8 - Catarina x Lara

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Catarina

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Eu devia ganhar um salário extra só por ter que aguentar essa riquinha mimada reclamando toda hora no meu ouvido. Estou aqui para aprender a ser uma jornalista tão boa quanto Eduarda e Laura que são referencias no mercado, não para ser babá de patricinha. Não passei quase quatro anos cursando jornalismo para concluir meus dias de formação servindo cafézinho para a filha da redatora-chefe que não descobriu que diabos quer fazer da vida. Na boa, essa ruiva tem cara de garota que banca a rockeira rebelde, mas que dedica seus dias a torrar a mesada que ganha dos pais no shopping.  Quanto antagonismo, quanta antítese. É revoltante observar como ela não consegue aterrissar nesta redação e posicionar sua cabeça para o crucial. É evidente o bicho de sete cabeças que ela faz parecer tudo a sua volta. Não sei por quanto tempo conseguirei lidar com isso... Ou melhor, com ela.

Lara

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Chega a ser engraçado o modo como ela anda de um lado para outro nessa redação agindo como se fizesse mais que servir café. Pobre estagiaria, não parou para perceber que é só isso que ela é, uma simples estagiaria da qual ninguém se importa por aqui. Servir cafezinho conta como pontos no currículo? Porque se não contar, ela estará ferrada quando finalmente se formar. Minha mãe só podia estar cega quando falou que tínhamos quase a mesma idade e aparentemente muitos pontos em comum, é claro que ela é bem mais velha que eu. Olha essas rugas? Sem contar que ela já está no sexto período de Jornalismo e eu no ensino médio, isso já dá uns 4 anos a mais pra ela. Tá, eu sei que repeti um ano no ensino fundamental, quando meus coleguinhas me enchiam a paciência falando das minhas mães e isso talvez já me dê mais tempo de carga horaria de aluna. Mas é um fato que ela é sem duvidas bem mais velha. 

Agora que o assunto da repetência do ensino fundamental veio à tona,  lembro com indignação que quase repeti o segundo ano do ensino médio também. Mas não por culpa minha, parei de querer ir na escola por vergonha do bullying que eu sofria por ser a filha "inseminada das lésbicas". Eu sei que não nasci de um processo de inseminação, mas eles não sabiam e isso sempre foi meu carma. Felizmente daqui a um semestre estarei livre daqueles palhaços e livre dessa droga de jornal também. Vou finalmente poder ir para longe dessa cidade ao lado de Arthur. O tio Rafa vive me convidando para ir em sua casa, quem sabe não seja essa a minha grande chance! 

Catarina

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— Sua mãe me bipou. — comentei olhando a tela do aparelho. 

— O que ela quer agora? — Lara era sempre tão curta e grossa.

— Um café. Mas estou atolada com essas resenhas que tenho que entregar até o final da tarde. Será que você poderia por favor, largar por um minuto essa droga de celular e ir na cafeteria da esquina comprar um cappuccino duplo com creme?

— Tem escrito "empregada-de-estagiaria" na minha testa?

— Eu estou fazendo as resenhas que VOCÊ deveria fazer, porque você me disse que não sabia fazer e, ao invés de ficar do meu lado para aprender como se faz, você sentou nessa cadeira, pegou a droga do seu Iphone e ignorou tudo que eu tinha a ensinar. Então não absorva minha paciência, garota, e se você não levantar seu traseiro agora desse estofado e não sair em cinco minutos para pegar o maldito café, eu digo para a Eduarda que a filhinha dela não se importou em aprender absolutamente nada o dia todo e agiu como uma dondoca mimada que só sabe ficar sentada enquanto olha o mundo ao redor girar. — sorri triunfante. — E então, qual vai ser sua decisão?

— Eu vou, sua babaca, mas não pense que é por medo da sua ameaçazinha de quinta, e sim porque não aguento mais olhar para sua cara. — cuspiu em mim tais palavras. 

— Então nisso concordamos, porque olhar para sua cara também não é algo que eu me agrade muito de fazer. E se eu não estivesse sendo praticamente obrigada, seria eu a primeira a ir para longe de você. — vociferei antes que ela batesse a porta grosseiramente, seguindo seu trajeto para o Lé coffee.

Essa garota era realmente mais idiota do que imaginei que seria. Uma mimada, é isso que ela é. Ralei muito para estar aqui onde estou hoje. Conseguir um estagio em um dos maiores jornais do país não é algo fácil, ralei muito para estar aqui... e ela vem e age como se eu tivesse estudado anos apenas para servir café? Uma garota como ela, que talvez tenha tido tudo que sempre quis da vida, não sabe o que é trabalhar apenas para pagar aluguel e faculdade, deixando a família em outra cidade, aprendendo a lidar com a saudade, acordando cedo para pegar ônibus lotado, muitas vezes sem sobrar trocado até para comer porque a mensalidade do curso aumentou... Vem se comportar como se fosse melhor, quando ela na verdade nem sabe o que é lutar para ter alguma coisa?  

L a r a - [ROMANCE LÉSBICO]Onde histórias criam vida. Descubra agora