21 - O presente

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Kiara

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Encaro mais uma vez o conteúdo que aquele envelope trazia e me perco outra vez nos meus pensamentos. Desde que o covite para a festa de aniversário de Lara chegou entre minhas correspondências, não consigo ignorar a existência dele. Faltam apenas dois dias para a "grande festa" e eu ainda não consegui decidir entre ir ou seguir as ordens da minha mãe sobre rasga-lo. Eu sei que eu compraria uma briga cruel com minha mãe se eu de fato fosse, mas por outro lado, Lara e eu durante todo esse tempo que nos conhecemos, nunca deixamos o aniversário uma da outra passar em branco. Apesar do rumo que as coisas tomaram e do modo como nos afastamos, ela ainda faz parte das minhas melhores memórias. 

Se bem que eu duvido muito que tenha sido idéia dela me enviar esse covite. Ela nunca ignoraria o orgulho assim. Certamente isso é obra de Melissa. Ela nunca entendeu bem o porquê Lara e eu nos afastamos. Lara nunca quis dizer para não ferir sua mãe, e eu, no fundo, agradeço por isso. Melissa sempre me tratou tão bem, sempre tão prestativa, não me perdoaria se acreditasse que me afastei de Lara por ser filha de uma homossexual.  Eu não consigo entender o porquê minha mãe leva a frente essa idéia retrógrada de julgar pessoas por orientação sexual. E pior, entendo menos ainda porque ela insiste em me afogar no meio de todo esse mar de preconceito...

Eduarda

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Faz pouco mais de uma semana que Lara deixou essa redação e o remoço anda me corroendo. Talvez eu tenha sido exageradamente firme com ela e aplicado uma medida maior do que deveria. Faltam dois dias para que ela faça finalmente seus 18 anos e menos de um mês para a sua formatura de ensino médio.  São tantos passos importantes, e eu deveria estar ao lado de minha filha nesses processos, mas tudo que fiz foi deixa-la com raiva de mim. Sinceramente, nem sei como reverter essa situação, mas também não quero deixar como está. Talvez um bom presente de aniversário seja uma boa maneira de apaziguar tudo. E por que não tentar? 

Pego o telefone e bipo a estagiária Catarina Vidonni, que por sorte não demorou muito a entrar. 

— Deseja algo, Senhora? — ela disse entrando após dar três batidas de leva na porta. 

— Entre, por favor?  — ela extremamente insegura se aproximou. — Desejo sim. Sei que você conviveu com minha filha durante o tempo em que ela passou aqui e após sua saída até veio me pedir para que reconsiderasse a decisão... 

— Desculpe, senhora... eu não quis ir contra sua decisão, eu só queria...

— Calma, Catarina, não estou repreendendo você, estou apenas fazendo observações antes de te pedir algo.  

— Pedir algo? — ela repetiu confusa. 

— Sim. Sei que Lara e você tem quase a mesma idade e jovens como vocês costumam ter quase sempre os mesmos gostos. Pensando nisso, quero te pedir para ir comigo até o shopping e me ajude a escolher um presente de aniversário para a minha filha. Quero tentar reverter o episódio que antes pontuamos. Sei que isso não faz parte das suas atividades de estágio, mas se puder me ajudar, eu ficarei agradecida. 

— Aniversário? É hoje?

— Não, é daqui a dois dias na verdade. Mas você sabe, não gosto de deixar nada para a última hora. 

— Claro senhora, estou a sua disposição. Vamos no momento em que quiser ir. 

— Ótimo, então vamos agora mesmo! — falei desligando o pc, pegando a bolsa, minha chave do carro e seguindo, enquanto Vidonni tentava acompanhar meus passos quase sem êxito. A verdade é que com a correria do dia-a-dia da redação, até desaprendi a andar calmamente.  

L a r a - [ROMANCE LÉSBICO]Onde histórias criam vida. Descubra agora