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E eu, tão inocente, pensava que minha vida estava toda encaminhada; mero descuido do destino! Minha vida está só começando — Allimidul Seohlub 

Ayleen

Três dias depois e minha mente ainda está dando várias voltas. Eu não sei de onde vou tirar mais dinheiro. Deixei esse assunto fora do alcance da minha mãe, ela não precisa se preocupar porque eu vou dar um jeito. De alguma forma.

— Não pode falar pra ninguém — uma colega de trabalho sussurra para outra.

Estou de costas para elas lavando uma montanha de pratos. Este é um dos meus empregos: lavar toda a louça em um restaurante consideravelmente popular. Continuo calada ouvindo a conversa "sussurrada".

— O evento é privado — continua — uma espécie de leilão.

Leilão?

— Como assim? Eles leiloam pessoas? Isso é super estranho! — a outra exclama.

Sei que a conversa não é comigo, mas concordo com a menina. Mentalmente, é claro. Por que uma pessoa pagaria um valor alto para ter outra? Eu deveria parar de prestar atenção na conversa delas e me concentrar no meu trabalho.

— Não, Marina. Eles dão lances super altos em troca de um jantar. Só os ricos carentes participam disso. A maioria já tá com o pé na cova. Quem sabe não rola um casamento? Já pensou? Rica sem esforço.

Isso até que faz um pouco de sentido, velhos carentes e ricos estão dispostos a gastar dinheiro por companhia. Mas sei lá... Olha eu me metendo de novo...

— Você tem um ponto, vai participar? Você é doida! E se os velhinhos tentarem algo a mais?

— Eu tô pensando em participar, sim. Não sei se meu namorado vai concordar, mas aí já é um problema dele. E se os velhos tentarem alguma coisa, o valor vai subir — solta uma risadinha.

Parece uma forma fácil de conseguir dinheiro... e se eu... Não! O que estou pensando?!

—... aí, você precisa digitar "55687.com" que vai direto pro site — segreda. — O site vai pedir uma senha, 44567, e depois é só passar suas informações. Um amigo meu tá trabalhando na organização do evento. Mas não conta pra ninguém, nem pro seu cachorro — seu tom é levemente ameaçador.

Como se se tocassem de que tem mais alguém na cozinha, param de falar e voltam ao trabalho. Não dão muita importância para minha presença. O problema é que tenho uma memória muito boa e já gravei os números. Parece até uma tentação.

Será que algumas horas com um velho qualquer seria tão ruim? Será que eu deveria tentar? Agora minha mente fica ainda mais confusa e indecisa. Sacudo minha cabeço e foco em minha tarefa. Ainda tenho outros lugares para ir. Meu dia está só começando.

Chego em casa perto da meia-noite e só desejo minha cama. Tiro minha chave da mochila e enfio no portão de aço. Como era de se esperar, a rua está vazia e um cachorro late, distante. O portão range quando abro cortando o silêncio da quase madrugada.

Passo pela varandinha e destranco a porta da frente. Nossa casa é comum, não tão grande e nem tão pequena. Eu cresci aqui, tudo é tão fácil e seguro. Mas não me impede de sentir o vazio de estar sozinha.

Largo minha mochila perto da porta e tiro os meus allstars velhos ficando só de meia. Aí, me lembro de que não peguei o celular e me abaixo, caçando o aparelho dentro do caos da minha mochila.

DeclínioOnde histórias criam vida. Descubra agora