67 - Cadeia

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Lara

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As mudanças vem e adentram sua vida como uma visita indesejável que por mais que você feche a porta, ela insiste em bater, e então sua única alternativa é sentar e fazer sala para que ela acomode-se. É como se você não pudesse controlar, nem prever quem tocará a sua campainha, e essa campainha é na uma metáfora cruel sobre a vida e sobre quem bate à sua porta.

Arthur foi uma dessas visitas que chegou sorrateiramente e se alastrou como um câncer causando metástase por todo meu corpo. Meus anticorpos não acionaram defesas, pois por inocência, acreditavam ser inofensivo. Terrível engano! Era na verdade o pior de todos os vírus.

Demorou até que eu pudesse me reerguer, mas por sorte, nunca gostei de executar o papel de garota frágil. E ainda que eu fosse, a vida não para esperando as pessoas consertarem seus corações.

Apesar do que aconteceu comigo ter sido um episódio extremamente cruel, é uma situação gravemente repetitiva. Dados afirmam que uma mulher é estuprada no Brasil a cada 11 minutos, segundo estatística recolhida pela FBSP – Fórum Brasileiro De Segurança Pública.

Conseguem entender o impacto dessa estatística? Conseguem entender a dimensão da minha revolta? É como viver sempre vulnerável, sem a total dominação de seu próprio corpo. Sempre subjugada e amedrontada pelo simples fato de ser mulher.

Contudo, soa ainda mais egoísta não poder parar a vida em função disso. E se cada uma dessas mulheres abusadas, assim como eu, desistissem de continuar vivendo? Quantos suicídios permeariam na atmosfera? O mais cruel disso é que somos chamadas de sexo frágil, mas saímos por aí diariamente enfrentando nossos demônios e sorrindo como se nada estivesse desmoronando dentro de nós.

Eu sou só mais um número na estatística rotineira, e ainda que finais trágicos como o que Arthur obteve na prisão exista, eles parecem não surtir efeitos em uma sociedade tão machista, que vê mulher como objeto de uso e de posse.

Passei muito tempo até finalmente conseguir me desnudar diante de alguém sem me sentir completamente violada, usada e invadida. Catarina foi paciente e me mostrou a benevolência do amor que não subjuga. Que não maltrata. Que não viola. Não é pelo simples fato de ser uma outra garota, pois por mais que eu tenha poucas figuras masculinas em minha vida como referência, sei que apesar da sociedade machista, há homens respeitáveis por ai, e acredito que por mais que as circunstâncias queiram cegar, eles estão empenhados em sarar os ferimentos que uma mulher a cada onze minutos recebe. Comigo não foi um homem que me ajudou a sarar, mas acredito que o gênero não muda nada nessa situação. É mais que uma questão de genitália, é uma questão de caráter. E isso definitivamente não é definido por sexo.

L a r a - [ROMANCE LÉSBICO]Onde histórias criam vida. Descubra agora