- ̗̀Capítulo 69ˎ'-

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Meus olhos desceram instintivamente para o atiçador e minhas veias subitamente se transformaram em água gelada quando a fitei girar o utensílio por entre os dedos de sua destra.

Eu respirei fundo e tentei me explicar, apreensivo.

— Escute, eu exagerei...

Antes que eu pudesse terminar a frase o primeiro golpe me atingiu. O atiçador se chocou com a lateral da minha coxa esquerda como um chicote, senti uma dor aguda que me forçou a respondê-la.

— Caralho, Belle!

— Diga! — Ordenou ela.

Deixei escapar um gemido de dor enquanto colocava a mão sobre o lugar que ela acabara de atingir com a vara de ferro.

— Eu sinto mu... — Eu tento falar.

O segundo golpe me atinge na outra coxa.

— Vamos! Repita a frase.

Apesar de agradecer mentalmente por ela ter evitado usar a ponta, aquilo ainda doía pra caralho.

— Belle, abaixe isso aí. — Eu ordeno enquanto recuo conforme ela se aproximava de mim. — Belle, eu estou falando sério! — Eu estendo a mão para tentar tomar o atiçador.

Sem sucesso, eu levo outro golpe, dessa vez no antebraço, um pouco mais leve que os outros mas ainda sim, doloroso o suficiente para me arrancar um ruído de dor. E conforme eu continuo tentando tomar aquele objeto de tortura das mãos dela, mais ela continua me estapeando com ele.

— Tudo que eu tenho feito todo esse tempo é me entregar a você, saciar cada desejo primitivo seu sem pedir nada além do necessário. Mas a partir do momento em que eu peço 3 dias para ver minha mãe você me trata como um senhor de escravos. Estou em silêncio graças a sua intransigência.

Todo o corpo de Belle me dizia que estava em posição de ataque, mas os olhos dela... Os olhos dela a denunciavam. Seus olhos eram o termômetro de seu rosto, ao passo de que eles tornam públicos todos seus sentimentos, se eu os encarasse profundamente conseguiria enxergar até mesmo o que ela estava pensando, mas não era preciso tanto para saber o quanto ela estava se sentindo ferida e cansada.

― Belle, eu... ― Eu tento um tom apaziguador.

Em um movimento rápido, ela apontou o atiçador para o meu rosto como um aviso. O gancho da ponta flertava com a minha garganta e eu engoli em seco.

― Cale a boca, eu ainda não terminei. Você não tem o direito de falar comigo como se eu fosse tão substituível quanto qualquer móvel desta sala, porque você não agiria do modo como está agindo se isso fosse verdade —, Tudo que você fez foi devastar a minha vida e agora fala como se eu fosse uma maldita ingrata. — Ela eleva o tom gradativamente e na última palavra da frase já estava gritando. — Escute, eu não devo nada a você.  Eu nunca te devi nada.

Ela chegou mais perto e eu dei um passo atrás. E mais um. E mais outro. Até que fiquei contra o sofá atrás de mim.

— Afinal de contas, o que eu sou pra você? — Ela questionou seriamente.

Eu observei esperançoso seus olhos flamejantes, sua expressão sisuda e enraivecida. Aquela era uma visão estranhamente erótica pra mim, ainda mais sensual por causa da forma como ela respirava. Seu peito subia e descia em um ritmo rápido e ofegante. A pele de seu rosto estava levemente corada e acontecia o mesmo quando ela estava excitada.

Eu ainda tinha um atiçador apontado para o meu rosto como uma espada de esgrima, mas pelo menos eu havia conseguido despertar algo nela. E ao perceber isso, senti uma alegria indevida, um tipo de excitação estranha que não se deve sentir ao ter um objeto pontiagudo apontado para seu rosto.

— Meu amor, — Eu digo e ela fica levemente boquiaberta. — você é a mulher da minha vida!

Ela riu.

— Eu ainda não acredito que tem coragem de estar falando em amor depois de tudo que fez. — ela prosseguiu após um minuto de choque — Você é um cretino! — Dizendo isso ela arremessou o atiçador, que voou por cima da minha cabeça atingindo a mesinha de centro do outro lado da sala.

Ela deu as costas pra mim e eu a agarrei por trás, meus braços enlaçaram sua cintura, mantendo seus braços junto ao corpo e suas costas contra mim. Ela se debateu, lutou, chutou e gritou até ficar rouca, mas eu a mantive em meus braços até que ela finalmente cansou de medir forças comigo e seus movimentos se tornaram lânguidos. Quando a soltei, ela estava tão exausta que se virou pra mim e encostou seu rosto no meu peito, como se precisasse de algum conforto depois de todo aquele esforço.

Até aquele momento eu tinha certeza da minha verdade, por isso, achei que fosse uma bobagem ter que me explicar e ficava puto de raiva em ter que fazer algo assim. Não entendia a dimensão que aquilo tinha tomado, afinal, na minha cabeça, eu estava certo. Não tinha sido eu a começar aquela merda, não planejei nada daquilo, mas eu não iria colocar a minha lógica acima dos sentimentos dela, não seria filho da puta a esse ponto.

A culpa de ter adiado tanto aquele momento era vergonhosa, em meu desejo de abstê-la da verdade, consequentemente do sofrimento que ela o traria, eu só consegui magoá-la ainda mais. No segundo em que fitei seus olhos marejados e cansados, seu rosto estava corado de um jeito que fez meu coração se apertar.

Subitamente ela não era mais o furacão raivoso de minutos atrás. Ela era só a Belle, a minha Belle. Eu empurrei uma mecha de cabelo para trás de sua orelha para conseguir enxergar melhor seu rosto.

Nos encaramos por um longo tempo sem saber como lidar um com o outro.

𝐕𝐚𝐝𝐢𝐚 𝐚𝐟𝐞𝐭𝐢𝐯𝐚Onde histórias criam vida. Descubra agora