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É muito difícil vencer o jogo quando há várias peças faltando — Allimidul Seohlub

Victor

Meu corpo consegue se estabilizar depois de algum tempo. Vez o outra belisco o café da manhã que Magda me trouxe. Será que Ayleen tá comendo direito?

Me sinto completamente frustrado por não saber dos mínimos detalhes.

Duas batidas soam à porta e logo Magda surge no meu campo de visão. Sua mão está lotada de pastas e documentos. Vendo sua dificuldade, me levanto e vou ao seu encontro para ajudá-la.

— Obrigada. O que não deu pra trazer, tirei fotos e mandei pro seu e-mail particular. Não confio no e-mail institucional. Bom, vou te deixar trabalhar. Não se preocupe, já cancelei as reuniões do dia.

Ela larga as coisas sobre minha mesa e logo se retira.

Começo analisando os papéis soltos. São faturas altas de viagens internacionais dos membros do conselho. Não só isso, mas a hospedagem, estadia e retorno, tudo pago com a verba da empresa. Não são contas de valores baixos, são pagamentos acima de 300 mil e por aí vai.

Todos os aliados ao meu pai estão na lista.

— Velhos vagabundos!

Os próximos papéis se assemelham ao primeiro. Contundo, um chama minha atenção. É o recibo de um motel de luxo. Abaixo do recibo, há algumas fotos. Josué entrando no motel com uma mulher que não é a minha mãe. A foto é velha, deve ter uns 30 anos.

Josué sorri para a câmera na primeira foto, na segunda, abraça a mulher muito parecida com minha mãe. Os dois demonstram estar muito felizes. Como este recibo veio parar aqui?

— O que Josué tá escondendo? — penso em voz alta.

Abro a primeira pasta. Meu peito queima em choque. É um arquivo policial. Não sei como reagir, ao ler as informações.

Fábio Dutra, 23 anos.

Causa da morte: traumatismo craniano; cranioencefálico grave.

O pai da Ayleen.

Também existem fotos do local do acidente. O corpo do homem estirado ao chão; a poça de sangue à sua volta.

Josué é muito pior do que eu pensava.

A raiva cresce com ferocidade dentro de mim. Me sinto impotente, fraco. Eu não posso mudar o passado.

Continuo folheando e um pedaço de papel voa aterrissando no chão. Manobro o meu corpo e consigo apanhá-lo sem me levantar da cadeira. É uma nota.

"Como prometido, aqui estão todos os detalhes que me pediu; são informações confidenciais, por favor, não repasse a ninguém. Aguardo o valor solicitado. Foi muito bom fazer negócios com você."

Não tem assinatura, nome, data. Não há nada. Apenas palavras que revelam suborno. Largo a nota em cima da pasta aberta e fecho os olhos, pressionando os meus dedos sobre eles.

Depois de um tempo, pego o meu telefone e disco o ramal de Magda.

— Pronto — responde de imediato.

— Eu quero a relação de todos os delegados, juízes e advogados que tenham trabalhado pra Josué há 21 anos. Confio na sua capacidade e habilidade.

— Você me pede cada coisa, Victor.

— Obrigado.

Encerro a chamada e continuo em minha missão. As próximas páginas também mostram ex-funcionários falecidos. Nenhum de causa natural; todos morreram enquanto trabalhavam. Há um padrão, percebo.

DeclínioOnde histórias criam vida. Descubra agora