para cair de cima, me acertou em cheio.
Minha primeira reação foi de choque e irritação. Gutierre se acabava de rir da minha cara. Bem ao seu lado, estava Alexander, com um sorrisinho travesso que deu conta de dissolver minha raiva em segundos. Depois ele mesmo me ajudou a lavar e secar o cabelo.
— Tá, eu perdoo, mas só dessa vez — adverti, tentando parecer séria, mas não consegui segurar o riso.
Gutierre arqueou a sobrancelha, interessado.
— Dessa vez? Significa que há outra aprovação para comemorarmos?
Desviei o olhar.
Foi ele quem me sugeriu fazer a prova para a universidade de Guilhermo, por ter um nível de excelência superior às universidades daqui. Mas eu não queria contar para ninguém que...
Guilhermo bateu o porta-malas.
— Vamos logo se não vou começar a chorar — ele fingiu secar uma lágrima.
Fiquei grata pela interrupção, assim não precisava mentir.
Gutierre abriu a porta de trás e ajudou a filha colocar o cinto.
— Tem certeza de que não quer vir conosco, querida? — Raquel perguntou gentilmente. — Vamos tomar sorvete na volta. Para adoçar as lágrimas de despedida.
— Obrigada pelo convite, mas preciso ir para casa.
— Que pena. Venha jantar conosco um dia desses — ela se despediu com um abraço caloroso. — Você e Alex.
Sorri educadamente, sem dar respostas definitivas.
Recusei a carona para casa, pois o aeroporto ficava em uma direção oposta. Todos entraram no carro e ficamos apenas Guilhermo e eu frente a frente para dizer adeus.
Ele inclinou a cabeça para o lado com cara de cachorro sem dono ao mesmo tempo que abriu os braços.
Revirei os olhos e o abracei. Ele era mais alto, então fiquei com a cabeça enterrada em sua camisa.

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Meu marido indesejado
Ficção Adolescente"Você está na escola, certo? Deve saber o mínimo de interpretação para entender que isso não é um casamento. É um contrato. Um mero pedaço de papel cujo único objetivo é impedir que você vá para um abrigo. Você assina essa porcaria, e cada um segue...