She used to be mine - 18/10/2020

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Eu me pergunto com que idade eu vou olhar para trás e não me reconhecer mais, como na música She Used to Be Mine. Quando o tempo e o mundo vão ganhar na batalha sob minha felicidade, ou inocência, ou esperança de mudar o mundo, de achar que serei diferente, que faria a diferença. Talvez seja culpa desse ano horrível, ou desse momento histórico, eu sei lá, mas cada vez mais, todo o fogo que eu tinha a alguns poucos anos atrás está se esvaindo.

Ver o peso do sistema, em séries e filmes ou na vida real, esmaga qualquer fagulha de esperança. O poder e dinheiro mandam e quando coisas boas acontecem elas são momentâneas e estão longe de resolver grandes problemas. A vida é injusta, a ignorância é uma benção. Essas frases não são forças de expressão e também não são frases motivadoras para que você tente mudar sua realidade. O melhor a fazer é aceitá-las e seguir.

Às vezes penso que posso estar deprimida, mas aí penso como se sentir de outra forma nessa realidade? Nada do que me deixa pra baixo vai mudar, vai melhorar. Não tem uma forma interpretação diferente da realidade em que a injustiça não seja real. Como na música Sad do Bo Burnham, vamos rir da desgraça e seguir como um idiota.

Alguns meses atrás eu ensinava adolescentes a tentar fazer a diferença, a ter senso crítico e empatia, mas minha motivação pessoal acabou, não consigo mais transmitir uma esperança que eu não tenho, me sento uma criminosa tentando vender um sonho que não existe, dizer que eles devem se esforçar para assim ganhar dinheiro e ter empregos e sucesso. Isso não é verdade, não é a regra, eu sou sim a professora que ensina porque não é capaz de fazer por si mesma.

Eu me pergunto com que idade eu vou olhar para trás e todo resquício de esperança que já habitou meu corpo e mente sumirá. Um dia eu quis inspirar jovens, um dia eu acreditei que o barulho de poucos pode ser ouvido, um dia eu achei que a sociedade quisesse ser melhor, mais diversa e igualitária, um dia eu achei que ignorância ia perder a luta e o conhecimento ia vencer, um dia eu achei que as coisas boas acontecem para aqueles que se esforçam e seguem a cartinha social de como "vencer na vida", um dia eu pensava assim.

A falta de pessoas, de amigos, de amigas, dificulta as coisas bastante, nem tanto para conversar sobre, mas para me distrair da merda que é a vida. Acho que a gente morre um pouco quando não tem mais companhia diária, para mostrar que a vida é mais que só você e as coisas na sua cabeça.

Agora faz dois anos que não tenho mais amigos, bem, eu ainda tenho, mas não todo dia, não como companhia, como alegria diária, como entretenimento. A dois anos sou só eu, mais ninguém quer ouvir o que eu tenho para falar sobre qualquer coisa, por mais boba ou séria que seja. E dizem que isso que é ser adulto. Eu entendo quem vive pelo fim de semana agora, entendo alcoólatras e drogados, entendo suicidas e mendigos, entendo.

"Não é fácil dizer, na maioria dos dias eu não me reconheço. Não é fácil saber, não pareço nada com quem costumava ser. Ela se foi, mas ela costumava ser minha."

18/10/2020

Para não sufocarOnde histórias criam vida. Descubra agora