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De todas as paixões baixas, o medo é a mais amaldiçoada — William Shakespeare

Ayleen

Acordo ao som do meu celular despertando, estico minha mão tentando alcançá-lo, mas ela cai pendura para fora do sofá. Droga, peguei no sono aqui. Localizo o aparelho barulhento e deslizo o dedo sobre a tela dando um fim ao som irritante.

Ponho-me sentada sentindo o pescoço doendo por causa da péssima posição em que dormi. Como está escuro, meus olhos ficam incomodados com a claridade da tela do celular quando o desbloqueio. Sinto-me ansiosa e com medo ao mesmo tempo.

Sim, eu me inscrevi para o maldito leilão e ainda não recebi nenhuma resposta, além disso, vou visitar minha mãe agora pela manhã. Não quero que dona Cristina leia atráves de mim e perceba que algo está fora do lugar.

Ela tem essa capacidade. Porém, um sorriso se forma nos meus lábios. Pode ser um pouco estranho, porém, gosto particularmente das quintas-feiras. É o único dia, antes do final de semana, em que posso visitá-la já que o meu trabalho de hoje e por lá. Eu optei por não ter um emprego fixo, sem estar realmente presa.

E é assim que precisa ser, sou o único contado de emergência dela e sempre que há alguma piora, preciso largar tudo para acompanhá-la no que é necessário. Enfim, vou para o meu quarto e pego uma calça jeans, uma blusa preta de manga curta, meias novas e peças íntimas.

Encaro o banho gelado mais uma vez, me arrumo e parto para o ponto de ônibus. Há outras pessoas esperando o transporte apesar de ser bem cedo. Não demora muito e ele aparece na esquina. Respiro fundo: o dia tá só começando.

Uma hora depois, caminho sobre a passarela cumprida que leva ao quarto dela. A Clínica Revivere se assemelha a uma pousada aconchegante. Toda a entrada é gramada com várias árvores frutíferas e decorativas.

Mesas de madeira estão espalhadas ao longo do gramado e há uma grande parte coberta com poltronas confortáveis. Vejo alguns pacientes sentados à mesa comendo ao ar livre. Do lado dentro, tem as acomodações, refeitório acoplado com a cozinha, sala de estar, de jogos e as salas dos cursos livres.

Tudo é bem dividido e espaçoso. Por um momento, até esqueço que se trata de um hospital especializado em câncer. Quando chego ao quarto da minha mãe, as enfermeiras a ajudam a se ajeitar na maca. Cristina abre um enorme sorriso ao me ver.

— Bom dia, minha filha linda — seus olhos brilham de felicidade.

Ela veste um conjunto de moletom que parece confortável, e em sua cabeça, um lenço com vários cachorrinhos. As enfermeiras sorriem para mim e vão saindo do quarto.

— Bom dia, minha mãe linda — deixo minha mochila sobre uma cadeira próxima a porta, passo álcool em gel, que as enfermeiras me oferecem, nas mãos.

— Dormiu bem, Lyn? Seu rosto tá um pouco abatido — questiona, genuinamente preocupada.

Dormi pensando no leilão em que me inscrevi e no que vai acontecer depois disso. — Como uma pedra. Deve ser impressão sua — desconverso tocando no tecido de sua maca.

Ela estreita os olhos, depois dá de ombros. — Eu não sei... — seu tom é desconfiado — Bom, quer assistir a um filme?

Suspiro aliviada por ela não insistir no assunto e aceno.

— Senta aqui do meu lado — chega um pouco para o lado, abrindo espaço para mim.

Me aconchego do seu lado e, na metade do final, dona Cristina dorme profundamente. Infelizmente, não posso ficar por mais tempo. Me afasto com cuidado sem despertá-la. Pego de controle cima da mesa ao lado da maca, desligando a tv.

DeclínioOnde histórias criam vida. Descubra agora