60 - Lè coffee

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Lara

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O dia começou cedo no jornal. E meu corpo ainda estava quebrado da farra de ontem. Catarina conseguiu mesmo me proporcionar uma canseira daquelas que nem uma semana inteira de trabalhos consecutivos conseguiria. Mas bom, valeu super apena. Estou renovada!

Olhei no relógio e vi que já era quase na hora do meu encontro com Kiara. Não sei exatamente o teor da conversa, mas ela sugeriu com tanta ênfase que conversassemos e eu então acatei, marquei no le coffee. Apesar do ciúmes de Catarina que não gostou nada da novidade, eu estava curiosa para saber o que Kiara queria comigo. Espero que sua mãe não a tenha colocado para fora de casa novamente. Ou do contrário, pelo bem do meu relacionamento, não saberei como agir.

Kiara

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Eu sempre chego com antecedência aos meus compromissos, sejam eles quais forem. Lara marcou em um pub perto do jornal, e eu tive que andar quase três quarteirões buscando o tal lugar. É que o endereço que ela me passou não foi tão claro quanto deveria, mas por sorte o coffee é bem conhecido pela região e inúmeras pessoas souberam apontar sua localização facilmente.

O solado gasto foi recompensado com maestria pelo sabor do capuccino. O lugar que serve um cafezinho dos deuses! Eu soube quando os minutos de espera foram acompanhados de torradas e café com creme. Além disso, o atendimento foi bem acolhedor. Juro que se esse pub não estivesse situado do outro lado da cidade, eu seria cliente VIP.

— Demorei muito? — disse Lara sentando-se na cadeira a minha frente.

— O suficiente para eu ingerir boas calorias com esse café com creme. – rimos juntas.

— Acho que vou te acompanhar nessas gordices. – ela disse rendida a visão calórica e deliciosa da mesa. — Clarice? – ela levantou a mão chamando uma das três atendentes.

— Oie, Lara? Vai querer o mesmo de sempre? – ela sorriu simpática.

— Vou sim, obrigada. – respondeu redirecionando seu corpo em minha direção para retomarmos o assunto. — Então, Kiara, onde estávamos? – ela me encarou buscando respostas e entendi que esse era o momento de  falar o real tópico do encontro.

— Vim para agradecer pelo que fez. O fato de ter me abrigado na sua casa, mesmo não nutrindo por mim os melhores sentimentos do mundo.

— Acho que o rancorzinho que eu sentia por você, está cada vez mais se esvaindo. Nem foi tão contra minha vontade assim, no fundo, na verdade, ainda sinto falta da nossa amizade.

— Ora, ora, a rainha da marra confessando saudades? – brinquei com a situação arrancando-lhe um sorriso. — Na verdade, mais que agradecer pelo que fez, eu queria principalmente me desculpar pela confusão sentimental que fiz. Eu acabei forçando a barra com um beijo, atrapalhando seu namoro com Arthur, quase atrapalhando também sua história com Catarina e eu detestaria continuar agindo assim. Eu vim para te propor a retomada de amizade que interrompemos lá atrás. Espero de todo meu coração que não seja tarde demais, pois ainda sinto que temos uma conexão muito forte. O quê me diz? Você aceita?

No meio da minha proposta, a atendente vem entregar na mesa o pedido feito por Lara outrora. Seus olhos estavam mais curiosos que o de Lara e por um instante tive a impressão de que ela estava interessada no teor de nossa conversa. Mas quando nossos olhares se encontraram, ela educadamente pediu licença e saiu nos deixando outra vez a sós.

— Claro que aceito. Só tenho a impressão que sua mãe não vai gostar nada nada da retomada dessa amizade.

— Deixa que com a diretora carrasca eu me entendo. Se bem que ela merece até uns pontinhos de confiança, pois tem tentado mudar e melhorar cada vez mais.

— Mudar? Eu dúvido. Isso só até você insistir na história da sua sexualidade outra vez. Ela só está fingindo aceitar bem porque ainda não teve que te ver ao lado de uma garota.

— Você fala como se fosse fácil para uma mãe afundada no conservadorismo aceitar. Se assumir foi fácil para ti porque sua família não é nada convencional, comigo os passos são mais lentos. Mas acho que ao contrário do que você pensa, quando eu encontrar uma garota legal para poder chamar de minha, com certeza ela aceitará.

— Vamos fazer uma aposta? Como nós velhos tempos que passávamos horas no acampamento de verão desafiando uma a outra em pequenas tarefas?

— Que tipo de desafio?

— Você vai aparecer no baile de debutantes acompanhada de uma garota. Ou seja, não será um "padrinho" de formatura, mas uma madrinha. Se a diretora master malévola não surtar, eu juro que retiro tudo que falei e passo a acreditar na mudança de sua mãe.

— Você sabe que nunca dou para trás em um desafio, mas esse você pegou pesado.

— Vai amarelar?

— E se ela me colocar para fora de casa novamente? Vai ter que me ceder  o melhor quarto da sua casa, vulgo o seu, e tu terás que dormir na casinha do cachorro. – respirei fundo, com o impacto daquele desafio. 

— Viu? Nem você acredita na mudança da sua mãe. Já está certa que vai perder?

— Quer saber, eu aceito! Você vai lembrar que assim como nos velhos tempos, perder não é meu forte. — ameacei. — Se bem que, como vou tirar uma garota da cartola para me acompanhar no baile? Não tenho ninguém em mente nem para padrinho, pior madrinha. A não ser que você seja minha acompanhante...

— Enlouqueceu? Catarina me mata! E além disso, já combinei que iríamos juntas. Mas essa desculpa de "não tenho par" não vai te dar a chance de arregar. Eu mesmo conseguirei uma acompanhante para ti.

— Ah é? Posso saber quem? – revirei os olhos.

— Clarice? Vem aqui por favor? – Lara levantou o braço chamando novamente a atendente que outrora tinha vindo até nós.

— Pois não, deseja mais alguma coisa? – ela disse com a mesma cordialidade de praxe das atendentes daquele lugar.

— Desejo saber se tens algo de importante para fazer na sexta a noite – não pode ser... Ela iria mesmo chamar uma atendente para me acompanhar? Lara, sempre Lara.

— Na verdade não, porquê?

— Você aceitaria ser madrinha de formatura dessa linda morena ao meu lado? — ela disse dando uma piscadela para mim.

— Me perdoe pela desfeita, Lara, mas acho que não tenho nem roupa para uma ocasião como essa. Além disso, nós nem fomos nunca antes apresentadas...

— Não seja por isso, apresento-lhes agora mesmo. Essa é Kiara – ela disse se levantando e colocando sua mão sobre meu ombro. — E sobre não ter roupa para a ocasião, não se preocupe com isso, eu mesmo providenciarei tudo que precisar. Então, o que me diz?

— Acho que ninguém em sã consciência consegue te dizer não. — essa garota estava mesmo ousando bancar a difícil para me acompanhar? Só pode ser uma piada.

— Não mesmo. Vejo vocês no sábado então. – ela disse com um sorriso vitorioso.

Eu inventei uma desculpa qualquer sobre precisa ir embora e sai do lê coffee com a maior agilidade que consegui. Deixei para trás ambas discutindo os últimos detalhes do sábado e eu temi, pois no fundo bem eu sabia ao certo como minha mãe agiria. Sem contar que Lara arrumou a acompanhante mais pão com ovo que se deparou. Poxa, uma atendente de balcão de padaria? Aposto que essa menina não sabe nem a diferença de Bordon e Risqué. Só acho que eu merecia um patamar mais relevante de acompanhante. Se bem que, não estou com muito tempo para escolher.

L a r a - [ROMANCE LÉSBICO]Onde histórias criam vida. Descubra agora